Resenha: Crônicas da Tormenta

Resenha: Crônicas da Tormenta 1

Capa de Greg Tocchini e logotipo de Daniel Ramos


Lançado durante a RPGCon deste ano, onde consegui meu exemplar devidamente autografado por uma cambada de autores, Crônicas da Tormenta é a primeira antologia de contos do cenário e com algumas exceções, contém o melhor já publicado neste aspecto para o cenário até hoje.
O livro começa com história de herói, do consagrado Leonel Caldela, que se parece um pouco com O inimigo do mundo: enredo fatalista, cortes com cenas dos deuses, e um clima bastante depressivo no final. Se você espera ler uma história de herói, fique sabendo que o título parece ser uma pequena piada do autor. Ainda assim, vale ler e ver o Khalmyr trollando o Tauron, mesmo que você prefira histórias mais positivas.
Em seguida temos o colega de blogue Remo em teopatia, uma verdadeira viagem pela mente de um psicopata e sua jornada de auto-descoberta como clérigo de certo Deus do Caos, este conto poderia ser um dos melhores do livro, mas seu defeito é deixar o leitor com uma sensação de incompletude: teopatia mais parece o primeiro capítulo de um romance do que um conto pela definição usual.
O último golpe de Javelin, de Claudio Villa, é um bom conto. Não é excepcional, tampouco ruim, apenas normal. Uma história clássica de ladrões, sem grandes surpresas, alguma ação, enfim, com todos os ingredientes certos. Só ficou faltando aquele toque especial, sabem? O autor ainda precisa achar um estilo que o defina e o diferencie de outros autores.
E finalmente chegamos num dos meus preferidos da antologia, e não estou dizendo isto por ser do colega de blogue Marlon Teske, o emocionante ária noturna. Ária tem todas as boas características das melhores histórias de piratas: personagens carismáticos, história envolvente, ação na medida certa e reviravoltas que de cair o queixo. Não deixe de ler caso consiga por as mãos no livro.
Quanto ao próximo conto… Vou confessar que não consegui terminar de ler canção para duas vozes, porque o começo me pareceu como se Crepúsculo tivesse encontrado Tormenta, talvez a autora Ana Cristina Rodrigues tenha se redimido mais a para a frente, mas como ninguém está me pagando para fazer essa resenha, não vou passar pela tortura que é ela alisando o personagem principal. Desculpem-me.
revés, do Douglas MCT, é um bom conto e mostra um lado obscuro para a maioria das pessoas que jogam no cenário. Apesar de ganhar pontos por isto, ele perde um bocado pela narrativa um pouco confusa, não tente ler enquanto estiver distraído ou simplesmente não vai conseguir entender a história.
O perfil do escorpião é provavelmente o primeiro material que o Rogério Saladino escreve para Tormenta em anos, e ele não decepciona com esta história de terror no Deserto da Perdição. Meu único porém com o conto é o destino de um dos meus personagens favoritos no cenário, deu uma dó!
Lua de trevas, do Leandro Radnak, ganhou muitos pontos comigo pela forma como ele encontrou de contar uma história que de outra forma poderia ser comum. A escolha do protagonista foi muito boa, e é ele que brilha na história, apesar de ela falar dos feitos de outras pessoas. Neste ponto o conto é um pouco parecido com revés, na forma como mostra como o fantástico transforma as vidas das pessoas comuns de Arton, seja para pior como no caso do conto do Douglas, seja para melhor, como em lua de trevas.
E então chegamos ao melhor conto do livro, Hedryl, de Raphael Draccon. Simplesmente fantástico em todos os aspectos, mal consigo encontrar palavras para descrever minha reação a cada parte que lia deste conto, acho que o melhor a dizer neste momento é que várias vezes, várias vezes mesmo, durante a leitura eu quis largar o livro, chamar os amigos para jogar RPG e matar monstros.
O estilo do Draccon pode ser descrito como cinematográfico, a cena inicial tem muito impacto, e o que se segue é uma história furiosa de vingança, guerra e, por que não, justiça. Maravilhoso também é o domínio da história do cenário pelo autor, que resgata um personagem dos primórdios da extinta revista Dragão Brasil como protagonista e o coloca no hall dos grandes personagens atuais do cenário por puro mérito do Raphael.
Para terminar com os contos inéditos do livro temos o rouxinol e os espinhos, do colega Remo, que não se saiu tão bem quanto com o teopatia. O rouxinol é confuso, apesar de bem escrito, e não consegue empolgar enquanto história de fantasia. Mas fique atento quando ler, que este conto é que nem um Kinder Ovo, vem com uma surpresa dentro.
Os últimos quatro contos do livro são reedições de clássicos do cenário: arautos da guerra, de Antônio Augusto Shaftiel, definiu a visão que muitos jogadores tem de como se comportam os clérigos da Keenn em Arton; vingador de aço é um dos contos mais antigos do cenário, publicado anos antes do primeiro livro básico de Tormenta; ressurreição foi a estréia de Leonel Caldela no cenário e marcou a guinada de Tormenta para o que ele se tornou hoje; e finalmente temos o cerco, de JM Trevisan, que ainda confunde muitos jogadores antigos por causa da chamada que identificava a “flecha de fogo” da profecia, versão negada pelo autor mais tarde.
Numa avaliação final, Crônicas da Tormenta é uma excelente antologia, com todas as qualidades e defeitos típicos deste tipo de publicação. Existem diferentes tipos de histórias, de diferentes qualidades, e cada uma diferentes estilos de escrita, o Crônicas é muito diverso e isso pode ser bom ou ruim dependendo do ponto de vista, mas com tantos estilos diferentes, é quase certo que pelo menos alguma coisa no livro vai agradar você.
Crônicas da Tormenta
288 páginas em P&B e capa mole por R$ 39,90 ou R$ 35,90 com frete grátis na Loja Jambô.
Antologia organizada por JM Trevisan e publicada pela Jambô Editora.

João Paulo Francisconi

Amante de literatura e boa comida, autor de Cosa Nostra, coautor do Bestiário de Arton e Só Aventuras Volume 3, autor desde 2008 aqui no RPGista. Algumas pessoas me conhecem como Nume.

Você pode gostar...

12 Resultados

  1. Rodrigo disse:

    É, nem tem muita coisa pra dizer, concordo com praticamente tudo, só que consegui ler o “crepúsculo encontra tormenta” XD
    E sobre o goblinóide que o paladino esqueceu de matar em Hedryl, o proprio autor me esclareceu no twitter o que realmente houve: Ele correu de medo. XD

  2. Tek disse:

    Estou ansioso pra ler esse livro mais do que os últimos lançamentos de material do cenário.

  3. Ótima resenha, Nume. Tua avaliação é bem similar à minha — exceto que comigo o Revés ganhou muito mais pontos que o Hedryl.
    O Canção para Duas Vozes me aborreceu um pouco pelo fato de a heroína ser tão anti-feminista. Ela é frágil, desamparada, e cai de paixonite por um homem na primeira oportunidade — um que praticamente grita “cafajeste”, para agravar.
    Quanto aos meus, Nume, o Rouxinol é infinitamente mais legal, na minha opinião, mas reconheço como o Teopatia possa ter se saído melhor na tua avaliação. O Rouxinol foi minha tentativa de escrever fantasia num estilão Wilde/Huysmans — descrições ultra-ornadas, umas afetações deliberadas aqui e ali. Some a isso o artifício usado para chegar ao “kinder ovo” (adorei), e temos algo potencialmente confuso. (A única coisa de que me arrependo nele foi o flerte com o moralismo tradicional no fim.)

    • Nume Finório disse:

      Peraí, Remo, quer dizer que o Canção para Duas Vozes fica MAIS parecido com Crepúsculo depois do começo? Cascalho!

      • Crepúsculo tem cenas de violência meio gore?

      • Nume, por causa do teu comentário eu assisti ao Crepúsculo ontem — o primeiro, que nem tem os gostosões sem camisa do segundo pra distrair.
        Tua comparação me pareceu meio imprecisa. A protagonista do Canção, apesar de não ser o tipo de heroína feminista/”girl power” (que eu particularmente gosto e prefiro às alternativas mais convencionalmente femininas), não é uma Bella, absolutamente. Até porque ela não se apaixona pelo cara para se tornar uma criatura sobrenatural, como a Bella (“maria poltergeist”), e possui ambições próprias que vão além do interesse pelo parceiro.
        E isso me levou a pensar mais sobre o assunto e também rotular a minha avaliação como imprecisa. Muito possivelmente ela foi colorida pelo meu paradigma pessoal de relacionamentos românticos. Sendo gay, eles são entre iguais (na arena dos papéis de gênero), e meus relacionamentos funcionais/frutíferos se deram quando havia equivalência (de cultura, intelecto e atratividade física) entre as duas partes.
        Como a dinâmica de relacionamentos heterossexuais me é estranha na melhor as hipóteses (quase alienígena às vezes), o que julguei como uma falha é apenas a minha interação com um tema cujas engrenagens não sou capaz de compreender intuitivamente. (Da mesma maneira que a “escrotice & bizarria” dos meus textos não cai bem para algumas pessoas.)

  4. Independente de ganhar ou não algo para isso, achei que foi um “pouco” rude na descrição do conto da Ana, fora isso, espero ler esse livro um dia.

  5. serial101 disse:

    Se o amigo Shido ler esse comentário desculpe pela gafe no RPGCon eu realmente não consegui te reconhecer quando pedi o altografo.
    Sobre o livro, terminei de lê-lo hoje e ainda com a impressão forte deles da cabeça tenho que dizer que são todos muito bons, alguns melhores que outros é verdade, mas todos com uma visão bastante particular do cenário.
    De fato eu apenas fiquei um pouco chateado que a diversidade do cenário não foi explorada, alem de elfos e humanos nenhuma outra raça protagonizou um dos contos. [dos contos novos, o Cerco do Trevisan usa um Halfing]
    Isso pra mim foi uma falha ao espirito da diversidade de Tormenta, mas passável no geral.
    O melhor conto na minha opnião é Revez, um conto fascinante que vou reler dentro em breve. O pior foi História de Herói. Não tanto pela sua história pouco intuitiva [normalmente eu consigo prever o fim de uma história no terceiro paragrafo], mas sim por que senti um gosto de “errada” “corrigindo” um treicho d’O Guerras Táuricas, e tirando o valor do trabalho do Gustavo.
    Uma pequena correção que eu faria ao livro é colocar o ultimo trecho, aquele referente ao que é Tormenta no começo do Livro e não no fim. Esse recurso serve muito mais para os novatos devendo ficar próximo a eles, os veteranos muito provavelmente não vão ler de qualquer maneira.
    Outro detalhe que eu percebi, mas não sei se foi algum problema meu esterespecífico foi que há uma falta de descrição um tanto quanto comum a todos os personagens. De fato ao terminar de ler o livro eu não reconheci os personagens na capa a exceção do capitão e sua tatuagem na cabeça todos os outros me pareceram iguais em suas armaduras. Apenas uma palheta de cor mais viva ou mesmo uma descrição mais “colorida” dos personagens poderia torna-los todos visivelmente mais diferentes. Eu gostaria de lembrar que suas característica psicológicas entretanto foram muito bem exploradas.
    Espero sinceramente que isso não vire padrão para futuras obras do gênero, personagens profundos e todos iguais, com a mesma cara barbeada e a mesma armadura. [Aliais é tão difícil alguem fazer um conto com um druida ou feiticeiro? Só tem guerreiro, paladino e ladino! Cadê a magia de Tormenta?]

  6. leolima disse:

    Tenho o livro a duas semanas e só consegui um tempinho pra ler História de Herói. Gostei apenas do desfecho e a épica trolagem do deus da justiça, vide Nume.

  7. Amanda disse:

    Um baita livro. Amei! Principalmente os últimos contos! 🙂

Deixe uma resposta