Resenha: Guia de Personagens dos Reinos de Ferro
Lançado no final de 2007 depois de longa espera dos fãs, o Guia de Personagens dos Reinos de Ferro é o livro definitivo para todo jogador e mestre que quiser construir um personagem realmente ligado ao cenário, trazendo diversas etnias humanas diferenciadas, raças fantásticas e uma ambientação de clima europeu pré-Primeira Guerra Mundial.
O Guia inicia suas quatrocentas páginas falando brevemente da geografia de Immoren Ocidental, o continente que abriga os Reinos de Ferro, logo partindo para um discurso bem mais meticuloso sobre a astrologia do cenário. As luas e planetas conhecidos do sistema solar são descritos com detalhes, incluindo um mapa astrológico, e você é levado pela mão para conhecer o básico do dia a dia das pessoas do cenário.
Temos descrições das estações, dos diferentes calendários religiosos, do clima e das festas tradicionais no cenário. Depois somos apresentados ao caldeirão étnico que borbulha nos Reinos de Ferro há milênios: cada etnia humana é descrita com detalhes e tem uma ilustração de exemplares típicos de ambos os gêneros, além de regras opcionais com modificadores que ilustram as capacidades típicas daquele povo. Assim, um descendente dos senhores dos cavalos khárdicos possui Cavalgar como perícia de classe automática, +2 em Força, -2 em Inteligência e +2 em Adestrar Animais e Intimidação, para representar a força física inerente e a carga cultural de seu povo.
Depois das etnias humanas somos apresentados as raças fantásticas do cenário. Temos os clássicos anões e elfos, que se dividem em Iosanos e elfos do inverno Nyss, e também os Gobbers, Ogrun e Trollóides. Gobbers são uma raça de goblins mais ou menos pacíficos, com talento para alquimia e mekânica, que vem se misturando aos reinos humanos nos últimos séculos. Ogruns são a raça dos apelões dos Reinos de Ferro: com um quê de ogres civilizados, são de tamanho Grande, com um baita modificador de Força e Constituição e com armas típicas como o Machete de Guerra Ogrun, uma espécie de mistura de lança com espada, que é tão grande que poderia empalar um gigante-de-guerra. Eles mantêm uma aliança com os anões e são bastante comuns no reino destes, onde usam seu talento para metalurgia para a criação de imensos canhões, o que nos leva a outra das armas favoritas dos apelões do cenário: o canhão de batalha ogrun é usado pelos representantes da raça como se fosse um rifle…
Finalmente temos os Trollóides. Descendentes de trolls civilizados, os trollóides são uma das raças mais bacanas e icônicas do cenário, possuem uma história rica e cheia e conflitos. Como suas moradas ancestrais ficam numa região disputada de fronteira entre os diversos Reinos de Ferro, não é incomum que guerras entre os Kriels, ajuntamentos de vilas trollóides com relações familiares entre si, e os reinos humanos aconteçam. As mais famosas são as chamadas Guerras Trollóides entre Cygnar e os Kriels da Floresta dos Espinhos.
Depois das descrições das raças somos apresentados aos nomes mais comuns para cada etnia e raça dos Reinos de Ferro, tornando muito mais fácil criar um personagem, afinal todo mundo sabe que esta é a parte mais difícil de criar um personagem em qualquer cenário. Então temos uma parte breve sobre as línguas do cenário e finalmente chegamos na parte que interessa.
Em O Estado das Coisas somos apresentados ao panorama geral atual do cenário, seus diferentes reinos e conflitos e desafios. As duas potências Cygnar e Khador e sua guerra fria nas fronteiras, os corruptos reinos de Ord e Llael, a morta-viva nação insular de Cryx e seu deus-dragão que governa tudo, o desespero silencioso dos elfos de Ios e a imobilidade dos anões de Rhul e até mesmo a vida selvagem dos glaciais elfos Nyss.
A parte seguinte é talvez a mais importante do livro: Personagens & Classes. Com este nome não poderia ser diferente a disposição do capítulo. Somos apresentados a modificações em classes já existentes no D&D para melhor se adequarem aos Reinos de Ferro e então parte-se para as novas classes básicas e de prestígio. Entre as básicas temos o temível Arauto da Matança, uma espécie de bardo/guerreiro trollóide que é capaz de fazer ataques sônicos apenas com sua voz poderosa. O estiloso Mago-Pistoleiro vem em seguida como um feiticeiro com poderes ligados a uma pistola arcana. Então temos o Mekânico Arcano e o Remendão. O primeiro é um mago especializado em artefatos mekânicos, a mistura de ciência e magia típica dos Reinos de Ferro, sendo capaz de criar e dar manutenção adequada a estes itens maravilhosos. E o Remendão, bem, enquanto seu predecessor utiliza de ciência e magia para fazer as coisas funcionarem, o Remendão faz o mesmo com um conjunto de marteladas, chutes e xingamentos nos lugares certos e pronto, tudo volta a funcionar direito… Por algum tempo.
A maioria das classes tem problemas mecânicos. Jogar com um mago-pistoleiro é pedir para ficar para trás em tudo, você não será um bom conjurador, nem um bom combatente, nem um bom misto dos dois. E o mekânico arcano é pior ainda, já que não se propõe a ser um misto de combatente e conjurador, mas sim um conjurador mais fraco com habilidades mekânicas, apenas. Alguns fãs com acesso a importados dizem que o suplemento importado Liber Mekânica soluciona muitos dos problemas do mekânico arcano, mas enquanto o livro não é publicado aqui no Brasil, não recomendo a ninguém jogar com a classe sem fazer modificações para torna-la mais competitiva.
O problema com equilíbrio fica mais evidente nas classes de prestígio apresentadas em seguida. Enquanto algumas são muito fracas como o capelão-de-batalha, outras são fortes demais como o Conjurador de Guerra e o Fuzileiro (este último capaz de desferir um ataque decisivo automático a cada rodada que permanecer escondido com multiplicador de até x7!). Para terminar este capítulo temos novas perícias e talentos. Destaque para os talentos sociais, que tornam o personagem membro, e portanto capaz de receber benefícios sociais associados, de uma das diversas organizações dos Reinos de Ferro, como o Sindicado dos Trabalhadores do Vapor & do Ferro ou a Ordem do Crisol Dourado.
O capítulo seguinte é dedicado as Armas e Equipamentos, e é sem dúvida uma das partes mais legais do livro, já que uma tendência do cenário é apresentar o máximo de histórico para o mínimo de regras. Assim, em vez de listas de armas e tabelas intermináveis do D&D, somos apresentados a trinta páginas de itens com histórico ricamente descrito, belas ilustrações e lá no final uma tabelinha clássica com os dados básicos das armas.
O capítulo dedicado a Cosmologia e Religião é bem gostoso de se ler, já que apresenta as lendas e histórias da formação das diferentes religiões dos Reinos de Ferro. Aqui ficamos sabendo sobre Caen e Urcaen, o mundo dos vivos e dos mortos respectivamente, e a infinita guerra por almas travada pelo deuses. Sobre a Ascenção dos Gemêos Morrow e Thamar e a batalha dos Grandes Patriarcas Anões para se libertar da escravidão em Urcaen, assim como da batalha ancestral entre Menoth e a Serpente Devoradora e a neutralidade total de Dhunia, que dizem ser o próprio mundo de Caen.
Também somos apresentados a trágica história dos deuses dos elfos e suas mortes (não confirmadas, mas aparentes), e o desespero desta raça em manter viva sua última deusa, Scyrah, apesar de Nyssor ainda estar vivo, mantendo-se congelado no norte, guardado pelos elfos Nyss em segredo total. E também temos a misteriosa Cyriss e seus padres mekânicos que tem que aprender os preceitos da deusa através de descobertas científicas e segredos bem guardados.
O último capítulo, Magia e Mekânica, é bem pesado de regras e pode ser um martírio para entender completamente os novos conceitos apresentados. Construir itens mágicos é contra-producente neste cenário, já que eles são mais caros que o normal, por isto chegou-se a uma solução industrial: os itens mekânicos, mistura de magia e ciência, e suas regras de criação que fazem um advogado de regras ter um orgasmo instantâneo pela complicação toda da coisa. Nunca mais você vai reclamar das regras de criação de itens mágicos de D&D, isto garanto. Em seguida temos cerca de oito apêndices com informações diversas, de postos religiosos a construção mekânica, terminando em um glossário do livro e então um mapa dos Reinos de Ferro e uma extensa ficha de personagem (seis páginas!).
No geral o Guia de Personagens é um livro maravilhoso, com descrições fascinantes e recheado de boas idéias, apesar das dificuldades e da falta de equilíbrio das regras em algumas partes. É perfeitamente possível contornar este problema com um pouco de esforço para jogar num dos melhores cenários de fantasia em publicação no mundo.
Ah, sim, antes que me esqueça. A encadernação da edição Brasileira ficou bem fraca, então tome muito cuidado ao manusear o livro para não ter que colar as páginas de volta na lombada mais tarde, é um saco!
Guia de Personagens dos Reinos de Ferro (Jambô Editora).
400 páginas em P&B, capa dura.
R$ 89,90 ou R$ 79,90 com frete grátis na Loja Jambô.