Armas de Fogo e RPG: O início das armas de fogo.
Quando pensamos em armas de fogo logo pensamos em seu principal propelente: a pólvora!
Inventada no séc. IX, na China, a pólvora negra é uma mistura de carvão vegetal, enxofre e salitre, finamente moídos. A proporção mais habitual desta pólvora era a chamada 1/1/6, sendo estabelecida como melhor proporção, a partir de 1780, a proporção 2/3/15. Todos os três materiais são relativamente fáceis de se encontrar, fazendo da mistura uma fonte de energia (explosiva) muito interessante.
Os chineses desenvolveram diversas armas com base na pólvora. Quase todas usam o princípio do foguete e algumas alcançaram certa notoriedade, como a aterrorizante “lança de fogo”.
As armas propulsionadas por pólvora e granadas chinesas merecem um capítulo à parte, tanto por seu exotismo quanto para uma análise de sua eficácia, pois foram completamente extintas, substituídas pelo armamento desenvolvido no ocidente. Falaremos aqui, no entanto, de uma que é de particular interesse neste artigo: o canhão primitivo (a própria lança de fogo)
Tratava-se de um tubo de bambú, recheado com pólvora e algum projétil (algo como um míssil, pedras ou shrapnel), surgido no séc. XII. Os bambús, apesar de resistentes, não eram suficientes para suportar muita pressão e em breve tanto os chineses quanto outros povos com os quais tinham contato (mongóis, japoneses, árabes) desenvolviam outras versões, mais resistentes, do canhão.
Os modelos que chegaram à Europa no séc. XIII, por mãos mouras, eram grandes canhões feitos com toras de madeira reforçadas por cintas metálicas, que disparavam balas de pedra ou barro cozido. Sendo de madeira, não era raro que um canhão rachasse, tornando-se completamente inútil. O que é considerado como o primeiro canhão metálico é o pot-de-fer, usado pelos franceses durante a guerra dos cem anos e descrito em um manuscrito do séc. XIV. As iluminuras e descrições não permitem atestar as verdadeiras dimensões deste aparato, mas o princípio mecânico é muito simples e similar a quase todos os canhões de carregar pela boca.
Trata-se de um tubo grosso e resistente, fechado em uma das pontas (o pot-de-fer assemelhava-se a uma garrafa) e que possui um orifício menor (ouvido) que se liga à parte interna da arma. Ele é montado sobre um cavalete com ou sem rodas, que permite à arma recuar durante o disparo, sendo então necessário reposicioná-la para novo disparo.
Usando um pano molhado e uma escova o artilheiro limpa a parte interna do tubo (chamada de alma) para prevenir-se de fagulhas e outros detritos que possam incendiar a pólvora. Despeja-se então uma carga de pólvora que permite o disparo do projétil e, suavemente, comprime-se a mesma com o auxílio de um soquete. A bala é inserida e arrastada até o fundo com o mesmo soquete. A seguir despeja-se um pouco de pólvora no ouvido da arma. Faz-se a mira e, aproximando-se uma tocha ao ouvido (do canhão, claro!), a pólvora despejada transmite o fogo para a pólvora interna e executa-se o disparo. Com o tempo foi desenvolvido um cordão trançado com pólvora (o pavio) que substituiu a pólvora do ouvido. A pólvora negra demora um pouco para explodir (enquanto passa pelo ouvido) e produz muita fumaça.
Ufa! Que trabalheira, heim? E para lançar o quê? uma bola de pedra, no máximo, do tamanho de uma bola de futebol?
Qual é o ganho de uma arma dessas, se nesta mesma época o Trabuco (Trebuchet) representava o ápice das armas de cerco, podendo disparar projéteis enormes?
O ganho está na consistência dos disparos! Desde a antigüidade as fortificações estavam baseadas em dois princípios: uma muralha bem alta (muitas com mais de dez metros de altura!) e, quando possível, um fosso, cheio de água ou não. Derrotar estas defesas não era fácil. Sapadores, aríetes, balestras, catapultas, escadas… sabemos muito bem como cada um deles funcionava, e como não funcionava. No caso das catapultas, elas raramente acertavam o mesmo lugar.
Mas um canhão, bem posicionado, podia castigar a base de uma muralha consistentemente, acertando sempre no mesmo ponto. Isto minava a base, causando a ruína da estrutura que, do mesmo modo que uma árvore cortada a machadadas, cairá na direção dos disparos, ou seja, para fora da construção, e conseqüentemente sobre o fosso! Ao mesmo tempo era criada uma abertura na muralha e uma ponte de entulho sobre o fosso.
Os séculos XIV a XVI tiveram uma verdadeira corrida armamentista em que armeiros e sineiros (!) se esforçaram para aprimorar os canhões, enquanto os projetistas de castelos tentavam aprimorar as defesas, vindo a criar as fortalezas renascentistas. Mas sobre isto falaremos noutro capítulo, quando também abordarei o Canhão de Mão.
Enquanto isso… e num mundo de fantasia?
Então esta é a hora em que os leitores fazem a malfadada pergunta “E eu com isso?! Como aplico este conhecimento em meu mundo de fantasia?”
Bem, primeiro eu aconselho a estabelecerem um nível de tecnologia em seu mundo. Comparações entre a vida em seu mundo e a vida em períodos históricos do mundo real podem ajudar bastante neste caso, mas atenção para a magia, que é um elemento alienígena à nossa história e que pode pesar na balança da tecnologia.
A seguir, peguem o conceito da pólvora e tentem dar soluções simples para seu uso. Soluções que sejam possíveis e simples, com a tecnologia de seu mundo. Soluções criativas podem até mesmo inovar a forma como a pólvora será utilizada e conduzi-los a um novo conceito de armas.
Mas atenção para os custos! Em um mundo repleto de magia, onde esta seja bem acessível e corriqueira, é provável que armas de fogo não apresentem tanta vantagem (em nosso mundo elas eram relativamente baratas e muito superiores às catapultas, onagros e trabucos. Em um mundo de alta magia, elas seriam mais práticas e superiores a um pequeno pelotão de magos de combate?). Se for este o caso, então elas podem até mesmo existir, mas não haveria demanda para justificar seu desenvolvimento. Canhões primitivos e granadas rudimentares seriam as únicas armas de fogo disponíveis.
Então, vale a dica: Se você deseja evoluir as armas-de-fogo em seu mundo de fantasia, tente balancear bem a tecnologia e a magia de seu mundo. Se a magia for muito cara, ou muito rara (que é até melhor, pelo suspense), então as armas-de-fogo encontrarão campo fértil para crescerem.
Esse é sempre o dilema quando se coloca armas de fogo no jogo. Controla-las quando um PC novato pode matar com um golpe de sorte um NPC poderoso isso tem de ser levado em conta. Quanto à magia, bem ela pode alcançar o mesmo efeito contudo ela exige um aprendizado ou um custo elevado em energia, mas uma coisa é certa uma boa pederneira em um campanha de piratas cada disparo é uma alegria !
Tirou o artigo do meu teclado.
Passei a tarde peesquisando armas de fogo dos séculos XVI e XVII para colocar no meu jogo de D&D 3X
Então fui mais rápido, sem saber?
Mas ainda vou chegar às minúcias do séc. XVII… quando falarei das armas de mão e começo a introduzir a pederneira, que o Vilela lembrou bem!
Aliás, é bom até lembrar o funcionamento da pederneira, para o pessoal que não conhece… Pederneira e isqueiro, ilustres desconhecidos do jogo de RPG medieval!
Os “canhões”, no meu cenário, estão mais próximos dos obuseiros militares do início/meio do século XX.
Sim, no meu cenário a tecnologia das armas de fogo é muito superior aos cenários de fantasia por aí. Existem até mesmo grandes metralhadoras estáticas, mas nenhuma arma automática de mão.
Claro que eu fico muito mais feliz de não tr tido de escrever tudo isso Leonel. Aliás, clarificou alguns pontos interessantes, Estou fazendo uma orientação mais “magic powered” das armas de fogo. Elas funcionam com pequenos reatores mágicos que drenam sua energia de cristais encrustados ao longo das armas. Cada reator “cria” a sua própria munição depois que a arma descarrega, bastando o usuário fazer o movimentoi de recarga (uma espécie de ritual mágico simplificado que qualquer um ode fazer). Assim existem dois tipos de armas:
os bacamartes de boca de funil – apenas 1 tiro por recarga
os de tambor – que podem ser disparadas até 5 vezes por recarga.
Apesar do efetio mágico destas armas, seu dano é abolutamente mundano.
Aiken, eu não entendi muito bem:
Ao dizer que os canhões do seu cenário estão mais próximos dos obuseiros (melhor dizendo, dos obuses, para evitar confusões), você quer dizer que eles só atiram para cima, em angulações superiores a 45º, destinando-se a ataques parabólicos?
Estou gostando dos artigos, mal posso esperar pelo outros.
Desculpe não ter explanado muito bem, Leonel, estava com pressa na hora.
Quando disse aquilo, eu quis dizer que a tecnologia bélica, em geral, é próxima da tecnologia da Terra do início do século XX. Não há canhões carregados pela boca, de alma lisa e munição de esferas de metal e pacotes de pólvora negra… As armas desse tipo são semelhantes aos obuses, baterias, e canhões de altas polegadas da Primeira Grande Guerra.
A diferença é que as armas são de energia, apenas certas nações e povos possuem as armas de pólvora.
Ah, agora está explicado.
Bem, a primeira Grande Guerra foi um salto evolutivo na história dos canhões (mas não o maior salto), mas vou guardar para explicar isso direitinho em artigos futuros.
Agora, Quanto à energia… do que você está falando, exatamente? O conceito é bem interessante. Se é uma nova fonte energética, gostaria de saber como ela influencia o seu cenário. Desculpe perguntar, mas “energia”, pura e simplesmente, foi um pouco vago para minha compreensão.
Valberto: Procure o livro “six guns and sorcery”. Certamente vai te dar idéias.
Leonel, tenho gostado muito dos seus artigos e vou acompanhá-los “religiosamente” aqui no site. Continue com o ótimo trabalho.
Voltando às armas, de fato minhas explicações sobre os pontos do meu cenário têm ficado meio vagos, mas é porque tenho entrado aqui rapidamente nesses últimos dias. Sim, a energia que me referí se trata de uma fonte energética específica do cenário. As armas que se utilizam dessa fonte são similares aos “lasers” do Star Wars.
As armas de fogo, com munição propelida por pólvora, no entanto, são exatamente iguais às da Terra do período ao qual me referí.
Se quiser continuar a discução, me mande um e-mail. Acho que seria mais fácil mantermos contato assim.