Resenha: Armello
É muito interessante ver como as comunidades virtuais contemporâneas acabam afetando indústrias consolidadas e que, sem elas, talvez ficassem enrijecidas e condenadas à mesmice. Já falei antes da extensa comunidade de jogos eletrônicos independentes que puderam prosperar graças às tecnologias de compartilhamento digital, e nos permitiu conhecer pequenas pérolas como Brothers: A Tale of Two Sons e Journey. E há ainda outro fator bem contemporâneo que a ajuda ainda mais: as campanhas de financimanetos coletivos.
Armello surgiu de uma destas campanhas no kickstarter, criada pelo estúdio australiano League of Geeks. A equipe prometia um jogo que “daria vida às aventuras de mesa,” fazendo referência a jogos de tabuleiro e RPGs de fantasia, e foi muito bem sucedida em abril de 2014, com o lançamento ao público geral tendo acontecido setembro de 2015.
Podemos resumir o produto final como um jogo de tabuleiro eletrônico. Os personagens pertencem a clãs do reino fantástico de Armello, cada um personificado em um animal antropomórfico: o clã do Lobo, formado por cavaleiros e guerreiros; o clã do Rato, por ladrões e espiões; o clã do Coelho, por aventureiros, magos e políticos; e o clã do Urso, por xamãs e personagens mais próximos à natureza. O rei (obviamente, um leão) foi corrompido por uma energia maligna conhecido como a Podridão, e a cada dia se torna mais despótico; os quatro clãs, assim, ao mesmo tempo em que tentam derrubá-lo, disputam entre si para decidir quem irá sucedê-lo.
O clima em geral é descrito pelos autores como “Game of Thrones encontra Kung Fu Panda” – é uma boa descrição, acho, embora, com as referências nacionais, eu talvez preferiria compará-lo à Turma da Mata do Maurício de Sousa, inclusive pela reimaginação recente dos personagens na série de graphic novels da MSP. Mouse Guard / Os Pequenos Gaurdiões é outra boa referência. Os animais antropomórficos, em conjunto com uma belíssima direção de arte, ajudam a dar um clima de fantasia, mas quem esperar que ele seja por isso bobinho e infantil pode se surpreender – há um lado bem sombrio representado pela Podridão e a corrupção que ela causa, e no fim tudo se combina para criar um cenário bastante único e envolvente.
Quanto à mecânica de jogo, é um sistema bem complexo e dinâmico, com uma grande variedade de elementos que podem mudar os rumos de uma partida. Os quatro participantes se movem em turnos pelo mapa, realizando missões e se equipando para o embate final com o rei. Há uma mão de cartas de jogo com equipamentos especiais, seguidores, magias e mesmo “trapaças” que você pode usar para ajudá-lo ou atrapalhar seus concorrentes. E há ainda diversas opções de caminho para chegar a vitória, desde o simples e objetivo assassinato do rei, passando pelo “jogo de tronos” da política e acúmulo de prestígio, até deixar-se corromper pela Podridão.
Tudo é feito para emular um jogo de tabuleiro – você chega mesmo a rolar dados na hora de um combate, e há sacadas bem criativas como o uso do touch pad do controle do PS4 para lançá-los. A pegada é mais casual, sem uma grande campanha de um jogador; você apenas joga partidas avulsas, embora haja uma boa quantidade de troféus e itens destraváveis para incentivá-lo a jogar mesmo sozinho. Há também a opção de buscar adversários online, mas no fim senti bastante falta da opção para multiplayer local, uma modalidade da qual tenho sentido muita falta na maioria dos jogos recentes.
Em todo caso, Armello continua sendo um jogo bastante único e envolvente. Recomendo muito para quem gosta de jogos de fantasia de maneira geral, e jogos de tabuleiro em específico – acho que desde Dragon’s Crown não pego um jogo que capture tão bem o clima de uma mesa. Quem se interessar, ele está disponível para a maioria das plataformas de jogos atuais, desde oPS4 até Android, iOS e Steam.
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