Quem nunca pensou em fazer seu próprio RPG, do cenário ao sistema, por favor, jogue a primeira caixa de charutos cubanos (se eu quisesse pedras, iria a uma marmoraria).
Já se falou alguma coisa (muito ainda não) sobre cenários. Sobre sistemas, alguma coisa também. Ultimamente eu tenho lido muito mais sobre adaptações de sistema, do que a criação de sistemas novos. Adaptações do D20, fusões entre GURPS e D20, misturas baseadas no WoD, por aí vai.
Pedindo desculpas antecipadas a todos que se esforçam nestas adaptações, não posso deixar de sentir que alguma coisa está perdida no processo.
Tudo bem, tivemos contato com uma grande jogada comercial, que foi o OGL do D20. Quem joga RPG hoje e nunca ouviu falar no D20? Quantos nunca jogaram D20? Quantas editoras, novas e antigas, começaram a lançar aventuras, cenários e produtos com o selo D20? Se pensarmos nas comunidades dos jogadores de RPG, isto é quase como ser a própria Budweiser, nos EUA. E eu não citei uma marca de cerveja à toa. Voltarei ao assunto lá no final.
Então talvez estejamos, quase todos nós, um tanto cercados pelo D20, começando a achar que sistema de RPG é isso aí, tem que passar por certos cânones presentes no D&D (principalmente), ou no GURPS, ou no sistema da White Wolf.
Eu diria que falta um pouco de foco. Ou um pouco de rebeldia, escolham vocês sua própria motivação.
Quando eu era moleque, pude presenciar a onda dos fanzines. Gente que, por um motivo ou por outro, acabava desenhando e escrevendo suas próprias revistas, mimeografadas ou fotocopiadas, distribuídas “fora do esquemão”. Faziam parte do chamado Underground dos quadrinhos e trouxe à luz grandes nomes como, para citar um, Robert Crumb. Quem lia os quadrinhos nacionais, certamente vai lembrar de todo o pessoal da CIRCO, que também veio deste underground. Estes movimentos mudaram o modo de pensar e fazer quadrinhos.
Também no RPG (sei lá… década de 80? 90?) houve movimentos que lembravam bastante os fanzines. Não havia uma política de OGL, então quem queria lançar um RPG independente tinha que criar seu próprio sistema. Para os criadores de cenários era quase uma âncora, mas para os criadores de sistema era um solo bem fértil. Mas nem eu sou um especialista na história do RPG, nem quero que pensem que estou de saudosismo. Quero apenas dizer que uma situação comercial difícil proporcionava oportunidades interessantes para o desenvolvimento de novos sistemas…
E quero falar sobre um sistema utópico. Como precisa ser um sistema de RPG, utopicamente? Se considerarmos que o jogo é de interpretação, ou personificação, então o sistema precisa ser invisível. Ser de tal forma simples, fluido e abrangente (para não dizer divertido), que seja assimilado a ponto de não ser percebido pelos jogadores e ainda assim cumprir sua função. Sua função, numa definição abrangente, é manter funcionando as leis naturais do jogo. A gravidade é uma lei natural em nosso mundo. Os fenômenos elétricos também, por exemplo.
Esta proposta de invisibilidade não é fantasiosa. É utópica, é um ideal (provavelmente) inalcançável. Mas sua busca certamente vale a pena, pois dela podem surgir novos e divertidos sistemas. E será que uma miríade de sistemas novos é tão bom negócio?
E então voltamos ao momento em que citei a Budweiser. Ela é a líder do mercado cervejeiro nos EUA, junto com outras grandes marcas como a Carling e a Sam Samuels. A industrialização da cerveja (aqui no Brasil também) padronizou a bebida a uns poucos tipos, principalmente o tipo PILSENER clarificado. Dominando o mercado, o consumidor norte-americano ficou com poucas opções de consumo.
Entretanto, de uns anos para cá, um novo movimento, de micro-cervejarias e clubes de cervejeiros, trouxe novo ânimo ao mercado. A cerveja do dia-a-dia do americano continua sendo a pilsener industrializada, mas já é possível, nos supermercados, bares e micro-cervejarias, experimentar outros tipos, tanto das lagers quanto das ales (aliás, este vosso criado gosta muito de ales). O impulso das micro-cervejarias não veio para acabar com o mercado estabelecido, mas para enriquece-lo com novas opções.
Não seria, talvez, o caso de tentarmos também criar novas opções? Não para competir, mas para complementar. Para que possamos continuar a busca de novos sistemas, mais criativos, divertidos, diversificados. Tentar chegar ao sistema utópico.
Então, uma idéia (que talvez seja o único comentário que realmente vale a pena neste texto): Ao pensar num sistema, concentrem-se no problema, isto é, no que é um requisito para o sistema. “um sistema que simule as leis naturais do cenário, e seja divertido no processo”. E esqueçam todo o resto! Esqueçam quaisquer regras e conceitos que vocês conheçam, esqueçam das fichas em papel, esqueçam dos dados, esqueçam atributos, perícias, classes, tudo! Às vezes é melhor começar do zero, tentar fazer um sistema sobre uma base nova. Quem sabe não surge algo realmente novo, algo que seja um complemento divertido ao nosso mercado? Seu cenário se passa na África do séc. XIX? Que tal um sistema que use búzios jogados numa peneira, ou em um tabuleiro que simule o couro de uma zebra?
E a pergunta final: Será que dá para tirar dinheiro disto? Com criatividade, quem sabe?
Está preparando seu próprio sistema de RPG e procura respostas? Sinto muito… eu só trouxe perguntas.