“Quentin fez um truque de mágica. Ninguém percebeu”.
E quando você descobre que aquele livro para o qual você não deu a mínima na verdade é muito, muito bom? “Não vou ler essa porcaria!”, falei bem alto quando vi a capa (horrorosa) do livro Os Magos. Na época, eu ainda trabalhava em livraria. “Calma, Cabral”, disse meu sábio colega de trabalho, “acho que você deveria dar uma chance, parece ser o tipo de coisa que você gosta de ler… dá uma olha nisto aqui”:
“Os Magos está para Harry Potter como uma dose de uísque puro malte está para uma xícara de chá” – George Martin, autor de A Guerra dos Tronos.
Tá falando sério, seu Martin? Foi mal, mas essas declarações de suposta credibilidade não me impressionam, essa falácia é só pra vender livro! “Leia o livro, Cabral”, insistiu o colega, “você tá ganhando o livro de graça da editora, o que tem a perder?” – uma das poucas vantagens de ser livreiro, além de receber os livros antes de todo mundo, era ganhar algumas cortesias das editoras, obviamente com o intuito de promover seus lançamentos.
Quanta choradeira, não? Pois bem, li Os Magos. E o livro é… muito bom! Chupa, Cabral!
O livro conta a estória de Quentin Coldwater, um adolescente de 17 anos, morador do Brooklyn, dotado de uma inteligência extraordinária e uma infelicidade maior que o mundo. Ele e seus dois amigos de infância, James e Júlia – paixonite incorrespondida de Quentin – encaminham-se para um teste de ingresso numa faculdade de super prestígio dessas, uma vez que o trio cresceu naquelas classes ultra seletas para moleques gênios ultra avançados. Eram os melhores entre os melhores, três jovens com um futuro brilhante pela frente. Então por que diabos Quentin era tão infeliz?
Ora, como todo romance que se diz ficção fantástica, algo aconteceu… e então Quentin recebeu o convite para ingressar em Brakebills, uma Universidade de Magia. Magia de verdade.
Após a leitura do livro, percebe-se que a afirmação de Martin faz muito sentido; Os Magos é como se fosse um Harry Potter para adultos. A narrativa é “sombria, perigosa e cheia de surpresas”. Os personagens são efusivamente galantes e pateticamente humanos. A magia é um poder real em um mundo real, praticado por pessoas dolorosamente reais, com todas suas inseguranças, mesquinharias, caprichos. É uma estória sobre um garoto brilhante que consegue tudo o que sempre sonhou, e ainda assim não consegue aplacar seu vazio interior. Descobre que amizades, amor e sexo não são nada simples ou inocentes, e que drogas e álcool não são tão legais quanto imaginava. Percebe que ao seu redor há vários infelizes como ele, todos habilidosos em esconder suas mediocridades atrás de fachadas de indiferença e majestade. Os anos de estudo passam voando, aprende façanhas que nunca ousou sonhar às custas de extrema dedicação e estressante rigor, consegue se superar e então se forma. E a felicidade, essa patife, ainda não deu as caras. Mas aí acontece uma descoberta espetacular, que o tira do abismo de tédio corrosivo em que se encontrava, e nosso patético herói se lança num projeto verdadeiramente ambicioso, a resposta definitiva para todos os seus anseios… só que essa expedição mágica acaba se tornando muito mais sinistra e perigosa do que qualquer um poderia imaginar.
“Nunca julgue um livro pela capa”; odeio essas máximas, assim como odeio quem inventou essa capa horrorosa da edição brasileira de Os Magos. Pois o livro é mesmo fantástico. Não é perfeito, nem de longe, há umas passagens chatas, mas o conjunto da leitura é muito agradável e flui bem. As sensibilidades apresentadas são convincentes e cativantes. Os personagens são bem construídos em torno de sua majestade fingida e sua infelicidade oculta. É um livro daqueles que você “não consegue parar de ler” não apenas por uma boa estória, mas também por uma narrativa bem escrita.
Título Nacional: Os Magos
Autor: Lev Grossman
Ano de Lançamento: 2010
Número de Páginas: 465 páginas
Editora: Amarilys
Tradutor: Otávio Albuquerque
Título Original: The Magicians
Ano de Lançamento: 2009
Número de Páginas: 416 páginas