Mais épico que o próprio épico!
Minha parca experiência como mestre sempre me levou a crer que jogdores de RPG, principalmente os fãs de 3D&T, adoram coisas épicas. Por épico, falo daqueles contos de heroísmo exagerado, cheio de floreios e que colocam o destino do mundo em chqeue a cada rolagem de dados. Neste artigo vou tentar colocar aqui algumas dicas para ajudar os mestres a lidarem com este tipo de aventura em sua mesa de jogo.
Afinal, o que é “Épico”?
Na verdade, a poesia épica é um gênero literário que conta sagas e aventuras de grandes heróis mitólogicos. Entre seus exemplos mais conhecídos estão a Ilíada, que conta os feitos do herói Aquiles nos últimos anos da Guerra de Tróia; e a Odisséia, que narra a trajetória de Ulisses voltando desta mesma guerra; ambos atribuídos a Homero. Outros épicos conhecidos são Os Lusíadas, de Luís de Camões, e Beowulf, um clássico da literatura Inglesa.
Pode-se dizer grosseiramente que a poesia épica é sobre heróis que fizeram ou fazem grandes feitos, mas então… praticamente todas as aventuras de fantasia seriam épicos, não? Pode ser que sim, mas vamos pensar nisso de forma um pouco diferente. Enquanto os poemas épicos falam sobre heróis extraordinários realizando feitos absurdos em um mundo de pessoas normais, vamos pensar em mundos que, diferentemente do nosso, atos heróicos são já relativamente corriqueiros, sendo assim, nossos heróis épicos serão ainda mais extraordinarios que os heróis ‘comuns’.
A Jornada
A jornada épica não se diferencia muito de uma campanha padrão de fantasia, exceto que é aconselhável fazer um mínimo de planejamento prévio. Quantas aventuras terá sua saga e qual o nível de poder conquistado pelos jogadores, aproximadamente. Isso evitará dores de cabeça mais tarde, e ajuda a deixar o enredo mais conciso.
Heróis épicos são movidos por paixões. Honra extrema, devoção, amor… um herói épico poderia ser um cavaleiro errante capaz de cruzar o mundo para olhar os olhos de sua amada mais uma vez, ou um samurai tão devotado ao seu senhor que seria capaz de matar toda a sua família sem hesitar por uma ordem de seu mestre. Desvantagens como Devoção, Código de Honra, entre outras, devem sempre ser levadas aos extremos nesse tipo de campanha, pois isso será a força motriz dos personagens.
Vale frisar que nem toda saga épica precisa necessariamente colocar o futuro do seu cenário de campanha em jogo. Uma busca pessoal pode perfeitamente ser uma saga épica, desde que consiga elevar os heróis um nível acima dos aventureiros ‘normais’. Talvez em seu mundo de campanha seja normal enfrentar um necromante maligno para salvar o amor da sua vida, mas andar mil dias pelo deserto, invadir a torre do lich-demônio-louco, lutar por três dias e três noites inteiras e sair de lá com sua amada nos braços pode ser um pouco mais impressionante. Isso nos leva a outro ponto…
Deixando Sua Marca
Para ser realmente épico, não basta apenas derrotar o tal lich. Tudo começa bem antes, na concepção do personagem. Veja que nas lendas e na poesia épica, tudo é exagerado. Aquiles, por exemplo, foi mergulhado no rio Estíge para tornar-se imortal, exceto por seu calcanhar, que era seu ponto fraco; foi educado por Quíron, o centauro, lutou na guerra de Tróia (uma guerra que foi desencadeada por causa da beleza de uma mulher, vide tópico acima) e foi morto por uma flecha certeira em seu calcanhar – o indiscutível ponto fraco.
O que quero dizer é que o cara era um herói desde o berço. Algumas características simples (Imortal, Ponto Fraco) estão intrinsicamente ligadas à lenda, e são suficientes para deixá-lo marcado na nossa memória. Da mesma maneira, ao mestrar ou jogar uma campanha épica, certifique-se que seus heróis tenham em si esses pequenos detalhes que o diferenciam dos mortais comuns. Muitas vezes pequenas vantagens e desvantagens comuns podem fazer a diferença, basta encará-las da maneira certa.
Feitos impressionantes também são uma ótima maneira de marcar a vida de um herói. Uma maneira interessante de tentar incluir algo assim na sua campanha é utilizar alguma moeda de troca (pontos de Experiência, por exemplo) que permita aos jogadores comprar ‘acontecimentos’ na história, dentro de um limite razoável (leia-se: com aprovação do mestre). Assim, se um jogador quiser um combate épico com seu arqui-rival no topo da Torre das Mil Mortes, ele pode simplesmente gastar a XP necessária para o tal rival aparecer. Veja que o importante aqui não é comprar acontecimentos que beneficiarão o personagem, mas sim coisas que serão interessantes para a história.
Épico é Poder!
Não!
Embora estejamos tentados a pensar isso, não necessariamente é verdade. A ‘epicidade’ está mais na descrição e na forma de superar os desafios do que no poder dos heróis em si. Não estamos falando de simplesmente jogar meia dúzia de personagens com poder suficiente para destruir o mundo uns contra os outros, mas de fazer heróis serem bem-sucedidos aonde ninguém mais seria.
No começo deste artigo eu falei sobre planejar o nível de poder da campanha, e volto a falar: Uma campanha épica colocará nas mãos dos heróis algo muito além do que seria adequado ao nível de poder deles. Personagens fracos podem afetar o destino de reinos inteiros, ao passo que heróis poderosos podem interferir nos planos dos próprios deuses!
Uma campanha épica poderia começar com personagens Lutadores (7 pontos) e progredir até 13 pontos do decorrer de 12 a 15 aventuras, por exemplo. É uma evolução relativamente rápida, mas vale lembrar que os heróis estarão no limite o tempo todo! Por outro lado, já vejo gente perguntando “mas que tipo de feito heróico um personagem de 7 pontos poderia realizar?”.
Bem, começamos com alguma motivação, como um cavaleiro extremamente devotado ao seu senhor e seu reino. Na primeira aventura, tal senhor poderia morrer durante uma batalha, fazendo o cavaleiro ficar totalmente perdido. Então algum oráculo aponta pra o personagem o caminho do reino dos mortos, e ele parte em uma busca para resgatar seu senhor das sombras da morte. Ele desce até os domínios da morte, mas sem poder para vencer a deusa do submundo, ele é forçado a fazer uma barganha, que será cobrada posteriormente. Depois de guiar seu senhor de volta ao mundo dos vivos, o exército do reino, ao vislumbrar seu protetor voltar da morte, vence a guerra.
Perceba que a falta de poder do protagonista o forçou a fazer uma barganha com um ser superior, que já deixa um gancho para a continuação desta história.
Por outro lado, caso queira usar personagens realmente poderosos para sua campanha, tenha em mente que eles podem fazer um estrago danado. Usar personagens de 15, 20, 30 pontos ou mais pode ser bem divertido, mas é bom estar preparado para incluir mudanças drásticas nos seus planos e no seu cenário, afinal…
Epílogo É Tudo
Sim, além do clímax e da luta épica, o epílogo é uma parte bem importante. Não vou mencionar aqui a batalha-final-épica em si pois já fiz um artigo falando sobre isso.
A importância do epílogo é mostrar que as ações dos personagens fizeram diferença no mundo, afinal, não adianta ser um grande herói épico se o futuro do mundo seria o mesmo independentemente das suas ações. Aquela mecânica de ‘pontos de experiêcia para comprar econtecimentos’ cai como uma luva aqui, colocando algum poder de decisão nas mãos dos próprios jogadores.
Em níveis baixos, derrube reinos, reconstrua fronteiras, mate reis, rainhas, vilões e heróis sem dó. Faça este mundo girar! Colocar PCs como regentes nesse novo cenário que se formou é uma opção válida também. Só não caia no erro de deixar tudo do mesmo jeito que estava antes do fim da saga.
Em níveis mais altos, não tenha receio de atacar algumas fundações do próprio cenário. Alterações nas regras de magia, queda e ascenção de deuses, destruição do mundo… nada disso deve ser tabu em uma campanha épica de alto nível. Mesmo a destruição de uma grande ameaça maligna, onde teoricamente o mundo realmente voltaria a ser pacífico, deve trazer alguma alteração profunda no cenário.
Considerações Finais
No fundo, toda campanha de RPG, mesmo as mais modestas, devem ter algum tempero que a tore emocionante, única e marcante. Várias das dicas contidas aqui podem se aplicar facilmente a outros estilos de jogo.
Bom jogo a todos!
Nunca li um texto que me ensina-se tanto sobre RPG! Muito obrigado por essas dicas.
Valeu, que bom que foi útil! =)