Por uma Fantasia Medieval menos Clichê

Olá. Depois de certo tempo, clichês são quase inevitáveis. Aqui reúno sugestões para amenizar e substituir alguns, visando aventuras possivelmente mais críveis e com ganchos mais interessantes.
Espécies inteligentes não humanas (ou raças)
As sociedades humanas tendem a discriminar umas as outras a ponto de afirmarem “tal povo não é gente”. Imagine, então, o tamanho do preconceito e desconfiança entre membros de outras espécies. Dificilmente um elfo e um anão estariam em um grupo formado por humanos. Tais espécies se uniriam provavelmente apenas contra alguma ameaça de escala global, algo que se todos não agirem contra, todos sofrerão.
Caso não queira outros além de humanos, utilize alguns traços raciais do sistema que você usa como traços culturais para humanos. Elfos poderiam ser indígenas, por exemplo.
Mestiços (ou meio algo)
Baseado na premissa anterior de que as espécies não se tolerariam, como os mestiços seriam tratados? Como abominações. A prova de que determinados povos que se odeiam se misturaram em algum momento. Aqueles que não forem caçados e mortos, poderiam virar párias, criminosos, mercenários ou serem acolhidos por alguma ordem religiosa “benevolente”, devido a não aceitação das pessoas. Que tal tentar um meio elfo ladino dessa vez?
Raízes culturais (ou de onde você veio)
O aventureiro misterioso é muito comum em narrativas, mas um grupo inteiro sem base cultural é triste. Viver em determinadas regiões normalmente lhe garante conhecimentos e talentos específicos. Que vem de área litorânea costuma saber nadar, reconhecer peixes e tem boa noção do clima. Quem vem de área florestal provavelmente entende de plantas e animais. Fora a música, dança, esporte e artesanato de cada povo.
Laços sociais (ou quem você conhece)
Similar ao item anterior, personagens que não conhecem ninguém podem soar como vazios. Caso nenhum jogador queira determinar seus aliados e inimigos antes do jogo, seria bom que tivessem a chance de ter alguns flashbacks durante a aventura, para justificar as pessoas em sua vida. Ao passar por uma cidade qualquer, um personagem poderia reconhecer uma tia e o jogador criaria uma memória do que eles vivenciaram por ali,.desde que não gere alguma vantagem exorbitante ou ninguém se incomode.
Poderes mágicos (ou magia superpoderosa)
Magos costumam ser a dor de cabeça dos sistemas: começam aparentemente fracos e vão virando monstros faz-tudo destruidores de cidades. É comum ver magos superarem outros arquétipos em suas áreas de proficiência, justamente por terem poderes quase sem limites. Particularmente gosto de mundos onde a magia é rara e perigosa para seus adeptos. Digamos que fazer uma mágica para iluminar uma pequena área custasse alguns dias de vida. Tochas seriam usadas com mais frequência? Aparentemente sim. E se tal mágica custasse meses ao invés de dias? Tochas seriam grandes amigas. Há várias formas de limitar a magia de um cenário: custos altos (como o exemplo anterior), necessidade de uso de materiais raros e caros (partes de monstros muito poderosos) e regulamentação ou proibição pelo governo local, só para citar.
Clérigos (ou sacerdotes de armadura)
Similar ao anterior. Mas quero falar do aspecto bélico. Quando penso em clérigo me vem a imagem de um sacerdote trajando um tipo de batina com um cetro na mão, um clichê meu, talvez. Um sujeito carismático e sábio (ou engenhoso). Não um tipo de padre inquisidor que não usa armas afiadas pois são mortais. Como se uma barra de metal de 2 kg não fosse mortal também. Eu espero ver sacerdotes mais “magos brancos”.
Enfim (ou o último clichê)
Há mais clichês do que digimons, alguns até podem ser divertidos mas é importante variar, manter sua criatividade em ação. Que tal tentar trocar aquele grupo com anão guerreiro, elfo mago, halfling ladino e humano clérigo por um com anão mago, elfo ladino, halfling guerreiro e humano clérigo. Parece que alguns clichês não saem da cabeça…
Até.
Imagem retirada do jogo Baldur’s Gate: Dark Alliance 2 para PlayStation 2 distribuido por Interplay.

Jaime Rangel

Jaime "JJ" Rangel é um cara de Duque de Caxias (RJ), franco, tranquilo e desmemoriado. Gosta de levar inquietação às mentes alheias. Prefere 10 inimigos sinceros a 1 amigo indeciso. Cuidado ao perguntar algo, ele responderá a verdade. E a verdade é sempre mais divertida (pra ele). Escreve/traduz/joga RPG e afins.

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12 Resultados

  1. Melq Rodrigues disse:

    sei la acho que o fato do clérigo ser quase um guerreiro uma coisa irrelevante, ja que é baseado em algo real, tenso é ele poder reviver uma pessoa morta a 9 dias com a maior facilidade

  2. Muito útil! Vou usar mesmo, Pelor seja louvado por me indicar essa matéria. A parte das magias superpoderosas e das outras raças não-humanas foi bem esclarecedor. Vou pensar nisso quando criar meu cenário de campanha.
    Elder Darksoul
    Taverna dos Quatro Cavaleiros

  3. Que tal evitarmos AINDA MAIS os clichês?
    -Você simplesmente não possui elfos e anões e todo o resto. Os humanos estão sozinhos, sendo etnias e países as maiores diferenças, ou eles tem de conviver com raças mais estranhas ainda. Por que eles suportam as outras raças? Por que sem elas eles provavelmente morreriam.
    -Você se TORNA um mestiço: Por algum motivo pessoas começam aleatoriamente a assumir características de outras raças.
    -Poderes mágicos simplesmente não existem. Seres mortais não conseguem fazer magia. Aproveite sua espada, ela vai ser sua única amiga.
    -Clérigos são armas de guerra: O mundo está cheio de criaturas sinistras e você ganhou estas habilidades brilhantes para matar cada uma delas. Sem direito a descanso ou a ficar desperdiçando seus poderes ajudando pessoas comuns, com o risco de perda de poderes.
    -Personagens não começam com classes legais e super poderes. Todos tem seu primeiro nível como camponeses ou outros NPCs, ENTÃO você pode começar a pegar níveis de guerreiro.

  4. alexandre disse:

    Imagine que os humanos são a minoria, e eles é que são discriminados e o grupo é composto só por humanos.
    Imagine clérigos com votos que limitassem mais a sua atuação.
    Veja o caso de Sansão na Bíblia, ele era um Nazireu, não podia beber nada que fosse feito de uva, não podia cortar seus cabelos e não podia tocar em animais ou pessoas mortas.
    Só este último já impediria o clérigo de revistar um personagem morto para obter algum item de valor.
    E se durante um dia na semana o clérigo não pudesse lutar, que impacto isto teria na campanha? E nos outros personagens?
    E se após o clérigo ressuscitar alguém esta pessoa só continuaria viva se viesse a se tornar um “discípulo” do clérigo e consequentemente se tornasse outro clérigo?

  5. Bob NErd disse:

    Então, creio que existem cenários que simulam coisas parecidas. Acho que não como escapar de um clichê, porque penso que já existe todo tipo de cenário. É só procurar bem entre desenvolvedores independentes.
    E não acho que exista algo errado com clichês desde que sejam bem utilizados e não tentem se passar por algo que na verdade não são., por exemplo: um cenário que copia outros cenários e se diz 100% original.

    • Kurosu disse:

      Concordo. Com as raças e a magia pensei em DragonAge, e com um mundo medieval MESMO, sem raças e magia, pensei em Song of Ice and Fire e até nos livros do Deus-Máquina do Leonel Caldela. É bem mais fácil procurar um jogo medieval que não seja “D&D padrão”, do que querer jogar algo que fuja DEMAIS do D&D.

  6. Jaime Rangel disse:

    Olá. Vamos ao papo.
    Melq Rodrigues: Ressurreição é tenso demais pra mim. Beira o ridículo. E o sacrifício heroico? Como fica?
    Elder Darksoul: Agradeço e no aguardo do cenário.
    Sebastião Nemo: Aplaudido de pé. Eu estava pensando na versão “advanced” mas acho que não vou precisar mais.
    Marlon Teske: Eu digo pra galera daqui que é melhor ter 3 ou 4 “raças fantásticas” com contexto do que dezenas que são só pacotes de modificadores.
    alexandre: Gostei dos pontos e Sansão foi um belo exemplo.
    Bob NErd: Honestidade: aprecio muito.

  7. Shaftiel disse:

    Gostei bastante do texto. No caso das raças e do preconceito, eu sempre pensei muito nisso antes de escrever os mundos de fantasia medieval. Foi uma das minhas premissas para criar os elfos negros de Tormenta. Quis abordar esse fator também em meu livro, Benção do Inimigo. Apesar de eu usar fantasia medieval clássica no primeiro volume da série, já deixo bem claro como mesmo estando junto a tanto tempo, os personagens do grupo tratam a si mesmo com muitas ressalvas devido às diferenças raciais. Os elfos são temidos e impiedosos no mundo com sua política de expandir seus impérios, destruindo ou escravizando quem esteja no caminho.

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