Spelljammer 3D&T
RPGistas mais antigos talvez já tenham ouvido falar de Spelljammer, um dos cenários clássicos do velho AD&D, e provavelmente o mais exótico e único dentre eles. Podemos descrevê-lo como o que acontece quando você pega todos os clichês e paradigmas associados ao jogo e os joga para o espaço, espalhando-os em meio às estrelas. Ou, como um um pôster desmotivacional da internet descreveu melhor:
Spelljammer não é tanto um cenário, no entanto, quanto um gênero em si, a verdadeira fantasia espacial. Suas naves interplanetárias não funcionam com tecnologia, mas através de magia; e o seu espaço selvagem não é regido pelas leis da nossa física, mas sim as da fantasia, com direito raças impossíveis e monstros em escala cósmica. Você sequer precisa usar necessariamente os cenários sugeridos nos livros básicos – pegue o seu cenário de campanha favorito, pode ser mesmo Arton, jogue um leme de navegação no tesouro de um dragão, explique aos jogadores como funciona, e veja-os se lançarem em direção aos céus para explorar mundos desconhecidas.
Se ainda é difícil imaginar, existem pelo menos dois videogames recentes que podem dar alguma idéia de como funciona. O primeiro é Rogue Galaxy, um dos últimos RPGs lançados para o Playstation 2, e que possui como tema justamente viagens interplanetárias em um mundo de fantasia, com direito a piratas espaciais e todo o resto. E o segundo é a série Kingdom Hearts – a forma como Sora e seus companheiros viajam entre os mundos dos filmes Disney, navegando com uma nave por entre pequenos planetóides, lembra bastante o conceito de espaço selvagem e as esferas de cristal de Spelljammer.
Em todo caso, as linhas a seguir tentam explicar os conceitos básicos do cenário, bem como oferecer algumas guias de como usá-los no 3D&T Alpha. E no final, apresento um pequeno rascunho de como você pode transformar o mundo de Arton em uma esfera de cristal de Spelljammer, levando a sua campanha de Tormenta até a fronteira final.
As Embarcações Espaciais
O espaço selvagem de Spelljammer é explorado através do uso de embarcações mágicas especiais. Em um primeiro momento, elas são muito parecidas com navios comuns, tendo o mesmo formato e arquitetura básicas. Na verdade, muitas destas embarcações foram mesmo construídas para uso em mares e oceanos, e apenas posteriormente tiveram instalados o seu leme de navegação.
O leme de navegação é o item que torna as viagens espaciais possíveis. Trata-se de um assento especial, que pode ser tão simples como uma cadeira ou tão vistoso quanto um trono, que deve ser usado por um personagem com poderes mágicos (ou seja, que possua pelo menos uma Escola de magia), e através do qual a embarcação em que ele se encontra adquire a capacidade de entrar em velocidade de cruzeiro e viajar entre as estrelas. Muitas campanhas no espaço selvagem começam com a descoberta de uma embarcação naufragada com um leme de navegação por um grupo de aventureiros em um mundo de fantasia mais clássica, que deverão então entender como ele funciona para lançarem-se rumo à última fronteira (ou, alternativamente, ativando-o por acidente e lançando-se aos céus, e tendo então que arranjar uma forma de voltar ao seu planeta…).
Como regra geral, um leme de navegação requer o gasto de 5 PMs para ser ativado, que ficam “presos” nele, como em uma magia sustentável. Ao fazer isso, o mago expande a sua consciência para toda a embarcação, e passa a senti-la como se fosse parte do seu próprio corpo, se tornando capaz de converter suas energias em força motriz para movê-la e manobrá-la. Na prática, ele se torna capaz de comandá-la através da manobra Comando de Aliado, como um veículo comum. No entanto, ele não pode controlar o seu corpo nem lançar qualquer feitiço enquanto está com o leme ativado, pois o controle do navio requer concentração total de sua parte; pode apenas conversar e se comunicar com os seus companheiros a partir do seu local de comando.
Um leme de navegação é criado a partir da magia Criar Leme de Navegação, descrita adiante. Alternativamente, para adquirir um leme já construído, o seu custo é de 10 PEs é para cada ponto de Resistência do navio em que será usado – assim, um leme de navegação capaz de comandar um navio de R3 custaria 30 PEs. Lemes especiais e únicos também podem existir, conferindo certas habilidades ao navegador como o uso de ataques especiais, bônus nos testes de navegação, etc. Entre estes está a lendária Coroa das Estrelas, um item especial raríssimo muito desejado por pilotos, por permitir que ele se mova e realize outras ações mesmo enquanto comanda uma embarcação.
Os navios, como veículos comuns, são adquiridos e construídos pelos jogadores através da vantagem Aliado. Normalmente pertencerão à escala Sugoi, já que são veículos de grande porte; mas podem existir também desde Ningen (pequenos botes salva-vidas) até Kami e superiores (grandes naves do tamanho de cidades, ou que podem mesmo ter cidades dentro delas!). O design das naves sempre foi considerado um dos pontos altos de Spelljammer – desde as naves-plantas comandada pelos elfos até os moluscos espaciais dos illithids (ou devoradores de mentes), passando pelas montanhas voadoras dos anões, naves diversas inspirados em peixes e insetos, e todo tipo de conceito bizarro aí pelo meio. Faça uma pequena visita ao Google Images se precisar de inspiração.
O mundo de Spelljammer também assume que a gravidade funciona de forma um pouco diferente do que no nosso universo. Qualquer corpo, por menor que seja, gera gravidade suficiente para manter uma pequena atmosfera em torno de si por alguns segundos – mesmo uma pessoa de tamanho mediano lançada no espaço ainda terá ar para respirar por cerca de 2d turnos. Quanto maior o corpo, é claro, maior a gravidade gerada, de forma que é possível mantê-la por um período maior. Assim, um navio, como regra geral, possui uma atmosfera com ar suficiente para sustentar a sua tripulação por três meses no espaço, sem aportar em um planeta maior, para cada ponto de Resistência que possua. Certos navios com características especiais, no entanto, como as naves orgânicas dos elfos, podem ter um período de autonomia até duas vezes maior.
Se esta física de fantasia o incomodar, é claro, você pode assumir que este é apenas outro efeito mágico do leme de navegação. Desde que ele esteja ativo, essa atmosfera ao redor do navio se manterá, permitindo à tripulação sobreviver. Desta forma, cada embarcação teria que possuir pelo menos dois navegadores treinados, que se alternariam no comando enquanto o outro está descansando e recuperando as energias.
Por fim, para todos os efeitos, você pode considerar que o ambiente do espaço selvagem não é muito diferente do ambiente de mares e oceanos. Como nas grandes navegações do passado, temos aqui aventureiros corajosos que se lançam em jornadas rumo ao desconhecido, expandindo as fronteiras da civilização para além do horizonte dos seus planetas. Você encontrará lá desde piratas e corsários até exploradores e mercadores, além de monstros fantásticos e planetas exóticos habitados por povos desconhecidos. As próprias batalhas entre as embarcações costumam acontecer de forma parecida às de navios em alto mar, com salvas de tiros de canhão, tentativas de abalroar a nave adversária, e abordagens para render a tripulação inimiga.
Portanto, você pode considerar que qualquer kit do Manual do Aventureiro que envolva mares e oceanos de alguma forma existirá também em versão espacial, fazendo, é claro, os ajustes necessários – um Pirata Espacial, por exemplo, deverá ter Arena (espaço) ao invés de Arena (água). Se tiver acesso às regras para combate de embarcações da Revsita Tormenta #6, pode ser interessante testá-las em jogo também.
Nova Magia: Criar Leme de Navegação
Escola: Branca, Negra ou Elemental
Custo: 10 PMs por ponto de Resistência do navio
Alcance: curto; Duração: sustentável
Esta magia raríssima permite ao mago encantar um assento comum e assim criar um leme de navegação temporário. Costuma ser usada em emergências, quando o leme de navegação de uma embarcação é inutilizado; ou, em conjunto com Permanência, para criar novos lemes permanentes. A quantidade de PMs gastos definirá o tamanho máximo da embarcação que ele é capaz de comandar, o que, grosso modo, é definido pela sua Resistência – assim, para criar um leme capaz de navegar um navio de R3, por exemplo, seria necessário gastar 30 PMs.
É importante lembrar também que este valor não inclui o custo para ativar o leme. Ou seja, caso seja o mesmo mago que o esteja criando que deverá comandá-lo, ele deverá gastar ainda outros 5 PMs para fazê-lo.
As Esferas de Cristal
O universo em Spelljammer é formado pelas chamadas esferas de cristal. Esta é uma concepção inspirada em antigos mapas cosmológicos medievais, segundo os quais a Terra seria o centro do universo e os outros astros girariam em torno dela presos por redomas cristalinas. Spelljammer considera que tais redomas de fato existem, mas de forma um pouco diferente – cada esfera corresponde a um universo próprio, com seus próprios planetas, estrelas e astros em geral.
Nos livros oficiais do cenário são descritas três esferas de cristal, que correspondem aos três cenários de AD&D existentes na época: Realmspace, onde se localiza Toril, o mundo de Forgotten Realms; Dragonspace, onde se encontra Krynn, cenário de Dragonlance; e Greyspace, onde encontramos Oearth, planeta principal de Greyhawk. Pode-se imaginar, no entanto, que dezenas de outras existam, correspondentes a quaisquer outros cenários de campanha possíveis – de Titan (o mundo de Aventuras Fantásticas) a Arton, passando por Artas (Dark Sun), Mystara, Tagmar, e talvez até mesmo a Terra de Santa Cruz (de O Desafio dos Bandeirantes) ou a Terra-Média, além, é claro, daquele cenário de fantasia genérico que você criou para os jogos do seu grupo.
O raio de uma esfera de cristal costuma ter o dobro do raio orbital do seu corpo celestial mais externo – ou seja, este último corpo fica exatamente à mesma distância do centro da esfera do que do seu limite. A fronteira da esfera é marcada por uma grande redoma cristalina, intransponível por meios normais; você pode considerá-la como uma muralha de R10 e A10 em escala Kami, o que quer dizer que mesmo uma grande embarcação com armamento pesado terá sérias dificuldades em perfurar um buraco grande o bastante para transpô-la. Formas conhecidas de ultrapassá-la, no entanto, incluem feitiços como Teleportação ou Porta Dimensional quando lançados próximos a ela; portais naturais que se abrem temporariamente em pontos aleatórios da sua superfície; e certas criaturas e embarcações especiais com o poder natural de criar portais, como alguns dragões espaciais ou a lendária Spelljammer, um gigantesco navio espacial com o formato de uma arraia.
Viajar dentro de uma esfera de cristal é simples, e requer apenas uma embarcação bem equipada com o seu leme de navegação, com o qual você pode explorar seus planetas e astros diversos. Esse é o “espaço selvagem”, como é chamado, e é onde ocorre a maioria das aventuras, enquanto os personagens viajam em suas embarcações de planeta em planeta, encontrando piratas, monstros espaciais e o que mais houver entre eles.
Entre as esferas, no entanto, o espaço é preenchido pelo phlogiston, um grande oceano multi-colorido formado por uma espécie de éter altamente inflamável. Ele forma grandes rios e correntezas de densidade variável, por onde as embarcações podem navegar no seu caminho de um universo a outro. De maneira geral, quanto mais densa é a correnteza, mais rápido a embarcação se moverá. Ele também emite uma certa luminosidade natural, o que é um alívio para os tripulantes que se arriscam a navegá-lo – afinal, dada a sua natureza, mesmo a pequena chama de um fósforo aceso é o suficiente para causar uma explosão, de forma que velas e lamparinas devem ser apagadas antes de adentrá-lo para evitar acidentes indesejados. Você pode usar as regras do feitiço Explosão nestes casos, considerando a quantidade de PMs gastos relativa ao tamanho da chama, de 2 PMs (uma pequena vela) até 10 PMs (uma grande fogueira).
As esferas surgem no phlogiston como grande bolhas no oceano, e também se movem por ele levados pela correnteza. Isso significa que as posições relativas entre elas podem mudar com o tempo, e o fato de que você passou por uma na viagem de ida não significa que a encontrará no mesmo lugar na volta. Felizmente, quando duas esferas começam a se aproximar demais, a densidade do phlogiston entre elas também aumenta, funcionando como uma espécie de almofada e evitando uma colisão.
Não é possível usar qualquer tipo de magia de teleportação planar ou inter-dimensional quando dentro do phlogiston ou para dentro dele; a única forma de entrar ou sair é atravessando a superfície de uma esfera de cristal. Mesmo itens mágicos que utilizem magias de natureza semelhante em escala reduzida, como uma sacola que utiliza um bolsão dimensional para aumentar o seu espaço disponível, não funcionam corretamente quando dentro dele, tornando impossível ter acesso ao seu conteúdo durante a viagem.
Por fim, é importante lembrar que o poder de deuses e entidades semelhantes de maneira geral acaba no limite da sua esfera de cristal. Além dela, clérigos, paladinos e demais personagens cujo poder vêm do seu contato com eles sofrem sérias restrições: não podem usar seus poderes concedidos, e tem seu limite de PMs gastos por magia reduzido a Hx2, ao invés de Hx5. Um clérigo com H3, por exemplo, ao viajar para além do alcance do seu deus, só poderia usar feitiços que gastassem até 6 PMs, e não até 15 PMs como ocorre normalmente.
Montando a sua Esfera de Cristal
Cada esfera de cristal deve ser montada como um universo compacto, com seu próprio sol, estrelas, planetas, etc. Lembre-se, no entanto, de que nós não estamos no nosso próprio universo, mas no de um cenário de fantasia, que possui suas próprias leis internas – logo, não é necessário se preocupar com as leis da astronomia verdadeira, organizando o seu mundo da forma que lhe parecer mais interessante.
Por exemplo, por que todo cenário precisa seguir o modelo heliocêntrico, com o sol no centro e os planetas girando no entorno? Você poderia, ao contrário, se basear em mapas cosmológicos medievais, com a Terra no centro do universo e todos os astros, incluindo o sol e as estrelas, na sua volta – nos livros oficiais de Spelljammer, inclusive, é assim que é descrito a esfera de cristal de Greyhawk. Criaturas cósmicas diversas também poderiam ter seus sistemas planetários, como dragões do tamanho de estrelas, ou pequenas galáxias e nebulosas tecidas por aranhas espaciais, ou diversas outras possibilidades.
Os próprios astros, sobretudo os planetas, também podem ter composições diferentes. Os livros originais de Spelljammer sugerem que eles sejam classificados de acordo com os elementos: astros feitos de terra seriam os planetas rochosos, como Mercúrio, Vênus ou Marte; os astros de ar seriam os gigantes gasosos, como Júpiter, Netuno ou Saturno; os astros de fogo seriam as estrelas, incandescentes e luminosas; e os de água seriam feitos primariamente de líquidos diversos – a própria Terra poderia ser um exemplo, visto que 3/4 da sua superfície é formada de oceanos e lagos, embora ela também possa ser classificada como um astro da terra (já que o seu núcleo, tecnicamente, é rochoso). Um quinto tipo sugerido seriam ainda os astros de plantas, que seriam algo como grandes planetas cobertos por vegetação, com uma fauna e flora extremamente diversificada que vive em simbiose quase perfeita, como um grande organismo vivo. Cada tipo influencia a composição do ambiente e da atmosfera do planeta, além dos seus habitantes, que possuem características diferentes em cada caso.
Você também pode, é claro, se apropriar de elementos mais exóticos, de acordo com o tema do seu cenário. Em um cenário oriental, por exemplo, os astros poderiam ser classificados como feitos de terra, água, fogo, metal ou madeira, os elementos da cosmologia chinesa. E a própria Magia Elemental do 3D&T apresenta um quinto elemento, o espírito, que poderia dar origem aos seus próprios astros particulares.
Em todo caso, lembre-se de que o grande atrativo de uma campanha em Spelljammer é explorar os diferentes planetas em cada região. Crie ambientes exóticos, e preencha-os com raças de fantasia clássicas ou invenções totalmente novas – um planeta coberto por uma grande selva, por exemplo, poderia ser habitado por grandes nações élficas, homens-tigre selvagens de organização tribal, árvores inteligentes anciãs, ou tudo isso junto. E, é claro, o próprio espaço entre os planetas também não é exatamente pacífico; piratas drow, escravocratas illithids, conquistadores neogi… Há muitos perigos a serem enfrentados no espaço selvagem!
A Esfera de Cristal Artoniana
Para dar um exemplo prático, vamos montar uma esfera de cristal para Arton, o cenário mais conhecido de 3D&T.
Inicialmente, temos que escolher uma estrutura básica para o nosso sistema planetário. Faremos um sistema heliocêntrico, centrado no sol e com os planetas girando em torno dele? Seria uma opção simples, e que nos permite seguir mais ou menos o mesmo desenho do nosso sistema solar. Por razões que devem ficar claras mais adiante, no entanto, acredito que uma opção mais interessante seja um sistema geocêntrico, em que Arton ocupa o centro do universo conhecido – entre outras coisas, era o sistema mais aceito no período medieval, que, grosso modo, ainda corresponde à caracterização oficial do cenário.
Resolvido isso, temos que decidir como serão dispostos os outros astros do mundo. O que será o nosso sol? Muitos povos artonianos, como os Sar-Allan do Deserto da Perdição, acreditam que o astro é o próprio Azgher, o deus-sol artoniano. Podemos aproveitar essa crença, dando a ela algum fundo de verdade – o deus poderia ser, por exemplo, alguma criatura cósmica real, que circunda os céus artonianos.
Me parece mais interessante, no entanto, aproveitar outra característica da cosmologia artoniana: os reinos dos deuses. Sim, se Arton possui, além do seu cenário principal, vinte outros cenários mais ou menos bem definidos, ligados a cada um dos deuses, por que não aproveitá-los? Daria todo um novo significado à idéia de “deuses alienígenas”, não? Assim, o nosso sol poderia ser simplesmente o astro correspondente a Solaris, o reino de Azgher: um planetóide tão brilhante que a sua luz ofusca todos os outros planetas divinos durante o dia, quando ele sobrevoa os céus do continente.
O segundo astro que temos que definir é a lua. Em Arton, ela é associada à Lena, deusa da vida – é um presente da divindade para os seres vivos artonianos, permitindo a eles um mínimo de iluminação durante as noites de Tenebra. Podemos aproveitar novamente esta crença, assim, e associá-la diretamente com Vitália, o seu reino divino.
Alguns podem perguntar por que não associar a lua, que é um astro noturno, à Tenebra, a deusa das trevas e da noite em Arton. Em parte isso ocorre para nos mantermos fiéis ao material oficial, que a associa a Lena; no entanto, também seria um pouco estranho transformar o reino de Tenebra em uma fonte de luz. Pode ser mais interessante, ao contrário, imaginá-lo como um planetóide escuro, que não pode ser visto a olho nu no céu noturno: a única forma de percebê-lo é quando, aproximadamente de mês em mês, a complexa movimentação dos seus epiciclos o coloca entre Arton e a lua, bloqueando a luz da segunda. Assim, explicamos também as fases lunares.
Podemos explicar os eclipses de forma semelhante. Os solares não requerem grande imaginação, e ocorrem quando os epiciclos de Sombria o colocam temporariamente à frente do sol durante o dia. Já os lunares podem vir da presença de um quarto astro – no caso, o equivalente a Chacina, o reino de Ragnar, que se põe entre a lua e Arton durante uma noite em longos ciclos de várias décadas, deixando-a com uma coloração vermelha como o sangue. Na última vez em que aconteceu, o general bugbear Thwor Ironfist nasceu, o que pode ou não ter um significado maior.
Restam então os outros dezesseis deuses do Panteão. Diferente do que ocorre com outros cenários fantásticos, é em geral aceito que Arton possui apenas um sol e uma lua, de forma que não há muitos outros astros a aproveitar. Temos, portanto, duas opções para os demais reinos divinos: ou assumimos que são todos astros diurnos, e assim ofuscados dos olhos destreinados pela luz brilhante de Azgher; ou consideramos que eles correspondem às estrelas, brilhando à noite no firmamento artoniano sem, porém, concorrer com a luz de Lena – um pouco como os próprios outros planetas do sistema solar, que, a olho nu, para alguém destreinado, são indistinguíveis das demais estrelas.
Mesmo que escolhamos a segunda opção, é claro, não precisamos limitar os céus artonianos a apenas dezesseis estrelas. A cosmologia padrão do cenário possui alguns outros planos de existência que podemos aproveitar: os quatro planos elementais (da terra, da água, do fogo, e do ar), mais os dois planos energéticos (da luz e das trevas), e os três planos intermediários (Astral, Etéreo e Sombra). Todos eles podem possuir seus próprios planetóides perdidos em algum ponto do firmamento. Outras estrelas poderiam representar planos mais exóticos, desconhecidos da população artoniana – um deles poderia até mesmo corresponder à anti-criação lefeu, o ponto de origem da invasão da Tormenta (ou, alternativamente, a anti-criação lefeu poderia ser uma outra esfera de cristal, totalmente alienígena para os artonianos); os planetas de Tillian e Kallyadranoch talvez também não tenham deixado de existir mesmo enquanto eles estavam esquecidos, sendo convertidos em terras devastadas, como em um cenário pós-apocalíptico; e outro (ou mesmo um destes) talvez seja o planeta de origem de Baggin, personagem alienígena que eu criei para a Cavalaria da Justiça.
Em todo caso, a magia Teleportação Planar, com esta interpretação, passaria a funcionar de forma um pouco diferente: ao invés de transportar o personagem para uma outra realidade, seria apenas uma versão de Teleportação mais potente, capaz de cruzar a distância entre planetas distantes. Na prática, claro, o seu efeito continua o mesmo – transporta os alvos para um outro mundo, que apenas passa a se localizar em outro planeta ao invés de outro plano de existência. Mas agora há também uma segunda opção para aqueles que queiram realizar viagens deste tipo: as fabulosas embarcações espaciais.
Por fim, precisamos também definir qual é a relação entre o cenário de Arton com o espaço selvagem da sua esfera de cristal. De maneira geral, o povo comum do planetóide artoniano deve ignorar todo esse universo maior que existe além dele – alguém falando de navios que viajam entre as estrelas e visitas a planetas alienígenas provavelmente seria taxado de louco, ou, nos casos mais extremos, acusado de heresia. Pense na nossa própria idade média e os problemas que aqueles que fizeram suposições parecidas tiveram, como Galileu ou Giordano Bruno. Apenas em certos ambientes específicos, como a Academia Arcana de Valkaria, é possível que ele fosse levado a sério, e provavelmente apenas lá mesmo seria possível encontrar alguém que estude estas possibilidades. O próprio Talude provavelmente conheça as embarcações espaciais e os lemes de navegação, embora não dê muita atenção a eles por achar que uma simples Teleportação Planar ainda é mais prática para chegar aos outros planetas; e Vectorius também deve saber algo a respeito, e talvez até mesmo esteja pensando em construir um leme poderoso o suficiente para levar a sua cidade voadora ao espaço algum dia.
Fora de Arton, é claro, a situação pode ser bem diferente. Povos de outros planetas podem muito bem ter tido a sua revolução espacial eras atrás, e dominarem regiões inteiras em grandes impérios políticos ou comerciais. Ocupados com suas próprias intrigas e conflitos, é natural que não dêem muita atenção àquele pequeno planetóide habitado por um povo atrasado e rústico no centro da sua esfera de cristal – se importam com ele apenas quando a sua embarcação realiza um pouso de emergência, ou quando aquele grupo de piratas espaciais procurado em dezenas de planetas resolve montar ali a sua base secreta.
Isso também pode ou não se expandir aos deuses do Panteão. Com o seu poder limitado à esfera de cristal artoniana, é natural imaginar que não se interessem muito em viagens para além dela; no seu próprio espaço interno, no entanto, os conflitos entre eles são bastante acirrados. Frotas de embarcações de guerra estão sempre rondando os seus planetas particulares, protegendo as suas fronteiras de ataques de deuses rivais, e grandes batalhas acontecem freqüentemente no vácuo sideral. Alguns deuses também podem ter interesses diversos em enviar embarcações para os confins da esfera, indo audaciosamente aonde nenhum artoniano jamais esteve – em especial Valkaria e Tanna-Toh, sempre dispostas a explorar e aprender mais sobre regiões desconhecidas.
Todas as imagens usadas no artigo, exceto o pôster desmotivacional, são ilustrações oficias dos livros e acessórios de Spelljammer. Mais informações sobre a história do cenário também podem ser vistas no site oficial mantido por fãs, Spelljammer: Beyond the Moons (em inglês).
CARACA!!! Nunca tinha ouvido falar disso oO
Parece legal lol
Eu já! Boa adaptação.
Mas acho que eu particularmente não casaria Spelljamer com Arton, criaria um Sistema Solar próprio pras minhas campanhas. =)
Cara, agora me lembrando, eu tinha uma DB que tinha uma materia pra D20. E tambem acho melhor criar o próprio sistema solar com raças diferentes (õ_õ)
Muito bom! Eu adoro o conceito de Spelljammer. Tanto que quero utilizar isso para uma futura campanha, só não sei em que sistema ainda!
BURP, essa eu não tinha visto. Emocionado, aqui. 🙂
Amo essa adaptação
“Não sabendo que era impossível foi lá e fez”