A Allihanna das Cidades
Allihanna é a deusa da natureza, dos animais e das regiões selvagens. É adorada por povos bárbaros e amantes da vida simples, que vivem em florestas, montanhas, savanas ou qualquer lugar distante da civilização. Seu contraponto, normalmente, é a vida urbana: a agitação e a correria das cidades; os muros de concreto e ruas pavimentadas.
Mesmo no coração da civilização, no entanto, há espaço para a natureza se desenvolver – ou, ao menos, algum tipo de natureza. Seja entre as ruas e becos dos grandes centros urbanos, seja na sujeira e podridão dos esgotos, as condições são propícias para o surgimento de um ecossistema único, formado por musgos, fungos, pombos, ratos e outros que fazem da selva de pedra o seu habitat natural. E também ali, é claro, podem surgir aqueles que adoram e devotam suas vidas a este mundo, recebendo a bênção da deusa na forma de poderes milagrosos.
A seguir estão dois kits de personagem próprios para estes devotos de Allihanna e outras deusas da natureza habitantes de grandes cidades: o Clérigo do Grande Rato e o Druida dos Esgotos.
Clérigo do Grande Rato
Exigências: Clericato, Arena (H+2 em cidades), Código de Honra (veja abaixo), Crime
Função: baluarte
Allihanna é adorada de muitas formas ao redor de Arton. Existe a Allihanna dos leões nas savanas, a dos grifos nas montanhas, a dos macacos nas florestas, mesmo a dos vermes nos pântanos, entre dezenas de outras. Nas grandes cidades, a sua principal face é, provavelmente, a Allihanna dos ratos: aquela que se esgueira nas ruas, se esconde nos esgotos e se reproduz na sujeira.
O clérigo do Grande Rato é o devoto desta face da deusa. É um habitante das ruas: pode ser o xamã e guia espiritual de uma comunidade de sem-teto, ou então um mendigo solitário, que seguiu o caminho dos ratos para melhor sobreviver entre as frestas e rachaduras da sociedade. A vida na selva urbana requer uma série de habilidades bastante específicas, semelhantes às de um ladrão – se mover sem ser notado, furtar alimentos e outros objetos; por isso, raças com habilidade natural para o crime, como halflings e principalmente goblins, possuem uma facilidade maior para seguir este caminho, mas eles não são incomuns em qualquer raça que habite grandes cidades.
Código de Honra (do Grande Rato) (0 pontos). O código de honra do Grande Rato equivale a 1.º e 2.º Leis de Asimov, mas válidas apenas para ratos – como se trata de um caso muito específico, no entanto, ele não dá pontos ao personagem. Ele pode se comunicar livremente com ratos de qualquer espécie, utilizando-os como espiões e informantes, mas deve também obedecê-los nas poucas ordens que forem capazes de lhe dar; costuma tratar os roedores como se fossem parte de uma grande tribo, e, em resposta, é tratado assim também por eles.
Comando de Ratos. O clérigo pode dar ordens a qualquer quantidade de ratos, que o obedecerão imediatamente. As ordens devem ser simples, próprias para a mente diminuta de um roedor, contendo um único comando, como atacar um alvo, roer uma corda, correr até algum lugar (levando algum item ou mensagem preso a ele), etc. O custo é de 1 PM por ordem para cada grupo de 5 ratos menores, ou para uma única ratazana grande; ratos muito maiores, ou que sejam dotados de características mágicas ou sobrenaturais, em geral terão direito a um teste de Resistência.
Peste. A vida nas ruas, em meio aos ratos e à sujeira, dotou o clérigo das mesmas pragas e pestes de um rato comum. Qualquer ataque seu que cause pelo menos 1 ponto de dano pode também contaminar o alvo com uma doença, a menos que ele passe em um teste de Resistência. A doença começa a fazer efeito 1d dias depois da contaminação, deixando a vítima fraca e debilitada, com um redutor de -1 em todos os seus atributos; uma semana depois, ele deve fazer um novo teste de Resistência e, caso falhe, receberá um novo redutor de -1, e assim a cada semana seguinte até ficar com Resistência igual a 0. Quando chegar a R0, deverá fazer um Teste de Morte, e passará a fazer um a cada semana a partir daí, como se estivesse sob efeito de castigo contínuo. Curar a doença requer pelo menos uma semana de tratamento, em que o personagem deve ficar sob repouso absoluto, além de um gasto equivalente a 4 PEs em médicos qualificados e remédios; atendendo a estes requisitos, ele elimina um redutor de -1 sobre seus atributos e pode fazer um novo teste de Resistência para se curar definitivamente. Alternativamente, o personagem também pode ser curado com um uso do feitiço Cura Mágica, seguindo as suas regras normais para cura de doenças. Uma vez que esteja curado, os redutores restantes são eliminados na razão de -1 por dia. Clérigos NPCs podem causar doenças mais perigosas, a critério do mestre; e, como efeito secundário deste poder, o personagem também se torna imune a qualquer doença natural causada por ratos e criaturas aparentadas.
Presença Invisível. O clérigo é muito difícil de ser notado. Não chega a ficar realmente invisível, mas sua aparência é tão pequena e insignificante que ninguém consegue prestar atenção – aos olhos dos outros, é como se ele fosse apenas um rato. Isso lhe concede os mesmos benefícios da vantagem Invisibilidade, porém apenas enquanto não fizer nada que possa chamar a atenção de alguém, como falhar em um teste de Furtividade, atacar um inimigo, etc. Este poder é considerado automaticamente ativo sempre que o clérigo entra em um aposento ou se depara com qualquer pessoa que não esteja ciente dele em primeiro lugar, a menos que deliberadamente chame a sua atenção por algum motivo. Para ativá-lo uma vez que estejam cientes da sua presença, no entanto, é necessário primeiro desviar sua atenção de alguma forma, e então passar em um teste de Furtividade.
Druida dos Esgotos
Exigências: Clericato, Código de Honra (veja abaixo), Animais
Função: dominante
Nas grandes cidades, exceto em lugares específicos como parques ou jardins, não é comum encontrar grandes áreas verdes, ou que ainda sejam preenchidas de qualquer forma pela sua paisagem natural. Existem, no entanto, outros ambientes que podem ser considerados selvagens; locais abandonados pela sociedade, que se limita a usá-los como depósitos de lixo e dejetos. Com o tempo, eles podem formar uma geografia própria, com montanhas de entulho e rios de podridão, onde um ecossistema particular pode acabar se desenvolvendo.
O druida dos esgotos faz destes locais o seu lar. Pode viver de fato nos esgotos, se existirem; ou em meio a qualquer lugar onde o lixo e os dejetos de uma cidade sejam depositados. É da sujeira e da podridão também que retira os seus poderes, desde a sua aura de mau-cheiro, que tira a concentração e atrapalha os inimigos, até a conjuração de criaturas mágicas feitas do ambiente que o rodeia.
Código de Honra (de Allihanna) (-1 ponto). O druida dos esgotos deve seguir o mesmo código de honra de um druida de Allihanna comum, que envolve não atacar animais selvagens exceto em auto-defesa, não usar armaduras metálicas ou feitas de couro de animais (exceto daqueles que tiveram morte natural), bem como armas cortantes e perfurantes (exceto no caso de armas naturais). Ele também não consegue descansar adequadamente em ambientes urbanos de maneira geral (não recupera PVs nem PMs com descanso), mas apenas em locais considerados selvagens, incluindo os lixões onde habita.
Aura de Podridão. O druida exala uma poderosa aura podre, com alcance igual a Rx5 metros. Todos dentro desta área, sejam aliados ou oponentes, devem fazer um teste de Resistência: aqueles que falharem se sentirão desconfortáveis devido ao mau-cheiro, recebendo uma penalidade de -1 em todas as suas jogadas. Os que passarem ficarão imunes até saírem da sua área de efeito; caso voltem a entrar nela, deverão realizar o teste novamente. Como efeito colateral deste poder, o druida também se torna especialmente insensível ao mau cheiro, recebendo um bônus de +3 em testes de Resistência para evitar quaisquer efeitos negativos ligados ao olfato.
Forma Selvagem. O druida pode, uma vez por dia, assumir a forma de um animal ligado ao seu habitat, escolhido durante a criação do personagem. São permitidas criaturas urbanas como ratazanas e gambás, ou outras aprovado pelo mestre – alguns druidas poderosos podem mesmo se transformar em crocodilos e outros predadores de grande porte, sendo provavelmente a origem de lendas sobre monstros habitantes dos esgotos. Independente do animal escolhido, ele sempre terá Sentidos Especiais (audição aguçada, faro aguçado e visão aguçada).
Garras de Fera. O druida pode usar garras (ou apenas unhas muito compridas mesmo) para causar dano em combate. Durante uma batalha, se estiver lutando desarmado, ele pode gastar o seu movimento e a sua ação para realizar dois ataques na mesma rodada.
Nova Magia: Invocação do Elemental Podre
Escola: Elemental
Custo: 2 a 10 PMs
Alcance: longo; Duração: sustentável
Este feitiço funciona da mesma forma que Invocação do Elemental (Manual 3D&T Alpha, pg. 1d+99). A diferença é que, ao invés de ser feito de elementos da natureza, como fogo, terra ou ar, ele será feito de podridão e elementos dos esgotos – de maneira geral, sujeira e dejetos. As suas regras são as mesmas do feitiço original, exceto que, ao invés das habilidades de um Corpo Elemental, a criatura invocada terá o poder Aura de Podridão, igual ao do kit Druida do Esgoto descrito acima.
Este feitiço também pode ser aprendido em versões Superior e Suprema, como o Invocação do Elemental comum.
NOTA. A ilustração do artigo é a capa da edição nacional de Rei Rato, romance de China Miéville publicado pela Tarja Editorial, e é de autoria de Phil & Ico.
Ficaram muito legais as classes e o conceito. Mas tu já viu o Druida da Favela do Valkaria – Cidade Sob a Deusa? Eu sei que seus kits são para 3D&T mas as habilidades ficaram bem semelhantes. Porém o teu tem coisas novas bastante interessantes também. Enfim, muito legal. Parabéns!
É meio repugnante, mas ficou legal. Só achei devido aos poderes o Clérigo do Grande Rato está quase um atacante. Fico imaginando o que poderia ter despertado o incentivo para escrever estes Kits.
Opa.
Esse material é bem mais antigo que o Valkaria, na verdade… Eu tinha feito ele pra um dos primeiros textos da Iniciativa 3D&T, tem a versão antiga no meu blog particular lá se alguém quiser conferir. Eu só dei uma boa revisada e ajeitada aí, já que na época o Manual do Aventureiro ainda não tinha saído, então não se tinha modelos muito certos pra alguns kits (tipo o druida mesmo).
E a inspiração original pra eles foi a leitura do Lugar-Nenhum, livro do Neil Gaiman. O clérigo do Grande Rato, pelo menos, foi bem inspirado no livro, apesar de eu ter adicionado um bocado de coisas também. O druida dos esgotos foi só uma outra idéia a toa, pensando em onde se teriam áreas selvagens dentro da cidade mesmo.
Um idéia boa seria criar novos monstros adaptados ao ambiente das cidades, como “gárgulas urbanas” e seres ligados ao ambiente do esgoto, etc.
Enfim, desenvolver esse cenário de cidade hostil que é bem interessante.
É bom ler coisas legais de 3D&T para Tormenta, embora não jogue mais, curto bastante 3D&T. Parabéns pelo artigo!
Concordo com o Felipe Soares que os poderes do Clérigo do Grande Rato está mais para atacante que baluarte, talvez alguma habilidade que prevenisse doenças e envenenamentos no grupo, ou algo que permitisse o grupo transitar pelos esgotos e pelo submundo, re-forçasse o papel de Baluarte.