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Bel’Hara: impérios

Quando os primeiros adajis cavaram no vale de Om, acharam uma cidade. Era escura e estava morta, claro. Mas era uma senhora de grande beleza, pois, eles sabiam, ela era um pedaço restante da nação dos amenidas – e como tal, um sopro de magia antiga em seus rostos jovens.
Adamad Can era o líder dos ducados do oeste e assim o primeiro por direito a reclamar a descoberta. Mais tarde ele pagaria o preço por isso. Pois a cidade, Erasar, continha também a maldição de seus donos primeiros. E dizem que isso fora a causa da queda da Dinastia de Can; um eco fervoroso de um passado imperial destinado à ruína sucessiva.
Nasci naquele ano da descoberta. E tinha dezesseis quando o mundo de meu inimigo caia. A Dinastia levou consigo toda a paz e ainda assim eu sorri.
Montávamos guarda, Eniana e eu, no acampamento de nosso pai. Ele era o bacaiano mais temido das pradarias e eu herdaria aquele poder, sonhava. Uma força capaz de unir tribos e atiçar xás por todo o Domínio Perene. Seu nome, você sabe, era Tammos. Tammos, o Eleito e Tammos, o consorte de Acad. Um dia, ele me chamou à tenda e falou através das barbas lavadas:
– Não há dor que não nos mude. Por isso, ganhe a sua.
Ganhei minha dor no momento da morte de Adamad, senhor dos ducados e da Dinastia. Ele queimou na cidadela negra de Raiasa e eu vi os exércitos de meu pai tomarem tudo. Mas vi essas coisas de longe, do acampamento dos filhos e filhas. Ele, Tammos, também morreu naquele ataque e senti que haveria mais que uma consequência. A derrota do poder dinástico libertou os chefes tribais do oeste; mas foi a morte de Tammos que rompeu a lealdade das tribos menores do sul – e assim os bacaianos não tinham mais um mestre.
Assisti minha irmã morrer sob o golpe da espada de um pretendente recusado. O mesmo homem que foi depois morto por guardas ressentidos. Os mesmos guardas que foram escravizados, junto comigo, na noite das tendas sangrentas. Fomos vendidos a adajis nômades, depois a kanianos da fronteira de Simbel. E no raiar do meu décimo sétimo aniversário, cai nas mãos de Golai.
Os demônios do passado sempre gostam de dizer que a vida é uma camada menor. Aprendi isso com aquele feiticeiro. Ele me tomou para servo, depois para assassino a seu comando – nunca soube porque. Quando eu fiz vinte, tornei-me seu discípulo e seu amante. E então voltei à ruína de Erasar, onde forjei meu próprio cajado com as sombras dos amenidas há muito mortos. E desde então penso nos jogos deste mundo.
Os três sóis estã nascendo agora. Eles marcam um novo ramo, pois haverá festa na Grande Ka, pela glória dos devas – espíritos de uma religião seca. Mas eu estou pronto para o próximo passo, logo hoje, cinco décadas passadas, exatamente. Olho as pirâmides vermelhas da metrópole e a Lua de Acad no céu atrás delas. Hoje sou um servo a meu próprio serviço, vestido em magia antiga. Os mortais não me veem. As estrelas de mais tarde serão a única testemunha de meus passos até a tumba de Adamad Can, lorde morto dos ducados caídos. Seu corpo embalsamado fora trazido para cá, descobri: uma honra para qualquer adaji. Por isso vim a este resquício de poder nesta era; nesta grande cidade de descobridores, mãe da perdida Raiasa. Vim para devolver a vida ao cadáver. Pois a Dinastia deve retornar, uma vez mais. Preciso de uma nova dor.
– Dos papiros de Skara.
 
A imagem deste post é da tumba de Amenherkhepshef, em Luxor. Créditos ao fotógrafo.

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