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CONCEPT: Arquitetura Táurica

Há alguns meses tive o prazer de ser chamado para fazer um mapa para as Guerras Táuricas, livro lançado este mês pela Jambô. Seria o mapa do Forte do Triunfo, um forte avançado que praticamente simbolizava a dominação de Petrynia. E, pesquisando para o trabalho, descobri que este mapa seria a primeira representação técnica da arquitetura táurica!

O leitor pode imaginar, portanto, a tarefa que se apresentava. Meu primeiro passo foi, então, trabalhar a idéia labiríntica dos minotauros. Segundo vários textos em Tormenta, os minotauros tem uma arquitetura e uma lógica labirínticas, que confunde os estrangeiros. Seria importante entender esta lógica.

O labirinto clássico é, justamente, aquele atribuído à Creta mitológica, o “labirinto do Minotauro”, construído por Dédalo (o pai de Ícaro, aquele que resolveu tomar um bronzeado nas asas quando fugia de Creta, e acabou protagonizando o primeiro acidente aéreo da mitologia grega) a pedido do rei Minos. Parece que os Gregos eram um povo muito bruto na época que tomaram o poder da região, acabando com o domínio da civilização Minóica e quando encontraram o palácio de Knossos este era tão grande e com tantos aposentos que confundia os frugais guerreiros gregos, que começaram a associar o palácio a um labirinto. Mais até! Os próprios minóicos simbolizavam seu palácio com um labirinto, chegando a gravar seu símbolo em suas moedas.

CONCEPT: Arquitetura Táurica 1
Mas a história não acaba por aí. O caso é que este mesmíssimo labirinto tornou a aparecer através dos séculos, em diversas culturas. Sempre com os mesmos formatos, incluindo o número de níveis!

Mas uma imagem complexa, como é este labirinto, não seria assim tão fácil de ser reproduzida por tanto tempo, sem modificações, a não ser que houvesse alguma lógica por trás dela. Encontrar esta lógica me permitiria encontrar a lógica dos minotauros de Tormenta.

E, continuando a pesquisa, de fato encontrei: a lógica está no “núcleo” do labirinto. O núcleo é um símbolo simplificado, fácil de ser memorizado e que, através de um processo que era considerado na antiguidade ora como um jogo, ora como um ritual, permitia se chegar ao desenho completo do labirinto. A lógica, grosso modo, está em ligar o ponto central mais baixo à primeira ponta livre à sua direita, depois passar ao próximo ponto livre à esquerda e ligar ao próximo ponto livre à direita, e assim sucessivamente até que se terminem as ligações e o labirinto esteja completo.

Bingo! Eis a maneira como eu decidi projetar o labirinto e ao mesmo tempo dar uma pista de como um minotauro consegue se guiar dentro dele. Simplesmente a cultura táurica “brinca” com os núcleos desde cedo, podendo mesmo entender um labirinto por completo apenas olhando seu núcleo, ou entender parcialmente ao percorrer algumas de suas curvas.

Neste momento o leitor deve estar pensando: é… só que esta porcaria tem um caminho só… Sim, verdade! Mas este caminho é um longo, longuíssimo corredor, através do qual existem cômodos, portas, escadas e etc… quem não conhece só tem uma saída: seguir o corredor até o fim (sem entrar nas salas) ou entrar numa sala e arriscar sair noutro corredor diferente ou até mesmo esquecer de que lado veio. Então, embora o corredor tenha apenas um caminho, as possibilidades são enormes.

Além disso, até mesmo os romanos, quando adaptaram a idéia do labirinto, usaram a imagem de um labirinto revolvendo sobre quatro eixos para tecer similaridades entre o labirinto do minotauro e uma cidade. Uma ótima idéia para o espaço urbano de Tapista, a qual irei desenvolver logo abaixo. E se uma cidade táurica seria (quando projetada) um ou mais labirintos de vários eixos, um espaço mais simples teria um eixo apenas. É justamente o caso do Forte do Triunfo.

Com estas idéias em mente, criei um núcleo simples para o Forte:

E completei suas paredes seguindo o velho método ritualístico:

Uma grande vantagem neste método é que é possível incluir o núcleo em diversos locais, como armas, medalhões, escudos, estandartes… um símbolo que contém muita informação aos minotauros e pouquíssima a seus inimigos.

Esta imagem foi gentilmente produzida por Marco Morte. Obrigado, Marco!

E uma vez que consegui chegar a estas especulações, foi o momento de botar as mãos à obra e inserir na “planta básica” as necessidades do Forte do Triunfo, incluindo suas torres de vigia, prisão, alojamentos e tudo o mais, como se nota na imagem escaneada:


Também fiz o primeiro esboço de ornamentos para a moldura e uma montagem, que submeti à aprovação do Guilherme.


A segunda montagem, no formato retrato, foi aprovada, e pude continuar a arte, até terminar com o mapa finalizado.


Nota aos jogadores

É claro que ficaria a dúvida, ao jogador que leia este artigo, sobre qual a vantagem em conhecer este processo que levou à criação do Forte do Triunfo.
A vantagem está para o mestre do jogo que, compreendendo melhor a arquitetura táurica, pode criar desafios bem interessantes, num ambiente realmente “alienígena” para os jogadores, e para o jogador que porventura jogue com um personagem minotauro, que poderá tentar aplicar esta lógica em jogo, com o auxílio do mestre.
Nota aos construtores de cenários

Ficou faltando falar um pouco mais sobre o espaço urbano de Tapista, não é mesmo? Pois bem… vou cruzar o pensamento desenvolvido neste artigo com o que conhecemos das culturas greco-romanas, em nossa história, para falar sobre como seria este ambiente urbano.

Como possuem formação militar, suas cidades projetadas e até mesmo reformadas seguiriam um desenho urbano rígido, formado por diversos núcleos de labirinto que se ligam, formando então “praças abertas” nos pontos onde os labirintos se encontram, e praças fechadas no centro de cada núcleo. As casas formam labirintos simples, como se fossem pequenos labirintos à parte, inseridos dentro dos grandes labirintos urbanos.

Porém cidades mais antigas, como a própria capital, teriam um crescimento urbano mais desordenado, contando então com partes novas, que seguem a ordenação labiríntica, e partes antigas, formadas tanto por pedaços de labirintos quanto por traçados “orgânicos”, isto é, que somente acompanham o terreno, advindos de ocupações irregulares. Portanto, a capital de Tapista não seria tão ordenada quanto suas cidades mais novas, construídas em territórios conquistados, e mesmo um minotauro que venha de outra cidade poderia, desta forma, se perder na “cidade grande”.

Bom… por hora é só, espero que este artigo tenha divertido ao leitor, e até a próxima!

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