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Resenha: Lightning Returns: Final Fantasy XIII

lightningreturnsAcho que se pode acusar a SquareEnix de muitas coisas, mas não saber ouvir críticas certamente não é uma delas. Toda a trilogia de jogos Final Fantasy XIII, o universo corrente da franquia-chefe da empresa, parece ter sido feita nessa premissa: do primeiro jogo, todos reclamaram que não havia exploração, e que ele apenas um corredor linear infinito; quando anunciaram o segundo, assim, a primeira coisa que avisaram é que ele seria quase totalmente não linear, com direito a múltiplos finais. Mesmo ele, no entanto, não agradou a todos: criticaram o fato de ele não possuir um final, mas terminar com um to be continue safado enquanto novos capítulos seriam lançados como downloads pagos; também reclamaram do fato de você não jogar com a protagonista da série, Lightning; e o próprio fato de ele acrescentar muito pouco ao sistema de jogo original
Quando Lightning Returns: Final Fantasy XIII foi anunciado, assim, os primeiros elementos revelados diziam respeito justamente à resposta a estas críticas. Primeiro, seria um jogo com um final definitivo, sem DLCs de história ou continuações; segundo, você jogaria apenas com a Lightning e mais ninguém; terceiro, o próprio sistema de jogo seria totalmente remodelado. Com tantos elementos acumulados, é de se esperar que fosse mais bem acabado dos três… E, pra ser sincero, não é algo que está tão longe da verdade.
A idéia de ser “o final definitivo da trilogia,” para começar, é levada bem a sério, estando na própria premissa do roteiro. Quinhentos anos depois dos acontecimentos do jogo anterior – quando o Caos invadiu o mundo e praticamente o destruiu -, Lightning desperta do seu sono de cristal e recebe de ninguém menos do que o próprio Deus a missão de salvar as almas das pessoas antes que o mundo acabe em definitivo. Acontece que, nestes cinco séculos desde então, bastante coisa mudou. As pessoas pararam de envelhecer, bem como novos nascimentos pararam de acontecer. Aqueles que Lightning achava que conhecia bem mudaram, e, para poder salvá-los, ela deverá primeiro compreender o que aconteceu com eles neste período.
Acho interessante notar como o mundo aqui é bem mais compacto, consistindo apenas de quatro regiões distintas ligadas por um sistema de transporte ferroviário. No entanto, ele é também muito mais vivo e vibrante do que o apresentado nos dois jogos anteriores, em grande parte porque você realmente tem a oportunidade de interagir com ele e mudá-lo conforme o jogo avança. Isso já é o primeiro acerto que o jogo tem com relação aos seus antecessores: de fato imergi-lo em um mundo novo, que, à parte por alguns pequenos detalhes, você sente que existe para algo mais além da sua missão épica da vez. Você consegue mesmo sentir simpatia por alguns NPCs, e ter vontade de cumprir as suas missões propostas por isso mais do que apenas para obter os bônus de jogo que elas concederão.
Você pode explorar este mundo de forma relativamente aberta, realizando na ordem que preferir as missões principais e paralelas apresentadas. No entanto, não pense que há tempo infinito para isso. Faltam apenas treze dias para que o mundo acabe; um relógio marca o passar desse tempo, enquanto os NPCs em cada região seguem suas rotinas diárias em tempo semi-real, com o abrir e fechar de lojas, deslocamentos pelas regiões, etc. Claro, há tempo mais do que suficiente para realizar todas as missões principais e a maioria das paralelas, além de que logo no início você adquire uma habilidade especial que paralisa o relógio por alguns minutos, de forma que dificilmente você verá a tela de Game Over pelo fim do tempo disponível. Mais do que os jogos de RPG com mundo aberto típicos de hoje em dia, acho que o resultado final me lembrou mesmo foi o primeiro Valkyrie Profile, do PlayStation One, que também tinha como protagonista uma escolhida dos deuses salvando almas antes do fim do mundo. A premissa original da trilogia, de ser uma fantasia baseada nas religiões e mitologias ocidentais, talvez não tenha sido tão bem cumprida nos anteriores quanto neste aqui.
É interessante também que, diferente do jogo anterior, aqui você realmente sente a diferença de tempo nos protagonistas. Não são apenas os mesmos personagens sem sofrer alterações pelos séculos transcorridos, mas você pode ver como o tempo de fato mudou alguns deles. Há (algum) desenvolvimento verdadeiro de personagem a se perceber, o único problema sendo que são personagens com quem você provavelmente não se importava muito em primeiro lugar para isso fazer diferença justo agora.
Quanto ao sistema de jogo, acredito que alguns podem questionar a necessidade de remodelá-lo por completo, uma vez que ele já era desde o primeiro jogo o elemento mais interessante e bem executado. Mas o resultado final justifica esta escolha, com um funcionamento original e bastante divertido, fundamentado no tradicional sistema de Active Time Battle da série mas com reviravoltas suficientes para não ser apenas mais do mesmo.
O cerne do sistema está na escolha do guarda-roupa de Lightning, com a presença de dezenas de roupas diferentes adquirdas durante o jogo ou compradas como conteúdos baixáveis. De vestidos de gala a roupas militares, há uma boa dose de opções, incluindo mesmo referências casuais aos jogos anteriores da série. Cada roupa possui características e habilidades únicas, e há ainda uma pequena margem para personalização com a escolha de equipamentos e outras habilidades, de forma que há muitas opções para o desenvolvimento de estratégias e táticas de combate.
Vou dizer que há algumas coisas que me deixaram com um sentimento meio ambíguo no final. Por um lado, é um sistema profundo, com boa margem de personalização, e que permite uma boa variedade de táticas de jogo. Mas há também o lado de algumas vezes ser obrigado a usar uma roupa que você acha feia de olhar apenas pelas habilidades que ela concede; ou de obter uma muito legal na aparência, mas que você mal tem a oportunidade de usar porque as habilidades concedidas não se comparam com as que você já possui. E, claro, há todo o fator de que no fim das contas você se sente brincando de trocar os vestidos de uma Barbie enquanto joga…
Mesmo assim, é um sistema bem executado, além de equilibrado mecanicamente, o que já o coloca acima do jogo anterior, onde um sistema muito bem concebido era jogado no lixo por inimigos fracos e desbalanceados. A dificuldade aqui é em geral na medida certa, e os chefes conseguem ser desafiadores sem serem frustrantes. E voltar a ter oponentes que surgem aleatoriamente no cenário pode parecer um retrocesso, mas pelo menos eles são fáceis de serem evitados se você não estiver afim de entrar em um combate. Apenas senti falta é de inimigos grandes como havia nos jogos anteriores, em especial os Adamantoises e Long Guis que eram tão divertidos de enfrentar no primeiro jogo.
Há também um pequeno componente online no jogo na forma do Outerworld, um serviço que permite que os jogadores compartilhem o seu avanço com os demais através de screenshots e mensagens especiais, que pode ou não ser conectado às suas contas de Facebook e Twitter. Você pode até mesmo mandar alguns itens para a rede para serem comprados por outros jogadores conectados. Não chega a ser uma interação extremamente profunda como a de um Demon’s ou Dark Souls, ou mesmo, vá lá, de um Dragon’s Dogma, mas é um elemento interessante, que ajuda a criar um sentimento de comunidade entre os jogadores e de fato colabora para tornar a experiência toda mais única.
Como saldo final, acho que me diverti mais com este terceiro jogo do que com os dois anteriores (bom, pelo menos com certeza mais do que o diretamente anterior). Talvez não esteja à altura dos clássicos absolutos da série, mas eu me peguei perguntando também até que ponto isso pode ser culpa da própria SquareEnix. Eles fizeram, afinal, tudo certo: ouviram todas as críticas, e realmente se esforçaram para levá-las em consideração no produto final. Mas é difícil não ver a diferença mesmo quando se compara com jogos mais recentes, como um Ni no Kuni – Wrath of the White Witch, que, com seus personagens encantadores e cativantes, me fez lembrar o que eu gostava tanto nos RPGs japoneses do passado. A verdade é que eu também não tenho mais treze anos, não tenho mais a paciência para perder tardes consecutivas jogando, e sou em geral mais velho e crítico do que era na época em que os joguei pela primeira vez, quando eles me marcaram tão profundamente. Enfim, talvez o fato seja que eu mesmo que esteja velho demais para a série, e coloque nela um peso desproporcional por isso; pode ser hora de deixá-la marcar a adolescência das gerações mais novas.
 

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