Série Castigo – 003 de 004
Infinito
“Você está cometendo um erro garoto” – queixou-se Castigo caindo do alto do prédio de onde observava o comboio militar até pouco antes de ser atingido com força e despencado lá de cima. Arremessado talvez fosse um termo melhor. O disparo de energia do seu oponente só não arrancou sua cabeça porque ele caiu antes disso.
Naquele fim de tarde Navalha seria escoltado por dúzias de policiais desde a sede do Ultimato em São Paulo para a Unidade Prisional de Ilha de Alcatrazes, no norte do Estado. A única prisão para super-vilões do país, foi mantida como segredo de estado por décadas, oculta por uma série de boatos sobre testes realizados pela Marinha. Entretanto, a notícia vazou recentemente e o lugar passou a ser alvo da imprensa sensacionalista.
E aquilo tudo era chamativo demais. A televisão, rádios e sites de notícias noticiavam a transferência do criminoso desde que ele havia sido capturado pelo vigilante Raio Verde e por ele semanas atrás. Havia um consenso de que o super-vilão tentaria escapar de alguma maneira, e o próprio Castigo acreditava nisso. Por isso era natural que seguisse a comitiva – próximo o suficiente para agir, e ao mesmo tempo distante para não dar as caras num noticiário qualquer. O Ultimato havia sido convocado para realizar a escolta, e isso o tranqüilizou ao ponto de quase ir embora. Foi então que o garoto surgiu e o atingiu como um trator.
O problema de não se ter uma televisão era o de que você não tinha exatamente certeza de como os novos heróis se pareciam. Castigo definitivamente não o conhecia, mas era certo de que um menino como aquele, vestido de azul, capa branca e com as cuecas por cima das calças não tardaria em se apresentar. Ele nitidamente gostava daquilo tudo. Gosta de ter poder. Achava divertido ser forte e poder ajudar os outros. Um adolescente capaz de tudo. E esse conjunto representava perigo.
– Uma pena para você – começou a falar, os cabelos castanhos dançando com a brisa – Infinito está aqui e… Ei! Você não pode fugir!
Não poderia, é verdade – pensou Castigo – Mas iria mesmo assim. Com tantos heróis na área o Navalha não teria como fugir. Bastaria um giro sobre o próprio corpo, calcular bem o salto e ricochetear de volta para os prédios, desaparecendo na primeira viela. Entretanto, seus pensamentos foram interrompidos pelo som de tiros provindos do carro forte onde o vilão era conduzido. Por um instante, Castigo ainda acreditou que enfim Navalha iria surgir em meio aos escombros e iniciar sua fuga. Só então se deu conta do que realmente estava acontecendo.
O alvo era ele o tempo todo.
O primeiro disparo atingiu-lhe no ombro esquerdo, em queda livre e girando. Castigo sabia quem era a autora do disparo apenas pela precisão. Capitã Liliane, atiradora de campo do Ultimato. Também não precisava pensar muito para saber o motivo de ainda estar vivo. Ela não podia matá-lo antes de prendê-lo novamente. E isso lhe dava alguma vantagem. E tempo para cuidar do menino de cueca. Este não estava disposto a ser tirado da brincadeira, e o seguia bem de perto voando. Ele podia voar e era forte. O que mais ele poderia fazer?
– Escuta garoto – justificou-se – Eu não sou um terrorista ou algo assim. Eu sou um dos mocinhos. Você está enganado…
– O engano é todo seu, cara. Você é um alvo procurado e condenado pelo Ultimato. Não pense que eu estou aqui de passeio. Eu sei quem você é, e sei que te querem preso – berrou Infinito atingindo-o com uma sequência de golpes que o jogaram definitivamente no meio da avenida, onde foi atropelado por um Fiesta e novamente arremessado por mais alguns metros antes de enfim parar inconciente.
Liliane desceu do caminhão e aproximou-se andando rápido, gritando ordens pelo celular. Era uma mulher linda, mas conhecia outras maneiras de parar o trânsito além das curvas de seu corpo ou do brilho dos longos cabelos negros. Disparou seguidamente para o alto com uma metralhadora, e em pouco tempo todos os veículos que por ali trafegavam estavam imóveis. E assim também permanecia Castigo. A equipe tática de apoio cercava o local por todos os lados, e por fim Infinito aterrissou próximo de onde o corpo enegrecido jazia.
– Melhor ficar deitado, cara – falou o herói quando notou que o oponente ainda se movia – Você não tem mais chance nenhuma.
– Quantos anos você tem? – perguntou Castigo levantando-se. O sangue escorria farto pela perfuração de balas no ombro. Havia fraturado algumas costelas no atropelamento, e provavelmente arrebentando um pulmão com a queda. Mesmo assim falava, ainda que chiando – Doze, Treze?
– Eu já completei quatorze! – ofendeu-se o garoto empertigando-se – Quatorze e meio!
– Quatorze é? Você bate bem pra um moleque franzino. Mas ainda não passa disso. Talvez um dia ainda venha a ser um dos grandes, mas agora, hoje, não passa de um pivete.
– Um pivete que te deixou todo moído – sorriu Inifito cruzando os braços. Castigo arrastou-se como podia até ficar frente a frente com o menino que o observava vitorioso – Ou vai me dizer que essa fala arrastada é sotaque.
– Um dia, quem sabe, você me perdoe por isso, Infinito – disse Castigo – Mas só há um jeito de aprendermos nessa vida. É errando. E eu não vou cometer o mesmo erro duas vezes!
Infinito sabia qual era o intento de Castigo mesmo antes do inimigo ficar de pé. Sabia que o falatório era apenas a forma que ele havia encontrado para aproximar-se. Diabos, ele sabia até mesmo que receberia um soco! Mas ele não estava preparado para aquele tipo de impacto. Ninguém ali estava.
Os dados do Ultimato e o vídeo da captura do Orco os levaram a crer que ele não possuia uma força elevada. Infinito fora elencado para aquela batalha justamente por poder evitar maiores danos graças a sua Aura de Proteção, e para persegui-lo pelo alto caso ocorresse uma fuga. Mas o soco que lhe atingiu na altura do queixo reverberou pelo solo, a onda de choque propagando-se por vários metros e derrubando inclusive a Capitã Liliane, os políciais e duas viaturas. Infinito foi arremessado para além dos prédios baixos do subúrbio, caíndo em um campo de futebol num outro bairro.
Neste meio tempo, Castigo sumiu.
Insisto que Infinito não possui superforça.
E nem precisa dela né? Ele atacou com uma das rajadas destrutivas dele, e é disso que o Castigo está falando quando pensou em “força”. Mas vou trocar “golpe” por “disparo” logo no princípio ;D