Diagramas de Combate (Republicação)

(Artigo originalmente publicado no Portal Defensores.)

Armadura de Ornitorrinco! Descansar!

Oh, olá caros leitores! Mais um perverso Cavaleiro do Santuário tentou causar grande destruição aqui na Austrália, meu atual lar. Certamente esperava atrair os Cavaleiros de Bronze para cá, mas nunca ouviu falar dos Cavaleiros de Oceânia — e demos-lhe uma sova cósmica! Mas, uma vez com o meu dever para com a vida selvagem australiana por ora cumprido, dedicarei-me a vocês, queridos leitores de nosso Portal. Avante!

Diagramas de Combate: Conceito

O artigo que trago a vocês hoje desenvolve o conceito do diagrama de combate, uma forma simples e elegante de inserir elementos táticos relacionados a movimento, ambiente e posição, e sem recorrer às tradicionais miniaturas e grids de batalha, presentes em outros sistemas. Porém, assim como as ferramentas citadas, recomendo a vocês utilizarem diagramas de combate apenas para aqueles encontros em que vale a pena fazê-lo!

Como elaborar um diagrama de combate?

Com um exemplo fica muito simples. Inicialmente vocês devem pensar em como será o ambiente no qual o combate se desenrolará. Vamos tomar, para nosso exemplo, aquela manjada pedreira onde nós Defensores salvamos Tóquio daqueles monstros toscos de borracha barata. Temos, portanto, os seguintes lugares: a área central da pedreira; um penhasco antecipando um belo vale, cortado por um riacho oculto pelas copas de um bosque, a leste; uma sombria floresta de copas cerradas, a oeste; elevações e colinas com algumas cavernas não tão profundas, ao norte; e ruínas de prédios abandonados e destruídos, ao sul. Bom, talvez vocês não reconheçam essa pedreira, mas foi nela onde nós derrotamos o Gorataizilla!

Agora, para efetivamente elaborar o diagrama, basta separar os locais específicos de combate, descanso, recuperação, etc., incluindo regras específicas deles (Regras Especiais), e como podemos ir de um desses locais a outro (Ligações), pela superfície (mais adiante abordaremos outros modos de deslocamento). Na nossa pedreira de exemplo, vamos tomar os seguintes locais:

  • Área Central: obviamente é uma grande área a campo limpo, onde os combatentes vão às vias de fato normalmente. Regras Especiais: uma vez que se está em campo aberto, nenhum personagem tem como se esconder nessa área, a menos que fique invisível. Ligações: Penhasco, Floresta Sombria, Parte Elevada, Ruínas.
  • Penhasco: lugar complicado de lutar, principalmente devido à grande queda que aguarda aos desengonçados! Regras Especiais: ao atacar nessa área, qualquer personagem pode declarar que pretende derrubar seu oponente penhasco abaixo; se for bem sucedido, o oponente deve ser bem-sucedido num teste de Esquiva para não cair e levar uns 2d de dano (e somente levando em conta a Armadura em sua FD para resistir). Ligações: Área Central, Vale e Bosque (caindo/escalando).
  • Vale e Bosque: um lugar tranquilo, com um riacho correndo suave, pássaros cantando alegres, e a luz do Sol a iluminar através das copas das árvores. Regras Especiais: nesta área, um personagem pode recuperar 1 PV e 1 PM por turno, mas só pode receber esse benefício uma única vez por combate, por uma quantidade de turnos igual à sua Resistência. Ligações: Penhasco (escalando/voando).
  • Floresta Sombria: mesmo de dia, qualquer um dentro dessa floresta sentirá como se fosse noite, com sombras cercando-o de todos os lados. Regras Especiais: qualquer teste de Furtividade nessa área é uma categoria mais fácil (testes Normais são considerados Fáceis, e testes Difíceis são considerados Normais). Ligações: Área Central.
  • Parte Elevada: geralmente é aqui que os monstros aparecem para lutar, e é onde os generais costumam ficar para observá-los serem humil… digo, derrotados. Regras Especiais: como aqui a pedreira é mais irregular, para mudar o alcance de ataque de “corpo-a-corpo” para “à distância”, o personagem deve ser bem-sucedido num teste de Acrobacia, Escalada ou o que for pertinente. Ligações: Área Central, Cavernas.
  • Cavernas: apesar de escuras, úmidas e fedendo a guano de morcego, até que serve pra um combatente moribundo descansar por uns instantes, até que esteja pronto pra voltar à ação. Regras Especiais: apenas uma vez por combate, um personagem pode permanecer por um minuto para recuperar 1 PV e 1 PM. Ligações: Parte Elevada.
  • Ruínas: cheio de construções destruídas, um combatente apavorado pode encontrar alguma proteção entre os escombros. Regras Especiais: um personagem pode usar as ruínas como proteção contra ataques à distância, contando com a Armadura 2 das mesmas em vez de sua própria Armadura. Ligações: Área Central.

Ou, de forma mais simples e elegante (no sentido matemático e não artístico), podemos resumir os locais de nossa pedreira e como eles se relacionam:

Diagrama de Combate: Exemplo

Sucintamente, como ficou a nossa manjada pedreira! (Clique para melhor visualização.)

Certamente vocês estão se perguntando (enquanto apreciam meus limitadíssimos dotes artísticos), o que eu quis dizer quando afirmei que esta figura sintetiza nosso ambiente de combate com elegância matemática. E a resposta é simples: esta figura é um grafo! Um grafo é uma estrutura matemática constituída de um conjunto V, cujos elementos nomeiam-se nós ou vértices, e um conjunto E, cujos elementos são pares de elementos do conjunto V (ou seja, um subconjunto do produto cartesiano V²), e que nomeiam-se arestas ou conexões. Ou seja, um grafo constitui-se de um conjunto de pontos e de um conjunto de linhas (ou setas, veremos essa distinção mais adiante) que ligam esses pontos.

Mas não precisam fugir só porque apareceu um pouco de matemática, pessoal! Não se preocupem, irei recorrer à Teoria dos Grafos (o nome que recebe a área da matemática que estudam os grafos, suas propriedades e aplicações) apenas quando for necessário, e somente com o objetivo de facilitar nosso entendimento dos diagramas de combate.

Nota: antes de partir em missão devido à Guerra de Alexa, o líder dos Defensores, OrieRanger, prestou-me um grande favor, desenvolvendo uma versão artisticamente muito mais agradável — embora um pouco mais complexa de ser produzida, é preciso reconhecer — do diagrama de combate da manjada pedreira, e que mostrarei a vocês abaixo.

Diagrama de Combate: Exemplo Melhorado

Versão melhorada do diagrama de combate da pedreira, by OrieRanger. (Clique para melhor visualização.)

Como utilizar um diagrama de combate?

Utilizar um diagrama de combate em jogo é muito simples, também; basta dispô-lo na mesa, como se faz com grids de combate, e colocar marcadores sobre ele, representando os personagens; tais marcadores podem variar de simples fichas a miniaturas. Se o Mestre quiser, também pode ocultar algumas áreas do diagrama, para que os personagens possam descobri-los aos poucos, enquanto o combate ocorre.

As mecânicas básicas de combate precisam ser adaptadas para a utilização com o diagrama de combate, mas não é nada muito complicado. Vamos às mudanças, exemplificando com situações baseadas no diagrama que construímos na seção anterior:

  • Ataques corpo-a-corpo: um personagem pode atacar corpo-a-corpo (isto é, usando sua Força na FA) apenas outro personagem que esteja dentro da mesma área no diagrama de combate, exceto se possuir a Vantagem Membros Elásticos. Exemplo: o Cavaleiro de Ornitorrinco está na Área Central, e só pode usar seu Esporão Venenoso (seu ataque baseado em Força) no Gorataizilla se este também estiver no mesmo local.
  • Ataques à distância: um personagem pode atacar à distância (isto é, usando seu Poder de Fogo na FA, ou Força se possuir a Vantagem Membros Elásticos) qualquer personagem que esteja na mesma área em que ele se encontra, ou em uma área vizinha, que possua uma aresta ligando ambos os locais. Exemplo: o OrieRanger está na Parte Elevada, e pode usar seu OrieBouken (Ataque Especial baseado em Poder de Fogo) tanto no General GoldwingLion, que se encontra no mesmo local, quanto no Gorataizilla que está na Área Central ou nos Lacaios Estúpidos que estão infestando as Cavernas.
  • Movimentação entre áreas: com uma ação de movimento, um personagem pode sair de uma área e se dirigir a outra que esteja conectada com a primeira. Obviamente, personagens com a Vantagem Aceleração, que podem realizar duas ações de movimento em seu turno, podem mover-se por até duas áreas: saindo da primeira, passando pela segunda e chegando na terceira. Exemplo: no seu turno, o Rocket Rider decide sair das Ruínas e rumar para a Área Central, para tomar parte no duelo contra o Gorataizilla; ao fazê-lo, ele gasta sua ação de movimento.
  • Movimentação na mesma área: com uma ação de movimento, um personagem pode aproximar-se de outro, sem sair da área em que se encontra, de modo a poder atacar e ser atacado com Força; da mesma forma, um personagem pode distanciar-se de outro para evitar atacar ou ser atacado com Força, mas sem sair da mesma área. Exemplo: Hair Rider, que estava na Floresta Sombria, foi encurralado por um misterioso inimigo, que identificou-se apenas por Lobo Branco; querendo escapar de suas garras, mas abatido demais para rumar para a Área Central, ele apenas afasta-se do guerreiro, gastando com isso sua ação de movimento em seu turno.

Variações e casos complementares

Obviamente, o 3D&T possui uma série de mecânicas adicionais, feitas para adicionar maior variedade e realismo às situações propostas. Vamos, agora, ver como algumas dessas mecânicas, provenientes de Vantagens (e Desvantagens), Manobras de Combate, Tipos de Movimento e Magias podem ser adaptadas para uso com os diagramas de combate.

  • Distâncias absolutas: basicamente, em 3D&T costuma-se ignorar distâncias absolutas entre personagens, lugares e objetos. Muitas vezes, apenas saber se o inimigo está ao alcance de um ataque corpo-a-corpo ou não, ou se a distância entre o personagem e a saída daquela câmara cujo teto está desabando pode ser percorrida em um turno ou não, é o que interessa no momento. Mas alguns grupos levam as distâncias absolutas a sério, e é sobre elas que falaremos aqui. Dentro de uma mesma área, as considerações sobre as distâncias não mudam; mas, entre uma área e outra, é recomendável atribuir o valor de distância à aresta que as conecta. Assim, se a aresta entre duas áreas tem 60 metros de comprimento, um personagem com Habilidade 2 precisaria de três ações de movimento — logo, três turnos, ou dois se abdicar de sua ação padrão no primeiro turno em favor de uma ação de movimento — para chegar à nova área de combate. Note que, nesse caso, Vantagens como Aceleração e Teleporte funcionam normalmente, cedendo um bônus respectivo de +1 ou +2 na Habilidade do personagem para determinar sua velocidade em combate. Em Teoria dos Grafos, alguns grafos possuem pesos em suas arestas, justamente para representar distâncias absolutas entre um local e outro; tais grafos são conhecidos por grafos ponderados.
  • Ações em arestas: claro que, valendo a situação descrita no item acima, alguns personagens precisarão passar um ou mais turnos movimentando-se entre uma área de combate e outra — ou, literalmente falando, em aresta. Se distâncias absolutas estão sendo levadas em conta, basta verificar se um personagem em aresta está a uma distância suficientemente próxima para atacar ou ser atacado por outro personagem. Entretanto, uma possibilidade em diagramas de combate, sem necessidade de distâncias absolutas, é ponderar suas arestas em termos de ações de movimento: por exemplo, são necessárias duas ações de movimento para sair de uma determinada área de combate e chegar a outra — um turno inteiro para personagens com a Vantagem Aceleração ou que abdiquem de sua ação padrão, ou dois turnos normais. Logo, enquanto o personagem se encontra em aresta, ele pode atacar ou ser atacado por Força apenas por personagens igualmente em aresta, e pode atacar ou ser atacado por Poder de Fogo tanto por personagens em aresta quanto por personagens que estejam em qualquer uma das áreas conectadas pela aresta. Por fim, não é possível permanecer em uma aresta, um personagem deve utilizar todas as suas ações de movimento para sair da aresta e assim chegar em uma área de combate — ou seja, um personagem não pode realizar uma ação de turno completo enquanto estiver em aresta.
  • Tipos de movimento: além de andar, alguns personagens podem dispor de outros tipos de movimento, como por exemplo o nado, a escalada, o vôo e a queda (hehehe). Algumas arestas podem ser percorridas apenas com determinados tipos de movimento; em nosso exemplo de diagrama de combate, apenas escalando ou caindo é possível ir do Penhasco ao Vale e Bosque, e para fazer o movimento contrário, apenas escalando ou voando. Portanto, o tipo de movimento que deve ser empregado na aresta é apenas mais uma característica que podemos atribuir a ela, como um peso qualitativo. Se distâncias absolutas são empregadas, basta considerar os modificadores de velocidade associados aos tipos de movimento, descritos na página 1d+69 do Manual 3D&T Alpha, para determinar quantas ações de movimento são necessárias para um personagem percorrer a aresta. Mas quando se é adepto de distâncias relativas, basta atribuir à aresta a quantidade de ações de movimento de cada tipo de movimento empregado. No exemplo acima, podemos dizer que são necessárias quatro ações de movimento para percorrer escalando a aresta que liga as áreas Penhasco e Vale e Bosque, e apenas uma ação de movimento para fazer o mesmo voando ou caindo.
  • Movimento unidirecional: em alguns casos, você somente pode percorrer uma aresta em um único sentido. Por exemplo, digamos que existem duas câmaras, A e B, em uma masmorra; ambas são consideradas áreas de combate distintas no diagrama que representa a dungeon. Porém, a porta que liga as duas câmaras — e que, no diagrama, é representada por uma aresta conectando as duas áreas — somente permite passar da câmara A para a B, sem permitir o retorno de B a A, a sala anterior (podemos dizer que é uma porta reforçada com um intrincado mecanismo que somente abre para permitir tal tipo de passagem). Para representar esse tipo de situação num diagrama de combate, usa-se uma seta ou aresta orientada. Logo, se uma aresta orientada está presente, o movimento entre duas áreas de combate conectadas por ela está restrito a apenas um sentido. Em Teoria dos Grafos, são classificados como dígrafos os grafos que possuem arestas orientadas.
  • Vantagens Teleporte e Sentidos Especiais: como no caso em que distâncias absolutas são consideradas, já temos idéia de como funciona a Vantagem Teleporte (como discutido acima), vamos verificar como funciona a Vantagem no caso de distâncias relativas. A única ressalva é: você pode teleportar-se sem teste para lugares que pode ver, e sendo bem-sucedido em um teste de Habilidade para lugares que não pode ver. Como enquadrar isso com diagramas de combate? Simples, considera-se que um personagem pode “ver” tanto sua própria área de combate quanto as áreas vizinhas a ela — com exceções apropriadas; no exemplo desse artigo, um personagem com Teleporte na área Ruínas pode teleportar-se dentro da mesma, ou para a Área Central, geralmente sem testes, mas para teleportar-se para trás de um escombro particularmente alto e opaco nas Ruínas, ou para trás do gargantuano Gorataizilla, ele precisaria de um sucesso em seu teste. Até aí tudo bem — o problema maior surge quando levamos em conta a Vantagem Sentidos Especiais. Bom, nem tanto; a maioria deles serve justamente para contornar limitações da visão comum, seja com outros sentidos (Audição e Faro Aguçados), seja com sentidos complementares de visão (Ver o Invisível, Visão de Raios-X, Infravisão, Radar). Contudo, temos Visão Aguçada, que simplesmente permite ver mais longe; e agora? Proponho a vocês uma solução: um personagem com Visão Aguçada pode estendê-la a até duas áreas de combate; assim, se aquele sujeito que está nas Ruínas, além de Teleporte também possuir Visão Aguçada, ele poderá se teleportar sem testes para a Área Central, a Floresta Sombria (ou o que ele conseguir ver lá, hehehe), a Parte Elevada ou o Penhasco — se não fosse pela Visão Aguçada, ele precisaria de sucesso em um teste para teleportar-se a esses locais. Por fim, não é possível teleportar-se para uma aresta.
  • Alcance de magias: acredito eu que este é o último caso complementar a ser discutido aqui. Na página 1d+80 do Manual 3D&T Alpha, vemos as cinco categorias de alcance de magias: pessoal, toque, curto, longo e visão, além de magias de alcance próprio ou mesmo determinado via PMs. Para as categorias  pessoal e toque não há problemas, e a categoria visão enquadra-se na situação que acabamos de ver: magias com esse tipo de alcance afetam até sua área ou as áreas vizinhas, se sua visão for normal, ou até áreas que sejam vizinhas das vizinhas de sua área, com Visão Aguçada. Por fim, podemos considerar que magias de alcance curto atingem apenas até a distância de combate corpo-a-corpo, em sua própria área; e que magias de alcance longo atingem ou em qualquer lugar de sua própria área apenas, ou podem chegar a atingir as arestas que partem dela ou mesmo as áreas que são suas vizinhas — a decisão final, claro, é do Mestre.

Encerramento

Bom, meus caros leitores, espero que tenham gostado do meu artigo de estréia aqui no Portal Defensores. Mas… o dever chama! Antes de convocar a Armadura de Ornitorrinco e partir, aponto para vocês algumas referências sobre os diagramas de combate: além do próprio Manual 3D&T Alpha, também recomendo a Wikipedia como um bom ponto de partida para o estudo inicial ou possível aprofundamento, àqueles que se interessaram na Teoria dos Grafos.

Então, adeus! E não se esqueçam:

Avante, Defensores!

Da Republicação

Primeiro, um agradecimento ao Renato Trimegisto pela recuperação dos artigos do antigo Portal Defensores. Depois, tenho mais uma referência adicional sobre grafos: um material introdutório às redes complexas, em português e com linguagem simples e acessível, do qual sou um dos autores, e que encontra-se no 4Shared.

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