3D&T narrativo Parte 2: mais considerações, menos 3D&T
Continuamos a série que trata do experimento de incluir um elemento narrativo à engine do 3D&T. Para os que chegam agora, é aconselhável que se leia a primeira parte, que apresenta a proposta do projeto, além de todas as considerações iniciais que tivemos a respeito. Nela, somos apresentados a um possível esqueleto mecânico, que busca resolver esta questão.
Analisemos que transformações ocorreram neste nosso experimento desde então.
O nome da rosa (ou: “N”?)
Ocorre que, ao analisarmos a estrutura básica, e com o desdobramento das reflexões a respeito, notamos que este nosso sistema, apesar de basear-se fortemente no 3D&T como “caminho chave” para definição de mecânicas, estava se distanciando muito dele, a ponto de quase não ser mais possível rotula-lo como “3D&T com alguma alteração”. Resolvemos então, adotar outro nome que se adequasse melhor ao projeto. Por fim, definimos o nome de ND&T, por dois motivos principais.
• O “N” denota a narração. Então, a sigla passa a significar algo como Narradores de Tóquio. O “de Tóquio” se manteve por saudosismo, e para identificar qual é o sistema-base que gerou esta cria;
• Além disto, “N” também indica uma variável (como X), em lugar de uma constante (o 3), que alude à modularidade que buscamos aqui.
Enfim, com um nome como “ND&T”, queremos passar a impressão de que mantivemos uma proximidade com a base, mas se trata de um sistema diferente. Pode apostar!
Os limites da interpretação (ou: Um cenário, um sistema)
Cabe aqui uma observação importante. Toda esta idéia que está fazendo surgir o ND&T se deu por conta de Goérpia, um cenário fantástico que estou tendo a satisfação de escrever em conjunto com o colega Remo. Em breve haverá um post – ou uma série deles – dedicado apenas a esta ambientação, mas alguns elementos básicos do cenário já poderão ser apreciados aqui, em função deste sistema ser projetado exclusivamente para ele.
As formas do conteúdo (ou: Estrutura básica e interação com o cenário)
Cada vez me torno mais convicto de que cada cenário deve sim possuir um sistema projetado exclusivamente para ele. Se houver o bônus daquele sistema ainda poder se adequar a outras ambientações, isto é bom, mas ainda é apenas um benefício extra, e que certamente vai exigir adaptação. O que está acontecendo com este nosso ND&T é que ele até agora está se comportando de modo a poder acomodar diversas ambientações, com o mínimo de adaptação. Isto se dá porque ele prevê a adaptação de sua espinha dorsal, ou seja, os atributos básicos. Entretanto, existia a possibilidade de que a certo momento surgisse o confronto daquilo que já havíamos instituído, com a aplicação no cenário, e isto de fato ocorreu.
Toda a cosmologia de Goérpia é baseada em quatro princípios, que eu gosto de chamar pelo pomposo nome de “os quatro pilares de Goérpia”. São eles o princípio físico, energético, emocional e racional. Tudo o que existe no cenário é composto da soma de quantidades diferentes destes elementos, e apenas deles. E foi a partir disto que surgiu a primeira grande alteração de ND&T em relação ao seu antecessor: originalmente o sistema contaria com cinco atributos básicos, mas optamos, em nome de uma melhor coesão com o cenário, pela adoção de apenas quatro características. Nós até tentamos, por algum tempo, manter-nos atados aos cinco atributos, mas percebemos que eles estavam apenas ocupando espaço e dificultando a praticidade do sistema. Assim sendo, os quatro atributos básicos definidos foram Energia, Físico, Instinto e Razão.
Físico, como o nome já diz, mostra a competência física do personagem. Diz o quão forte e ágil ele é, além de representar suas capacidades motoras e, até certo ponto, marciais. Energia é a resistência do personagem; representa tanto sua saúde corporal quanto sua força de vontade. Instinto é um misto entre percepção, “manha”, intuição e capacidade de se relacionar com outras criaturas. Razão representa a capacidade de deliberação e raciocínio lógico do personagem, seu controle sobre suas emoções e também, sua inteligência acadêmica. Como a seleção dos atributos nos norteia no que diz respeito ao tipo de ação que queremos no cenário, podemos ter uma boa idéia do que se pode esperar de uma ambientação como Goérpia: temos um atributo puramente físico, outro que faz as vezes da Resistência do sistema original, agindo como intermediário entre o físico e o energético, e outros dois atributos que vão ajudar a situar o personagem no que diz respeito ao grande conflito do cenário.
Ao contrário do que se pode imaginar, a sincronicidade com o 3D&T, ainda não é perdida. Apesar de haver uma característica a menos, as vantagens serão graduadas, o que pede que o jogador, ao construir um personagem, considere seriamente adquirir graduações em ao menos duas delas para que o PJ não seja considerado um ignorante completo. Ainda estamos no campo da teoria, e testes devem ser feitos para se confirmar este raciocínio, mas o equilíbrio gerado por esta equação então, permite que utilizemos a pontuação do personagem como ponto de referência para converter um personagem de um sistema para o outro. A propósito, a pontuação total de personagem ganha muita relevância prática em ND&T, como veremos adiante.
O signo de três (ou: Pontos de Dispor, de Ação e de Karma)
Pode parecer pura questão de nomenclatura, mas não é: Os Pontos de Dispor (ou PDs), nada mais são que os nossos velhos Pontos de Vida, e continuam representando a mesma coisa, embora num sentido mais amplo: sua quantidade determina a disposição do personagem (e por isto a escolha deste nome) em se manter no conflito. Em um combate, representa a capacidade de agüentar ferimentos até ser derrotado; em um debate, é a simples competência de ainda replicar e buscar argumentos para manter a discussão, e assim por diante. Os Pontos de Ação (ou PAs) fazem as vezes dos Pontos de Magia, e possuem a mesma função de ativar vantagens e poderes especiais. Os Pontos de Karma (ou PKs) funcionam de forma semelhante aos “Dados de Estilo” do PDQ: servem para lidar com os aspectos, e assumem um importante papel no que diz respeito aos mecanismos narrativos do sistema.
Uma ponto importante em relação a estes elementos variáveis do personagem diz respeito à maneira de adquiri-los: Pontos de Dispor iniciais, por exemplo, são calculados toda vez que um personagem participa de um conflito. Esta flutuação se dá porque sempre há fatores aleatórios que podem atrapalhar ou ajudar o personagem (clima ruim, cansaço, nervosismo, aqueles ferimentos que estão icomodando…). Da mesma forma, personagens mais experientes aprendem a lidar melhor com estas situações. Por isto, para calcular os PDs de um personagem, deve-se rolar 2d (o sistema continua se utilizando apenas de dados de 6 lados) e some sua pontuação total ao resultado.
Os Pontos de Ação de um personagem, por outro lado, são estáticos, e são iguais à Pontuação total do personagem, multiplicada por dois.
Ainda não definimos totalmente como funcionará a aquisição de Pontos de Karma. Provavelmente haverá vantagens e manobras mecânicas que possibilitarão aumentar os PDs e PAs – mas é quase certo que o mesmo não vai ocorrer com os PKs, que estarão ligados a ações interpretativas em jogo ou sociais (que se referem à postura do jogador em relação ao jogo).
Interpretação e superinterpretação (ou ainda: “Todo o resto”)
Basicamente, não houve alterações na mecânica de Vantagens e Manobras, proposta no primeiro artigo da série. Continua a idéia de que os atributos são as esferas de ação, enquanto as vantagens são os métodos de ação. As vantagens, como disse, serão graduadas e para se comprar graduações são utilizados pontos de personagem. Cada ponto de graduação permite que sejam adicionadas manobras àquela vantagem. É possível também adquirir manobras negativas para uma determinada vantagem, que dão mais pontos para serem gastos nas manobras positivas.
Agora nos restam dois elementos de suma importância para o sistema, e que certamente estão entre os mais esperados: a mecânica de resolução de conflitos em si, e os Aspectos. A primeira, está semi-acabada, cheia de detalhes por acertar, e portanto vamos aguardar mais um pouco antes de apresenta-la. Os Aspectos, por sua vez, requerem um post exclusivo, que já está sendo providenciado – mas já é possível adiantar que eles serão simplificados.
Não contem com o fim do livro (ou então: “Fim da segunda parte”)
Como se vê, já houve lapidação da idéia original. O esqueleto básico do sistema está definido; a lista de vantagens e manobras está sendo elaborada, e logo teremos também a definição da mecânica geral de resolução de conflitos e dos aspectos. Exemplos de personagens também se fazem necessários, e os apresentaremos logo.
Fica a questão: o que acham do que já foi produzido até aqui?
Por fim, um joguinho entre os amigos: o que têm em comum todos os subtítulos deste artigo? Não é difícil descobrir, e o primeiro que o fizer, ganha um punhado de balas Xáxá!
Até!
Todas as imagens deste artigo são de autoria do Oriebir, e pertencem a ele. Ele fulmina aqueles que se utilizam delas sem avisar.
Todos os subtítulos são nomes de obras do Umberto Eco.
Bingo!
Mas esqueci de perguntar quando vem o próximo?