Steamnoir
Steamnoir
Então, estava cá eu aqui em casa pensando em fazer algo que prestasse. Quando vi que na parte de estudos não ia sair muita coisa, resolvi “apelar” e fui pro RPG mesmo. Lembrei-me então que tirando uma matéria pra ezine de Gandara, fazia tempo que eu não fazia algo inédito para o cenário. Pensei logo num conto, mas também pensei: “como fazê-lo ser diferente dos outros?”
Aí me ocorreu o conto noir do Burp “Meu Doce Bebê Dragão” e resolvi seguir esse estilo, mas incorporando alguma das características do cenário. “Nasce” (apesar de ser uma pusta pretensão minha dizer que criei o estilo) o Steamnoir, divirtam-se.
PS: Viu H? Eu disse que o conto ia pro Inomi um dia desses =)
***
Capítulo I
A noite cobria a cidade como um manto negro salpicado de branco. O calor dos prédios era carregado pela brisa e me abraçava como uma mãe a um filho. Nem mesmo à janela eu encontrava alívio ao mormaço noturno que arrebatava Bretor, e mesmo esquentando um pouco mais o ambiente, eu fumava um de meus insperáveis cigarros, traçando espirais de fumaça em meu pequeno apartamento.
Eu sou Niccolai Poskov, um bom nativo de Ronavon que cresceu demais para a sua pequena cidade. Quando atingi meus dezoito anos tive que me decidir, ou passava a trabalhar em algum dos diversos serviços da Cosa Nostra, me tornando mais um peão em seus joguetes de domínio nacional, ou me disparava para outro reino e tentava a sorte com algo mais digno.
Decidi pela capital do mundo, Bretor. Sendo um rapaz de bom porte físico e um dom para a fala, encontrei logo meu lugar na força policial bretoriana, atingindo logo o posto de detetive. Alguns anos correram e logo eu me cansei de agir apenas pelas camadas superiores da cidade e me aposentei daquele emprego, mas não consegui me aposentar daquela vida.
Hoje eu sou Nicc Pos, detetive particular, a cidade é meu parque, suas pessoas são minhas atrações, seus casos são os meus brinquedos favoritos.
Em minha cama dormia minha pequena… Diabos, eu estou a chamando assim agora. Não que Camile fosse uma presença desagradável, ao contrário. Ela tinha uma voz macia, sabia cozinhar, bebia como um anão, não fumava, e benditos sejam seus pais por a terem colocado em uma escola de qualidade, sabia conversar. O que eu menos precisava em minha vida é uma mulher que tenha como seus principais tópicos os novos cortes de cabelo e a última moda ronavar.
Meu “problema” com Cam é que não era para ter acabado desse jeito. Ela era apenas mais uma das garçonetes do Pirâmide Azul, um clube de boa fama em Bretor, e que tinha alguns eventos de tamanha gala que até mesmo o Rei Cassidy fazia suas aparições por lá. Pois bem, qualquer moça que trabalhasse por lá tinha mais chance de saber sobre o que acontecia nas ruas do que muitos policiais veteranos jamais saberiam em todas as suas vidas.
E não era como se ela fosse como uma das outras garotas que abria as pernas para qualquer gordo bêbado que abanasse um maço de notas na sua cara. Ela já havia levado uns beliscões, tapas e apalpadas, mas nada além disso, afinal os seguranças do Pirâmide existem também para proteger suas funcionárias, mas era parte do jogo de ser simpática.
E ela tinha simpatia, bom gosto, classe… E não, não faço nem idéia do que passou pela cabeça dela para estar com um cara como eu. Mas à noite, vendo seu corpo estirado pela cama, seu rosto emoldurado por seus longos cabelos negros. Castanhos. Loiros. Brancos. Verdes… É, por mais estranho que pareça, o cabelo dela mudava de cor, e não, não sei porque, e nem mesmo ligo. Droga, se toda essa maldição de mundo fosse em preto-e-branco, o cabelo dela ainda seria a coisa mais linda que eu teria visto na vida.
E eu ali, como um cachorro babando por uma garota que no começo eu só usava como informante. A coitada devia ter desconfiado, eu disse, ela era esperta, mas se fosse, porque não me deixou? O caso era que nosso relacionamento evoluiu de profissional para pessoal em, sei lá, alguns dias, talvez algumas horas. Quando ela sorriu de verdade pra mim pela primeira vez, eu acho.
Eu tirei meu olhos de seus cabelos lilases, se não teria ficado vendo eles mudarem de tom o resto da noite. Sentei na janela e acendi uma pequena luminária na parede externa que não iluminava nada, mas também não precisava. Apesar de morar em um apartamento pequeno, a vista compensava, dali podia ver a “metade dourada” de Bretor, um vale entre os principais prédios que me dava uma visão ampla dos bairros nobres das camadas superiores da cidade. Eu soprei a fumaça do cigarro em sua direção.
Nem cinco minutos depois de acender a lâmpada eu ouvi passos na escada de metal. Um corpo de rato subiu veloz os andares, um halfling. Parecidos com ele existiam muitos pelo mundo, pragas, mas nenhum era igual a ele: Toni “Meia Calça”, pois todas as que eu dava para ele lhe caiam perfeitamente, quando cortadas na metade. Toni era quase como o mascote do edifício, nós lhe dávamos restos de comida e roupas e ele nos deixava em paz, e até mesmo fazia alguns serviços sujos, desde que fosse recompensado.
Ele fizera um desses para mim. Chegando sem fôlego em minha janela, um embrulho pequeno em suas mãos pequenas. Eu o peguei e revelei um binóculos de metal, supostamente um dos melhores modelos do G7, lentes polidas à perfeição, “Olhos de Meio-Elfo” diziam as propagandas, tinha me custado um olho, mas tudo bem, eu tinha um sótão cheio deles.
Um caso estranho que terminou ainda mais estranho. Um estripador estava matando garotinhas na zona sul, policial nenhum se dignava a descer tanto por miseras crianças, mas eu não era tão insensível. O gnomo maluco “desmontava” suas vítimas e fazia experiências com as partes soltas, pouca coisa havia restado tirando uma enorme prateleira com jarros com olhos nadando em líquido conservante escuro. Eu não podia devolver apenas eles para as mães, seria cruel, a polícia não saberia o que fazer com ele, seria desperdício.
Então, como sempre havia um maluco em Bretor com alguma coisa útil para ser trocada, eu guardei os potes. Sim, definitivamente eu tenho problemas, mas ei, um de meus melhores amigo era um halfling e minha garota era uma camaleão de cabelo, acho que o estoque de olhos era o menor de meus problemas.
Entreguei um frasco, eram castanho-claros, e Toni desceu rápido, de volta para sua toca. Enquanto isso, eu botei meu brinquedo novo à prova, mirando o Hotel Weisht. Lá estava a meu novo caso, Helga Spatyak, a gerente de apostas do Gran Circus, uma das mulheres mais ricas, bem-vestidas, mau-caráter, e devassas da cidade.
Aquele foi um caso interessante.
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