Bueno, Brigada Ligeira Estelar, o novo cenário de mechas para 3D&T, já foi oficialmente anunciado, e recebeu mesmo uma DragonSlayer especial sobre ele. Para você que está curioso para saber um mais a respeito, preparamos esta pequena sabatina com o autor Alexandre Lancaster!
Desenhista, roteirista, editor. Pela Lancaster Editorial eu produzo o almanaque Ação Magazine, aonde desenho e escrevo a série steampunk “Expresso!“. Por anos toquei um blog de anime e mangá chamado Maximum Cosmo, algo que me dava muito prazer mas que era um devorador de tempo, e agora é atualizado esporadicamente, sem regularidade. Escrevi um conto do universo de Expresso! para a coletânea Steampunk – Histórias de um Passado Extraordinário da Tarja Editorial, que foi a primeira publicação dedicada ao gênero no Brasil. E agora estou estreando como escritor, nos rpgs, com Brigada Ligeira Estelar.
O que é Brigada Ligeira Estelar?
É um universo de space opera com robôs gigantes, ambientado em um futuro distante, tendo como palco um império espacial composto de dezenove planetas, asteroides terraformados e estações espaciais. Quem batiza o livro é a principal guarda desse império, a Brigada Ligeira Estelar do título. Mas ela não é a única.
Como surgiu o projeto, e como / por que ele se tornou um cenário de 3D&T?
Não poderia ser outro sistema. Sempre gostei de RPGs de mecha como Mekton Zeta e, em menor grau, o Jovian Chronicles – mas todos eles, em especial o Jovian, tinham uma sombra de wargame que me incomodava. Eu queria meus mechas velozes e furiosos, e não gastando turno para virar à esquerda em um mapa de hexágonos. Conversei inicialmente com o J. M. Trevisan sobre um cenário de mechas e fui encaminhado para o editor, o Guilherme dei Svaldi. Eu pessoalmente gosto de sistemas mais rápidos, rasteiros e eficientes – e o Guilherme gostou da proposta. Entreguei a primeira versão do livro em setembro do ano passado, mas ela era imensa. O bom é que deixou muito material pra ser usado em outros suplementos, mas a pós-produção nunca é um processo rápido.
Que público você pretende atingir com o livro?
A princípio, os jogadores de 3D&T que vão ganhar uma nova opção de cenário. Mas espero que essa ambientação atraia mais jogadores para o sistema também.
Por que todo esse segredo até as vésperas do lançamento?
Essa foi uma decisão editorial, não minha, mas a acho extremamente adequada. Quando você anuncia as coisas com antecedência demais, há toda uma cobrança e pressão que podem ser evitados – e sempre há imprevistos durante o processo de produção. Quando o livro foi anunciado, a parte gráfica dele já estava pronta.
Houve alguma dificuldade durante a produção do livro?
Em parte de absorção de conceito, durante a produção das ilustrações. Nem todos os candidatos pegavam bem o espírito do cenário. Houve um bom ilustrador que parecia estar fazendo uma versão espacial de Arton ao invés de representar o cenário, mesmo eu apresentando para ele concept designs para que ele se baseasse. A Constelação do Sabre (que abriga os planetas do cenário) tinha que ter uma cara própria. Felizmente trabalhamos com uma equipe muito boa e ouso dizer que Brigada será um dos livros mais bem ilustrados de toda a linha 3D&T – sem demérito aos artistas do livro básico e de Mega City, claro.
Quais são as suas influências – tanto as específicas do cenário como as mais gerais como autor?
Como autor eu tenho várias, acho que iria ir muito longe aqui – porque elas envolvem o que li desde que mergulhei nos livros pela primeira vez, e eu a bem da verdade, só parti para a literatura pop mais tarde na vida; quando eu era pré-adolescente comecei lendo o Tom Sawyer de Mark Twain e se pensarmos bem, meus primeiros anos foram alimentados por clássicos e por “literatura séria.” Só descobri a ficção científica como leitura mais tarde, após algumas decepções (autores como Brian Aldiss e a dupla Arkadi e Boris Strugatski quase me afastaram de vez da literatura de ficção científica. Quem me salvou foi Poul Anderson e sua Liga Poliseática; a edição nacional da Isaac Asimov Magazine, que me apresentou a autores como Charles Sheffield; e autores de cunho mais pulp como Jack Williamson). Mas olhando bem, eu fui alguém que assistiu Patrulha Estelar quando criança e o longa do Harlock, ambos na Rede Manchete, e essas são minhas referências fundamentais. Descobri o Real Robot com Robotech, quando passou na Globo. Quando passei a assistir animes em eventos, me aprofundei mais em séries de robôs gigantes – o começo dos anos 90 foi uma boa época para você assistir tudo isso. Brigada Ligeira Estelar reflete todas essas influências, acredito.
Antes deixem-me explicar: de modo geral, as séries de robôs gigantes são divididas em super robots (aonde os robôs são monstruosamente grandes, enfrentam a ameaça do dia e tem capacidades mais próximas de super-heróis; Pirata do Espaço é um exemplo claro disso) e real robots (aonde os robôs tem dimensões grandes, mas mais razoáveis, seus pilotos tem um perfil mais militar e existem vários outros robôs do mesmo tipo em uma linha de produção; Macross e Gundam são exemplos claros disso). Dito isso, Brigada é um Real Robot e seus robôs refletem esse tipo de visão. No entanto, isso é 3D&T; se os personagens podem ser bem poderosos, porque os robôs não teriam chances de ser? Por isso, há um elemento claro importado dos Super-Robots: sem estragar surpresa nenhuma, o fato é que os invasores são imprevisíveis, dando muita margem à criatividade – e sadismo – do mestre.
Por que basear a ambientação na era napoleônica?
Ao contrário do que possa parecer, os elementos napoleônicos na verdade vieram da própria animação japonesa. O ponto é que de modo geral, a ficção científica japonesa em muitas obras se baseia nesse tipo de revisitação de época. Mesmo em um Patrulha Estelar você sente os ecos prussianos em um personagem como Desslok de Gamilon. Em Lenda dos Heróis Galácticos, os oponentes são a própria Prússia reconstruída no espaço, se olharmos bem! Mesmo hoje um Code Geass, que não é uma space opera mas tem robôs gigantes, trabalha com esse tipo de apelo estético. É um apelo mais teatral e que tem raízes fundas na cultura pop japonesa. O pessoal se lembra mais de Gundam Wing porque ele foi exibido por aqui, mas esse tipo de traje pode ser encontrado numa lista imensa de séries – inclusive em outras séries Gundam. O que eu fiz foi, a partir desse elemento visual, foi ir à fonte de onde esses criadores visuais beberam para desenvolver o cenário. Daí vieram conceitos fundamentais como os de Hussardos e Lanceiros. No entanto, há adaptação e subversão desses elementos. Afinal de contas, este não é um cenário de história alternativa disfarçado. É um cenário futurista e nele há, sim, elementos futuristas.
Como o cenário usa o 3D&T? Haverão muitas regras novas ou alternativas?
Teremos muitos kits de personagem. Eles são importantes nesse cenário – especialmente no caso de militares. Afinal de contas, se duas pessoas treinam para a mesma tropa, é de se supor que eles teriam as mesmas perícias. Também haverão novas regras e várias vantagens e desvantagens novas. Há uso dos pontos de destino vistos em Mega City, mas aqui a função deles é diferente. E teremos novas regras de esgrima – algo tão importante para o lado capa-e-espada do cenário quanto para os robôs e seus sabres de energia, mas isso vocês vão ver no livro.
Como você espera que sejam as aventuras e campanhas na Constelação de Sabre?
Todo RPG pertence antes de mais nada ao jogador. A partir do momento em que ele comprar o livro, será o seu mundo, com suas regras. Mas tendo dito isso, vou admitir que tenho uma visão solar do cenário. É verdade que o real robot surgiu de forma desconstrutiva em relação ao super robot: na primeira série Gundam, os efeitos da guerra estavam causando efeitos adversos na personalidade do protagonista (isso foi reciclado em Gundam Seed), e mortes de personagens não eram motivo para “lágrimas masculinas”. Isso batia de frente com o que se fazia na ficção científica japonesa – pensem nisso como um contraponto à atitude de heroísmo da tripulação da Patrulha Estelar, por exemplo. No entanto, acho que a minha pedra fundamental, na ficção científica e no gosto por animação japonesa, foram esses animes heroicos, melodramáticos e com personagens maiores do que a vida. Brigada toca muito em questões de honra, dever e dignidade, sobre lealdade ao que se acredita, sobre ter causas ou não tê-las. É estranho dizer que o cenário é solar quando os inimigos são sombrios e terríveis, mas a partir do momento em que você pode fazer algo contra eles, o mundo em que você vive pode se tornar melhor. É sobre ter iniciativa, não ficar chorando angústias. E embora haja a opção nas novas regras de se poder fazer uma campanha sombria, entre outras possibilidades (eu quis ser amplo para englobar as diferentes vertentes de séries de mecha), eu mesmo escrevo que talvez “essa abordagem não seja a melhor nem para o sistema, nem para o cenário”.
Primeiro os clássicos: Patrulha Estelar e Capitão Harlock (enquanto o novo longa em cg não vem, eu escolheria a série SSX: Endless Orbit, dos anos 80, e que ainda se sustenta bem em vários aspectos). O Patrulha tem agora um reboot bem válido e que apesar das concessões, merece a olhada, o Uchuu Senkan Yamato 2199. É digno, apesar das concessões, e mais adequado para quem não quer encarar um anime com animação de 1974. Nenhum dos dois tem robôs gigantes, mas ambos são exemplos notáveis dessa ficção científica japonesa de seu tempo. Outro exemplo que não tem robôs mas que deve ser visto é Lenda dos Heróis Galácticos. Ele é imenso – é uma espécie de “Guerra e Paz” da animação japonesa; é um anime muito sério e muito cerebral, então não é para todo mundo, mas os capítulos dedicados ao Império oferecem referências preciosas.
Dentro do terreno de robôs gigantes, eu tenho que citar o Gundam clássico. O ideal seria assistir os três longas-resumo da série original, mas novamente, a animação vai incomodar muita gente. Então como opção eu recomendo a série Gundam Unicorn, que está em andamento e que é muito próxima às séries clássicas. Para quem quiser conhecer melhor o universo, o mangá Gundam the Origin é obrigatório. Embora o anime Code Geass tenha muitos altos e baixos, ele tem muito a oferecer em termos de referência: é um universo de disputas internas de nobreza, vinganças profundas, levantes rebeldes, vingadores mascarados que na verdade são nobres destitulados… Algo mais leve que merece ser citado é o Heavy Metal L-Gaim, que é mais atrelado à influência de Guerra nas Estrelas e é mais cômico, mas é uma ótima referência para campanhas não-militares. E só pra fugir da animação japonesa um pouco: a versão do cineasta David Lynch pra Duna é uma grande pedida, assim como os episódios Shadows of Youth e (especialmente) Escape from Galaluna do desenho animado Titã Sim-Biônico, de Genndy Tartakovsky. Agora, se você quiser uma referência histórica para hussardos, lanceiros e esse tipo de coisa, recomendo os livros da série Sharpe, de Bernard Cornwell, especialmente após o personagem sair da Índia e ir lutar nas guerras napoleônicas. Como são muitos, mas eles podem ser lidos de forma independente sem susto, eu recomendo que se comece por Os Fuzileiros de Sharpe, emende com A Devastação de Sharpe, passe por A Águia de Sharpe e encerre em O Ouro de Sharpe – senão você não vai parar mais.
Quais os planos para o futuro do cenário? Há chances dele se expandir para além do RPG, através de quadrinhos, romances, etc?
Há sim e já há ideias nesse sentido, mas não vamos pôr o carro na frente dos bois. Primeiro, o RPG. Vamos ver a reação do público para com o cenário.
Por fim, uma pergunta técnica: se um Gundam entra em modo berserk dentro do campo magnético de Gaea, quantos caças Valkyrie VF-1 são necessários para pará-lo?
As baixas serão grandes, por isso um piloto experiente de Valkyrie o guiaria para que o Gurren Lagann acabasse com o Gundam, antes que o Ideon desperte e acabe com o universo.