A Minha Crise

Ou: Uma visão pessoal sobre o que está acontecendo no mercado de RPG brasileiro.
Falar da crise (ou não) do mercado de RPG parece ser o hype do momento. Como sou um marketeiro movido por modinhas – é, um Mr. Pop radioativo me mordeu e agora fiquei assim – vou colocar aqui a minha opinião sobre o assunto. Se estiverem de saco cheio deste assunto, é melhor nem continuar a leitura.

Antes de mais nada, acho importante buscar definir o que é crise ao meu ver: Crise não é um processo demorado, nem a culminação natural de eventos a longo ou médio prazo. É uma mudança súbita, abrupta, normalmente resultado de algo pontual e fora do comum.
Imagine um muro que vai ruindo aos poucos. Agora imagine este mesmo muro caindo por ter sido atingido por uma bola de demolição. Pois é. Ao meu ver, o segundo é uma boa imagem mental para uma crise.
Vou roubar a definição da Wikipedia para fazer um arremedo de pesquisa e vocês, por favor, finjam que isso foi resultado de uma pesquisa séria:

“Uma crise (do Grego: ??????) pode ocorrer em nível pessoal ou societário. Ela pode ser uma mudança traumática ou estressante na vida de uma pessoa, ou uma situação instável e perigosa dentro da política, sociedade, economia, assuntos militares ou eventos ambientais de larga escala; especialmente aqueles envolvendo uma mudança abrupta e incapaz de ser parada. De forma mais aberta, pode ser um termo que signifique ‘tempos de provação’ ou ‘evento de emergência’.”

Como eu disse: é algo sutil e calmo como uma marretada.
Enfim. Há poucos dias estava trocando e-mails com alguns amigos na lista de discussão dos Blogs de RPG, quando comecei a discordar do Mr. Pop à respeito da existência de uma crise no Brasil. Ele defende que estamos passando por tempos difíceis e que isso é uma crise. Eu defendo que sempre estivemos passando por tempos difíceis, então não é uma crise.
Note que não há discussões sobre a dificuldade dos tempos atuais.
O meu ponto (e que o Pop defenda o dele) é que o mercado de RPG no Brasil sempre foi ingrato, e portanto não adianta culpar uma crise fantasma, mas sim a falta de sagacidade e capacidade de adaptação de quem faz RPG aqui no Brasil.
O que diferencia mais é que hoje em dia, graças ao advento da rede de computadores e todo aquele blá blá blá de inclusão digital, temos um acesso bem maior à informação. E no lugar de culparmos a falta de informação sobre o que acontece lá fora, a demora para os produtos chegarem nas lojas de RPG próximas de nossas casas e outros desses problemas de logística/comunicação, percebemos que o mercado não é tão grande quanto imaginávamos que era.
Os nossos horizontes estão mais amplos, mas não estamos vendo muito mais do que víamos antes. Some isso ao saudosismo e podemos entender perfeitamente esta crença de que tudo piorou nos últimos anos e que tudo era bem melhor há cinco ou dez anos.
E em parte era mesmo. Mas, em outras partes melhorou. É meio paradoxal, mas vou buscar explicar melhor e de quebra mostrar porque não tem crise nenhuma:
Antes de tudo, há uma “crise” nas publicações em papel. O modelo de publicação em papel que existe há décadas está morrendo e as editoras não apenas não se prepararam para isso, como muitas sequer sabem o que fazer agora. Elas se apoiaram demais na fórmula tradicional.
Se o NY Times está sofrendo por não ter a velocidade e a praticidade da internet, será que cabe dizer que as revistas vendem menos devido a uma crise no RPG ou por mera incapacidade do meio papel alcançar o meio digital nesta corrida? Isso, por exemplo, eu não vejo como crise do RPG, mas sim um revés bem maior que se refletiu no RPG como naturalmente se reflete em tudo que depende do papel.
Sinceramente, eu não vejo a situação atual tão pior do que antes. A gente vê menos livros sendo lançados, mas também vê menos linhas sendo canceladas.
Só acho que estamos passando de metralhadora para fuzil de precisão. Se antes apareciam e morriam muitas linhas de produtos, agora é mais difícil surgir novidades (o que é ruim), mas uma quantidade boa delas continua viva (o que é bom). Portanto, eu não acho que a situação atual anda tão mais grave do que era antes. E por isso não acredito que haja uma crise. Porque, na minha concepção, é necessário que o revés seja bem grande para ser uma crise.
De fato, nem sei dizer se estamos passando por um revés de verdade. Menos quantidade para maior qualidade me parece ser uma troca muito boa.
O mercado de RPG foi esfriando-se aos poucos. Ele não caiu, apenas desceu uma ladeira. Tanto que a gente nem sabe apontar um dedo direito ao que ocasionou isso.
Algumas editoras (e editores) tropeçaram em sua própria incopetência (e isso não é crise), a saída de alguns nomes mais poderosos como a Abril e a Ediouro (pelo RPG não ter dado o retorno esperado) desaqueceu a publicidade em torno do RPG, a falta de suporte aos jogadores antigos fez muitos deles migrarem para o mercado americano, e a incapacidade de oferecer uma forma de diversão competitiva com os video-games e demais passatempos atuais também dificulta a inserção de novos jogadores (que existe, só que poderia ser maior).
E, para piorar, não vejo essa situação mudando muito a médio ou curto prazo (heck, não vejo nem a longo). Então, para mim, isso não é um revés temporário, não é uma crise, mas sim uma trajetória que o mercado vem seguindo há muito tempo e que demorará tempo demais para ser mudada.
Inclusive, me atrevo a dizer que isso também não é uma crise porque acredito que poderíamos injetar o dinheiro que fosse nas editoras, e isso ainda não melhoraria muito o mercado. Não sem uma mudança de atitude por parte delas.
A situação atual não é algo que se abateu sobre o mercado, mas sim o resultado direto das ações das editoras nacionais ao tentarem espelharem-se demais no mercado gringo, sem saber adaptarem-se ao Brasil. É uma questão de mudar a forma de pensar e agir, mais do que mudar um elemento externo que impede o mercado de crescer.
É com base nessas coisas que digo que não há crise. Mas, de novo, estou julgando com parâmetros pessoais nesta história. Se você tem uma definição diferente do que é crise, pode ser que a situação que descrevi para você seja uma situação de crise.
Mas é só a minha opinião. Não sou especialista. E aí entra a pergunta: e para você, O RPG está em crise?

CF

Advogado de regras de dia. Combate o crime vestido de alce à noite.

Você pode gostar...

4 Resultados

  1. Armageddon disse:

    Como eu falei na lista, o que está em crise é a venda de impressos. Apesar de ser ainda um mercado absurdamente grande, ele vai aos poucos entrar em recesso, assim como os CDs já foram meio caminho pro buraco. Desenvolvedores de jogos de RPG tem que aprender que não são vendedores de livros e sim vendedores de jogos.

  2. O RPG não. Aliás acho que nunca esteve tão bem!
    Agora o mercado, bem mesmo sendo convencido por você (sim, eu posso ser convencido, basta ter argumentos fortes!) que a palavra “Crise” é imprópria, eu ainda acho que há alguma coisa de podre no reino da Dinamarca e não estamos falando de Dramaturgos Ingleses!
    Abraços

  3. Daniel R disse:

    Eu não falo nada sobre essa história pra não entrar na onda da brigalhada desnecessária sobre o assunto, mas a minha opinião é exatamente igual à sua. Eu até disse quando nos entrevistaram que eu acho que a situação do RPG nunca foi lá muito boa.
    E é uma verdade que se antes tínhamos um monte de lançamentos merda, hoje temos mais linhas consolidadas e enxutas.

  4. Olha CF, eu acho que o mercado nacional não “entrou” em crise pelo simples fato de que a diminuição do movimento é uma coisa está acontecendo faz tempo, desde que todas as linhas “altenativas” (leia-se, não D&D e não WoD) deixaram de existir. Até mesmo a Daemon amoleceu e está sem lançar nada de novo faz tempo.
    O mercado nacional não entrou em crise, ele vem “secando” faz tempo e eu acredito que estamos caminhando pra o retorno da “geração xerox” que hoje é a geração PDF. Quem realmente compra RPG não consome produtos nacionais, preferindo comprar os importados (que são mais baratos e mais bem acabados) e o pessoal que não faz isso inventa os seus próprios sistemas ou usa o 3D&T, é só dar uma passada em portais como o RPGOnline pra ver o pessoal jogando RPG de tudo quanto é coisa, desde Rock Band até Segunda Guerra Mundial.
    Essa galera que está nos portais não está lá muito interessada em cenários e livros de RPG, eles querem simplesmente um jogo fácil de se jogar pela internet e com o mínimo de trabalho e custo possível, então eles simplesmente não vão consumir manuais de D&D e coisas parecidas, ao menos não agora. Talvez daqui a algum tempo eles se interessem por variar e resolvam pegar um “RPG de mesa” pra testar, mas com a “força” que as editoras nacionais estão dando a formação de novos jogadores eu acho isso bem improvável.
    E outra coisa, nos EUA não há crise e nós temos sim muita coisa nova sendo lançada, vide as linhas limitadas da White-Wolf. O mercado anda de vento em popa por lá e, sinceramente, o mercado brasileiro, ao menos pra mim, não faz a menor diferença.

Deixe uma resposta