Como eu quebrei um mestre… ou: Como não mestrar
Este é um post bem legal que eu li no The Geek Emporium. Seu autor, Tom Knighton, nos conta a história de uma sessão de RPG que não deu certo por um esforço conjunto de jogadores sendo babacas e um mestre não sabendo lidar com isso. Eu achei ele interessante por falar de contrato social, algo que hoje em dia eu acredito ser importantíssimo, e por apresentar erros dos dois lados do escudo, e não ser mais uma daquelas histórias onde a culpa por tudo dar errado recai sobre uma só pessoa. Ele é meio jogadores vs mestre, o que eu não gosto, mas ainda assim vale como uma boa leitura.
Publicado originalmente no blog The Geek Emporium sob o título “How I Broke A DM… or How Not to DM“:
Uma das muitas maneiras de não mestrar.
Certa vez um amigo e eu fomos convidados para jogar com um grupo novo. Não tínhamos vida além do jogo naquela época, então jogar RPG nunca era um problema para nós. Encontramos com o novo mestre numa livraria local e começamos o processo de criação de personagem. O mestre disse que permitia todo e qualquer material publicado para ser usado, e não tinha nenhuma regra da casa digna de nota (de acordo com ele). Eu optei por jogar com um guerreiro/ladrão enquanto meu colega fez um clérigo/mago (jogamos a segunda edição inclusive). Em suma, estávamos prontos para jogar como um grupo inteiro caso necessário.
O mestre disse que qualquer tendência estava valendo, então optamos por personagens malignos. Eu nunca havia tido a chance de jogar com um personagem maligno, então pensei “o que tem de mais?” e escolhi. O mestre verificou nossas fichas e nos deu o “ok”. Ele quis continuar e nos unir com o resto do grupo, e chamou um de seus jogadores. Bem, foi o encontro cliché da taverna. O personagem que nós encontramos tinha uma atitude ofensiva (aparentemente ele estava interpretando corretamente seu personagem).
Entretanto, como personagens malignos, nós não levamos aquilo na brincadeira, especialmente meu personagem. Eu optei por ensinar o tolo desrespeitoso uma lição valiosa… sua última. O outro personagem (irmão de meu personagem) distrairia o tolo enquanto eu tentaria envenenar sua bebida. Infelizmente, foi aí que nós quebramos o mestre. Ele declarou que minha mão não moveria de qualquer forma que permitisse a administração do veneno. Eu sussurrei ao meu irmão o que aconteceu e ele usou detectar magia.
Não havia magia na taverna.
Então eu tentei apunhalá-lo pelas costas, apenas para ver a mesma coisa acontecer. Novamente eu informei meu irmão com um sussurro. Então, meu irmão, sabendo que éramos pessoas espirituosas, lançou uma bola de fogo. O feitiço falhou. Truques e outras magias não-perigosas funcionavam bem, e feitiços perigosos lançados contra objetos também funcionavam bem (aparentemente). Ficamos perplexos, mas ainda queríamos ensinar uma lição para o imbecil.
Finalmente, o mestre esclamou “Por favor? Eu não quero que vocês se matem na primeira sessão!” num tom de voz choroso que mais parecia uma criança pedindo por um pirulito que um mestre falando com autoridade. Nós jogamos direitinho pelos próximos minutos, então o mestre nos perguntou quando estaríamos disponíveis para jogar novamente. Nós declinamos de jogar na campanha dele por vários motivos. Estes motivos são importantes e podem ajudar outros a evitarem problemas.
1. Não diga “Está tudo liberado” a menos que esteja pronto para isso
Seja flexível, claro, mas não libere tudo de uma vez. Eu cometi este erro no início de minha carreira como mestre e não pretendo repetir o erro. No lugar disso, ofereça linhas gerais e deixe os jogadores te explicarem o porquê de quererem jogar com uma classe não-listada. Então estude a classe e tenha certeza de que é algo que quer no seu jogo.
Também mantenha em mente que as tendências dentro do contexto do D&D são forças importantes. Não diga às pessoas que tendências malignas são permitidas se o grupo é basicamente composto por personagens bons. De novo, deixe os jogadores lhe dizerem porque querem jogar com personagens malignos e não tenha medo de dizer “não” se isso for causar problemas para você.
Entretanto, e isso é importante, não risque coisas só porque elas não se encaixam na sua noção pré-concebida sobre como a campanha deveria ser. A campanha deveria ser fluida, então permita que seja fluido. Se o jogador quer jogar de leal e mau, mas é porque ele vê seu personagem como covarde e miserável, então por que não permitir? Ele vai causar alguns conflitos, mas eles serão ótimos. Além do mais, ele te deu um bom motivo, não?
2. Dê motivos para os personagens não fazerem as coisas
A coisa que realmente irritou meu colega e eu é que não podíamos fazer nada que não caísse naquilo que o mestre queria (ele nos confessou isso após a sessão). Se a magia não funciona na taverna, então tenha certeza de que a taverna é conhecida por alguém como um campo anti-magia. Se o personagens não pode apunhalar alguém pelas costas por algum motivo, tenha certeza de que há um motivo legítimo para que ele não possa. Não use o argumento do “Porque eu mando” sem ter uma razão plausível.
Está tudo bem não querer discutir na mesa, mas se os jogadores não podem fazer o que eles querem é preciso ter um bom motivo para eles não poderem. Senão é só uma forma diferente de railroading (NT: condução, forçar a história para um caminho), e ninguém gosta disso.
3. Não chore para seus jogadores
Ser um bom mestre requer que você tenha raciocínio rápido. Jogadores farão coisas impensáveis, especialmente os bons. Eles verão algo que você não percebeu e farão o que você não imaginou. Se não consegue acompanhar, você não conseguirá ser um mestre eficiente. Por exemplo: o mestre mencionado acima poderia ter me permitido colocar o veneno na bebida (me permitindo ter minhas ações, já que passei na rolagem), mas ter um taverneiro com um bom olho para perceber o acontecido, e me fazer pagar uma nova bebida para o otário (conseguindo o mesmo resultado dentro do jogo). Chorar para seus jogadores quando eles fazem algo inesperado mostra que você não está pronto para o desafio.
Outro motivo para não chorar é que como mestre, o que você diz é lei. Nós não discutimos quando não conseguimos fazer o que queríamos, nós procuramos um motivo dentro da mecânica que nos impedisse. Entretanto, nós ainda queríamos fazer atos malignos. Éramos ambos jogadores com experiência, então discutir com o mestre foi a última coisa que passou por nossas cabeças. E quando ele chorou e quase implorou para pararmos com o PVP (NT: player versus player, jogador contra jogador)? Bem, aí nós estávamos prontos para sair.
Agora, sendo justo com o mestre, nós fomos babacas. Não foi intencional, mas no lugar de sentir como o mestre levava as coisa nós pulamos na garganta. Eu era mais jovem, mais burro e bem mais babaca do que sou hoje. Ele achou que era experiente como mestre e nós pensamos que ele poderia lidar com o nosso tipo de jogo. Tivemos uma experiência diferente. É por isso que eu acho que jogadores e mestres deveriam deixar bem claro qual o tipo de estilo de jogo que eles preferem antes de começar uma sessão… isso foi uma lição que aprendemos da maneira difícil. É também por isso que eu acho que os jogadores deveriam testar e sentir como um grupo funciona antes de começar a jogar de verdade com ele.
Dito isto, eu ainda sinto que estas dicas podem beneficiar as pessoas que estão pensando em fazer o salto de jogador para mestre (de qualquer jogo, estas dicas não são específicas no final das contas). Elas podem ajudá-lo a lidar com os babacas que existem por aí, igual eu era anos atrás.
“Ele é meio jogadores vs mestre, o que eu não gosto,”
Assim, que parte exatamente você não gosta? Eu não vi nada de mau no texto, apenas dicas para quem vai mestrar fazê-los com consciência. =P
IMHO o autor joga muito da responsabilidade em cima dos ombros do mestre. Todo o grupo deve zelar por um bom jogo.
Quando ele diz que achou ruim o mestre não permitir que o personagem despejasse o veneno e que preferiria que o taverneiro visse e o impedisse de envenenar o outro cara, para mim ele está querendo trocar seis por meia-dúzia. Ambos são railroading, ambos são o mestre impedindo – sem rolagem oposta – o jogador de fazer o que deseja. Também preferiria o segundo, mas nem por isso deixa de ser condução.
Isso para não mencionar que eu não vejo problema algum no mestre pedir aos jogadores que não tentem se matarem, já que ao meu ver não existe interpretação que seja mais valiosa que a diversão do outro jogador (e morrer porque um colega te matou na primeira sessão não é nada divertido).
Aliás, o ideal é o grupo ter entrado num acordo antes para não terem esses problemas de cada um querer jogar um tipo de jogo diferente dentro da mesma sessão.
Mas como eu sei que raros são os grupos que funcionam tão bem juntos, entendo perfeitamente os pontos do autor. Bem como a preferência dele de não ver o sistema por trás do jogo. Tem gente que realmente acha que isso tira parte da graça, perde o ritmo, apesar de eu mesmo não ligar tanto para isso.
Acho que vou expandir isso aqui para os dez nãos que vc tem de aprender a dizer se quiser mestrar
É por jogadores assim que eu odeio ser Mestre.