O Homem do Futuro – crítica
Se há um grande mérito em O homem do futuro está na tentativa de produzir um filme de mass media que não idiotize o expectador. Explico: durante décadas o cinema brasileiro se dividiu entre filmes “de arte”, voltado para um público seleto ou dotado de certo conjunto de hábitos de apreciação e uma área mais obscura: os filmes junta-menino, nos quais o lixo produzido por Xuxa Meneguel e (mais recentemente) Renato Aragão se tornou novo lugar-comum da arrecadação desta fatia de mercado. Claro que há exceções e os próprios Trapalhões oscilaram para dentro e fora do cinema ridículo, dependendo da produção, no século passado. Temos ainda o esforço sensacional de Guel Arraes nesse campo, por exemplo, trabalhando em ritmos de comédia e comédia romântica com um pé no intelectual. E outros, cuja lista fica pra outro dia.
Com Tropa de Elite e tentativas bem menos válidas como Se eu fosse você, o cinema nacional tenta criar um fôlego novo para o consumidor médio. Mas, em O homem do futuro a coisa parece engrenar – e isso não é exatamente a parte elogiosa do filme. A ideia de filmes despretensiosos, para o grande público, mas que consigam fugir do hábito global de chamar os amigos para brincar de cinema enquanto emburrecem as crianças, é bem visível.
O filme conta a história de João, o “Zero” (Wagner Moura), um físico infeliz por conta de traumas do tempo de faculdade e de um amor fracassado com Helena (Aline Morais), que acaba por, acidentalmente, criar uma máquina do tempo. De volta a 1991, João vê a chance de mudar seu passado e, assim, seu futuro.
A direção e texto de Cláudio Torres (Redentor [2004], A mulher invisível [2009]) são simples, sem grandes riscos, envolvendo um cuidado técnico e cenográfico interessante na reconstituição da década de 1990. Os filmes clássicos e holywoodianos do gênero são a influência mais direta do roteiro – como De volta para o futuro – guardadas as devidas proporções, naturalmente. O mesmo roteiro, aliás, ajuda, quebrando os clichês com alívios cômicos, embora não se preocupe exatamente em inovar. A montagem do filme parece esforçada, especialmente quando lembramos de que viagens no tempo são coisas confusas. A recriação rápida e simplificada do mundo acadêmico do século passado pode provocar alguma saudade nos mais nostálgicos.
O filme prima por uma explicação física fictícia, superficial, mas não chega a ser ridícula na maior parte do longa – coisa que um físico formado pode negar. A tônica central é mesmo o romance entre o João e Helena, ainda que a discussão sobre tempo, vida e desafios esteja lá, bem presentes. A história carrega, contudo, um ritmo lento, às vezes arrastado, atrapalhado pela tentativa de romantização da física quântica e exagerando na ingenuidade do jovem João – assim como deixa lacunas para explicar a relação de Helena com ele.
Além de Wagner Moura (com sua capacidade de viajar entre cômico e dramático) e Aline Morais (que chora com uma facilidade surpreendente e não é má atriz) o elenco é sem sal. Maria Luisa Mendonça faz o feijão com arroz, enquanto Gabriel Braga Nunes (que vive o vilão Ricardo) não se encaixa lá muito bem como um jovem de vinte e poucos anos, ainda meio colado no último facínora novelesco que viveu. Fernando Ceylão (Otávio, o melhor amigo de João) é fraco, sendo o próprio personagem culpado pela falta de sabor de sua participação. A bem da verdade não é o melhor trabalho de Moura, também. Pela própria forma de “filme pipoca”, o célebre ator não vai além do necessário e exagera no pastelão, vez ou outra.
O balanço final é que O homem do futuro é uma boa diversão de fim de semana. Encaixa-se melhor, como toda “comédia romântica” como um programa de casal, mas nada impede que funcione como uma conferida casual também. Torres faz o esforço de abrir o cinema brasileiro para histórias mais simples e fantasiosas, sem apelos de reflexão social. Até os furos realísticos e uma interpretação americanizada do mundo acadêmico-científico brasileiro mostra essa tentativa de “tradução”. No mais, não procura ir além disso e, como foi dito aqui no começo, faz isso bem.
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A imagem usada no post é uma das fotos de divulgação do filme, usada aqui porque eu quero. 🙂
Eu assisti “A Mulher Invisível” e achei bacana. É um esforço muito válido isso de fazer um cinema de entretenimento de qualidade no país. Por que indiretamente acaba criando espaço pra que mais filmes venham, e no meio deles talvez alguma coisa como “Tropa de Elite”.
Ainda acho o cinema brasileiro fraco, é só pegar e comparar com a produção e o acabamento de “El secreto de su Ojos” , o policial/melodrama argentino com qualquer filme daqui.
E olha que o Juan José Campanela antes de fazer esse filme mandou um montes de filme-novela domésticos e eram excelentes também. (Aí foi pros EUA dirigir House, e voltou turbinado)
Um cara que gosto muito e acho que merecia uma segunda chance é o Jorge Furtado, que como diretor é foda, mas como roteirista é mais foda ainda.
Os filmes deles ainda são pra um público mais intelectualizado, mas ainda assim qualquer um ainda assistiria fácil, ele é um grande fã do cinema americano clássico. (Bastava só ele ficar longe de atores mirins como em “O Meu Tio Matou um Cara”)
Pena que ele não esteja incluído nessa nova onda do cinema brasileiro.
PS: No final desse comentário eu surtei e repeti a palavra “ainda” 3 vezes.
O filme é bem bacana mesmo. Vale a pena conferir!
Fiz uma crítica no meu humilde bloguinho:
http://cinelogin.wordpress.com/2011/09/05/o-homem-do-futuro-critica/