Para o inferno com os paladinos bonzinhos!

Embora rolem discussões bacanas no fórum da Jambô, volta e meia eu me deparo com coisas como:
Assim, como os Elfos, os Vikins [sic] criaram uma versão, os Celtas outra, Tolkken [sic] outra e o D&D outra. Cada um Com a sua Versão, q não está errada, pq no D&D Livro do Jogador diz q o Paladino é assim embora mais tarde eles criaram as Variações de Campeões, Paladino é esse ser de estrema [sic] Bondade e senso de justiça.
Difícil não revirar os olhos. O ponto é: 9 entre 10 cenários de fantasia são politeístas. Essa polarização de bem-mal é coisa de religião monoteísta judeo-cristã, gente! No politeísto temos mais que bom e mau — existe bêbado, megera, mortuário, artístico, belicoso, ninfomaníaco, doido varrido, anal-retentivo e por aí vai, sem quaisquer rótulos morais de bondade e maldade — todos os predicados, no politeísmo, têm igual importância.
Nessa conjuntura, o que impede os deuses “não-bons” de terem seus campeões guerreiros? Esses campeões precisam estar ligados à bondade ou à maldade, necessariamente, mesmo não se tratando de monoteísmo? Seria errado usar a palavra “paladino” para designar esses campeões divinos “pouco ortodoxos”? A resposta para essas perguntas, como veremos a seguir, é um sonoro “não”.

Paladino. Vamos largar o Livro do Jogador um segundo (que, aliás, na versão 3.5, de que tratamos aqui, nem mais possui o “sagrado” suporte oficial) e nos concentrar no conceito real. Recorro ao meu querido Dicionário Priberam Online:
paladino
do Fr. ant. paladin < Lat. palatinu
s. m.,

cada um dos principais cavaleiros que acompanhavam Carlos Magno na guerra;
cavaleiro andante;
campeão;

fig.,

defensor dedicado, estrénuo;

ant.,

pequeno palácio;

adj.,

notório, público;
sabido, comum.


A grande maioria dos cenários sem problemas intestinais não possuem um Carlos Magno, então, nos concentremos nos demais significados. Alguém aí viu as palavras “bondade cristã”, “justiça baseada em absolutos morais” ou coisa parecida? Pois é, nem eu. Logo, o subterfúgio com que muitos se sentem quentinhos e confortáveis, o uso da palavra “campeão”, é desnecessário. É campeão de um deus? Então é paladino, não importa o deus.

Cortemos a cena para o clérigo. O clérigo nada mais é que um paladino menos porradeiro, nem mais, nem menos. É um religioso guerreiro/milagreiro, como o paladino, só que em diferentes proporções mecânicas — não um sacerdote oficiante ou coisa parecida, como muitos podem pensar. (Para um sacerdote mais milagreiro e menos porradeiro que o clérigo, um clérigo não-guerreiro, sugiro esta variante mui bacana).
Consertar o paladino para que funcione em cenários politeístas coerentes (i.e. que não sejam impregnados de judeo-cristianismo, com o politeísmo sendo uma mera fachada decorativa) é bem simples — basta obter o “código fonte” da mecânica do paladino. Com base no que a mecânica existente quis “dizer” em termos de regras, basta usar a mesma estrutura para que “diga” outra coisa.

Aura do Bem: Essa é fácil, basta substituir por uma aura de tendência apropriada. Se se quiser retirar um pouco do peso das tendências nas regras, basta postular uma “aura divina” — em situações em que isso for relevante, a aura passa a informação de “conexão divina aqui”. Talvez um teste de Conhecimento (Religião) — ou qualquer outra coisa apropriada — possa indicar mais detalhes — “A aura daquele sacerdote possui fortes impregnações de sentimentos como ira e beligerância — é provável que se trate de um paladino devotado a uma divindade da guerra.”
Detectar o Mal: O que é o mal além de “a opção de meus inimigos”? Na ausência de um mal artificialmente absoluto, a definição mais lógica é: “para uma divindade, o mal é aquilo a que ela se opõe”. Onde se ler “mal”, é mais coerente interpretar “inimigo da fé” (que, para os adeptos da dita fé, são, de fato, gente ruim). Isso deixa as coisas mais subjetivas e potencialmente interessantes — cada divindade tem seus inimigos da fé que, a despeito de tendência, “disparam o positivo” na detecção. Em Tormenta, por exemplo, o inimigo da fé do Megalokk, deus dos monstros, pode ser definido como “todo e qualquer humanóide racional”; para Tanna-toh, deusa do conhecimento, podem ser “humanóides racionais que recusem a civilização e a cultura” (ou bárbaros, se quisermos simplificar); para Tenebra, deusa das trevas, pode ser “canalizadores de energia positiva”, e por aí vai.  O único “malefício” disso  é forçar os demais jogadores a pensar um pouco quando o paladino do grupo afirmar com convicção que “Ei, aquele cara é mau!”
Destruir o Mal: Não toque na mecânica, apenas aplique-a sob as mesmas diretrizes de detecção expostas acima.
Graça Divina: Não há por que mexer nesse. Significa que o paladino é agraciado por uma divindade, seja ela qual for, sendo mais resiliente como resultado.
Cura pelas Mãos: Esse é um pouco mais complexo, mas não intransponível. No cânone D&Dêico, cura é efeito da energia positiva, a das coisas vivas, que é oposta à energia negativa, ligada às coisas mortas. Não precisam ser necessariamente ligadas aos nebulosos e relativos bem ou mal. Energia positiva é atração, criação, crescimento, podemos associá-la a conceitos como conforto, paz, calma, proteção. Já a negativa é de dissociação, destruição, relacionável à ira, agressividade, raiva, guerra. Basta inspecionar o portfólio da divindade: uma divindade ligada às artes e ao conhecimento, por exemplo, mesmo totalmente dissociada de moralidade boa ou má (há quem diga que toda boa arte é amoral — não confundir com imoral, por favor), está ligada a conceitos como criatividade e crescimento — então que sua imposição de mãos seja curativa e associada à energia positiva. Por outro lado, um paladino da guerra, mesmo lutando do lado dos “mocinhos”, está ligado à agressividade, então energia negativa para ele, apenas invertendo o efeito — seu toque causa dano a criaturas vivas em vez de curá-las.
Aura de Coragem: Outro que pode muito bem permanecer inalterado — é fruto de uma convicção que um paladino de qualquer deus pode possuir em virtude de seu zelo religioso fanático.
Saúde Divina: Idem. Ficar doente é prejudicial tanto para mocinhos quanto para bandidos. Justifique como “um corpo mais próximo do estado de divindade, alcançado pela fé” e seja feliz. Se a divindade estiver associada fortemente a alguma força elemental, pode-se muito bem substituir por Resistência 5 ao elemento apropriado.
Expulsar Mortos-Vivos: O que essa regra nos diz, tematicamente? “O paladino desse deus se opõe fortemente a esse tipo de criatura”. Mas não precisa ser necessariamente uma oposição. Primeiro, defina os tipos de criaturas que mais possuem relevância em relação à divindade em questão. Destes, decida (ou deixe o jogador escolher) qual o mais relevante de todos. Defina se a relação com a tal criatura é a de afinidade ou oposição. Pronto, o paladino vai expulsar (oposição) ou fascinar (afinidade) o tipo de criatura. Você já viu isso em alguns domínios clericais, e não há razão para não expandir. A deusa das trevas curte mortos-vivos — o paladino dela fascina mortos-vivos. O deus da ordem não vai nada com a cara de criaturas “bagunçadas” — ele expulsa aberrações –, mas o deus do caos as acha bacanas — ele fascina aberrações. O deus das artes não curte tipos grosseiros e feiosos — expulsa humanóides monstruosos.
Magias: Não queremos mexer no equilíbrio mecânico, logo, parta da lista inicial, fazendo substituições apropriadas. Um bom lugar para começar a fuçar é nas listas de magias dos domínios clericais da divindade do  paladino.
Remover Doenças: Esse é o mais fácil, já que se trata do efeito de uma magia, e essas possuem um parâmetro em comum: seu nível. Remover doenças é uma magia de 3o. nível, logo, escolha uma magia apropriada de 3o. nível, utilizável o mesmo número de vezes por semana que remover doenças seria. Você pode deixar o jogador escolher uma dentre as magias dos domínios da divindade (eu não deixaria, mas não me levem a sério, porque sou partidário dos mestres tiranos) ou definir uma para cada divindade, podendo até desrespeitar alguns parâmetros — confusão, como magia divina, é de 4o. círculo, mas seu círculo mais baixo, de bardo, é 3o.; se não vê problemas nisso, é uma boa habilidade similar à magia para paladinos do deus do caos.
Montaria Especial: Essa pode ficar como está, havendo apenas modificações cosméticas — a montaria especial do paladino de um deus da morte seria um corcel negro — ou usar outro tipo em vez de Animal (o tipo de criatura que é a montaria) — a montaria do paladino do deus da morte é um cavalo Morto-Vivo. A única dificuldade é manter o equilíbrio — nosso cavalo morto-vivo deve ter um número de Dados de Vida que corresponda ao Nível de Desafio de um Animal com o número de Dados de Vida da montaria padrão. Se você não curte a montaria, pode utilizar o vínculo divino do Paladino do Pathfinder — que fornece uma (baita) melhoria divina para a arma, que pode necessitar apenas de mudanças cosméticas — a arma vinculada do paladino do deus da destruição emite uma luz arroxeada, de tons frios, por exemplo.
Tendência e Código de Conduta: Ditados pelo que é permitido e proibido para os clérigos da mesma divindade, ora pois.

Como vêem, não há obstáculo real que impeça qualquer divindade de ter seus paladinos — exceto a rigidez de pensamento ocasionada pelo apego à tradição. Seu cenário é politeísta? Então faça os paladinos se comportarem de acordo. Uma das coisas boas no D&D 3a. edição foi eliminar as restrições de classe e raça, níveis máximos para uma raça em dada classe… Por que não dar um passo a mais e eliminar restrições supérfluas de tendência? Cavaleiros de armadura brilhante não precisam ser branquinhos, “celestiais” e bonzinhos — uma armadura de metal negro, se bem polida, fica igualmente lustrosa.

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38 Resultados

  1. Daniel R disse:

    Remo, você é um rapaz perito em abrir olhos. (ops)
    Excelente, totalmente excelente artigo.

  2. Metal Sonic disse:

    Mais um artigo excelente! Bem que eu queria ver uma mecânica assim para o Tormenta OGL…

  3. Jagunço disse:

    Engraçado que os apegos desse tipo (“tradicionais”) me parecem cada vez mais raros (tudo bem que eu não tenho mais paciência para muitos fóruns, então essa minha avaliação fica frágil…).
    É fato que o sistema de tendências/alinhamentos nunca foi lá uma coisa muito amada. E, na minha opinião, ele atrapalha um pouco as histórias quando levado ao extremo. Por isso não uso e fico feliz com matérias como essa. Boa adaptação e bom senso em traduzir em regras uma dinâmica muito mais ampla de descrições/arquétipos. Não é difícil transformar o “mal’ em “o mal para o deus”, como muito bem sugere o texto. Enfim, uma discussão, pra mim, válida – para acabar com algumas limitações criativas fundamentalistas que, aparentemente, ainda vivem por aí.
    P.S. : Só um lembrete semi-inútil: O eixo bem-e-mal não é exclusividade do judaísmo-cristianismo, como todos devem saber. Vamos registrar isso só pra não soar como uma acusação injusta de simplificação da realidade por parte de apenas certos credos.
    Abração. 🙂

  4. Heitor disse:

    Bom, essa coisa de paladinos de qualquer tendência e seus poderes variantes nem é mais tão novidade (MMOs lançaram a “moda” e D&D4 abraçou). O negócio é que muita gente que renegou a idéia a princípio agora apelaram para ela em vergonhosos retcons.

  5. Leonel Domingos disse:

    É curioso.
    O que mais me impressiona em seu artigo é que eu nunca pensei de outra forma… e agora, lendo as respostas, vejo que não era assim que era interpretado. Impressionante mesmo.

  6. Jagunço disse:

    Hmm… já eu achei curioso não entender bulhufas do último comentário (“bulhufas”. É o nooovo…).
    Quem manda eu ser curioso? 🙂

  7. Edy Abreu disse:

    Caceta de agulha! Texto foda!
    Confesso que no início achei que seria um bla bla bla danado e eu já pensava em comentar “Use um Clérigo de uma Divindade que não o “force” a ser Band-aid” ou algo parecido, mas novamente confesso, ficou muito além do que imaginei!
    Talves a idéia do Paladino Branco Brilhante inicial seja justamente para orientar os jogadores a criar personagems “bons” e não “vilóes” (afinal, isso é coisa pra mestre fazer, =P), mas esse texto possui todos os argumentos para se criar um Paladino Púrpura, Verde, Negro ou Cor-de-burro-fujido”.
    Ainda não joguei 4E, ams para a 3.5 isso que li aqui AGORA É LEI!

  8. Metal Sonic, assim que o livro sair, essa é provavelmente uma das primeiras adaptações que você verá da minha parte por aqui.
    Jagunço, há lugares em que isso ainda é forte, acredite. Experimenta ver o tópico sobre paladinos de Tenebra no fórum citado, na seção de Tormenta. A tônica é “ela é uma deisa das trevas e um de seus domínios é… Mal!, o Livro do Jogador diz que paladinos devem ser bonzinhos, logo, ela não pode ter paladinos, fim de papo”. (E, de fato, o bem-mal não é exclusivo do judeo-cristianismo, mas, em geral, o pessoal toma isso (bem-mal absolutos) como algo “natural” em virtude de terem crescido sob a influência desse sistema de crença.)
    Heitor, se é moda ou não em MMOs (o último que joguei foi Ragnarok Online, aaanos atrás), não sei dizer. Pode até ser (de fato, o D&D4 usa esse padrão agora), mas a justificativa aqui se baseia na natureza do politeísmo mesmo (como evidenciado pelo fato de o Leonel sempre ter achado essa a visão natural). Aqui no Brasil, ao menos, o primeiro esforço publicado nessa linha é o Neokosmos, em que, sendo greco-romano (e, portanto, politeísta), conta com um campeão nessas linhas (com “destruir inimigo da fé”, entre outras coisas).

  9. Leonel Domingos disse:

    Ok, vou explicar para você, Jagunço. Acho mesmo que ficou dúbia a frase.
    Eu achei curioso porque eu sempre considerei os paladinos, clérigos e afins, desta forma como o Shido escreveu em seu artigo. Sempre considerei que os conceitos de certo ou errado variam de acordo com a cultura que gerou o indivíduo (a cultura social que lhe foi imposta, desde o nascimento. Religião também faz parte de culturas sociais).
    Então, pegando um exemplo em nosso mundo. Não vou entrar no mérito da verdade mística neste caso, nem discutir teologia, nem nada assim. Vamos supor — à guisa de exemplo — que haja um julgamento final para as pessoas quando morrem. Que serão julgadas por seus pecados e seu destino será estabelecido. Neste escrutínio, um judeu que comia carne de porco regularmente seria punido de acordo com seu pecado. Um brâmane que matou e comeu uma vaca também seria punido. Um cristão que fez as mesmas coisas, comeu carne de porco, matou uma vaca, não seria.
    Porque o conceito de certo e errado está variando entre as culturas. No caso, a cultura religiosa destes indivíduos. O brâmane acredita que é muito errado fazer mal a uma vaca. O cristão, não.
    Agora, um exemplo mais capcioso: se pensarmos em um assassino cristão e um assassino thug (estou usando o conceito dos thugs como uma seita. Existem historiadores que refutam a idéia e os conceituam apenas como organização criminosa). E digamos que ambos conheçam este conceito de que você será punido de acordo com suas convicções.
    De nada adiantaria ao assassino cristão tentar se convencer de que, para ele individualmente, o assassinato não é errado e, portanto, está livre da punição. Durante toda sua criação lhe foi incutida a idéia de que o assassinato é errado. No fundo, ele acha realmente que está errado.
    Enquanto que ao thug foi incutida a idéia oposta.
    Claro, eu estou falando apenas de UM aspecto cultural: a religião. Mas na verdade temos diversos outros aspectos em todas as culturas que influenciam os indivíduos.
    Então, lendo as respostas que muitas pessoas deram ao artigo do Shido, eu vi que esta percepção, esta interpretação dos conceitos de certo/errado e conceitos religiosos dos personagens no jogo, não é tão usual quanto eu achava.
    Explicado agora, Jagunço?
    Abração
    Leonel

  10. Shin disse:

    Muito interessante o artigo.
    Realmente um grande “tapa de luva” em muito.
    Alinhamentos (Tendências na 4e) são uma coisa que eu acho muito “restritiva”. Por vezes eu acho que deveria ser aberto isso.
    Como em muito vemos isso dentro da mecânica do sistema, fica uma coisa complicada.
    Bom-Mal é um extremo de ponto de vista.
    Para muitos cultos antigos, morte é algo errado. Outros morte é considerado uma benção.
    Em algumas culturas o sacrifício era algo comum, e os sacrificados eram considerados exaltados.
    Novamente, excelente texto!
    Abraços.

  11. Jagunço disse:

    (Shido, vou espiar a comunidade sim… Que os deuses me dêem paciência, porque se me derem força… :D)
    Agradeço, Leonel. 🙂
    Uma das coisas mais interessantes em jogos de fantasia medieval é que eles impulsionam, sim, o exercício da relativização, no meu entender. É como Shido disse: ainda existem diversos “tons” de discussão e ainda existe gente (infelizmente) que prefere simplificar demais. Se isso fosse só para o jogo, tudo bem – afinal ninguém tem obrigação de estudar antropologia e relativismo cultural pra jogar RPG. Infelizmente, mais uma vez, a gente sabe que esse tipo de discurso acaba mesmo é se reproduzindo pra vida real, em muitos casos. Ou se desdobra quando limita a imaginação no próprio jogo. Voltando ao que eu entendo por uma maioria mais disposta, o que vejo é que existe, entre jogadores de fantasia, uma vontade mais clara em observar – pra o divertimento e aprofundamento de seus jogos – que as diferenças históricas (ficcionais ou não) permitem uma variedade prazerosa de origens e formas de personagens. O paladino, fruto realmente de um arquétipo cristão, pode (mais hoje do que antes) ser tratado dentro dessas variações culturais dos cenários de campanha. Isso é, pra mim, tanto um amadurecimento da reflexão rpgística como da reflexão cotidiana.
    Abraços 😀

  12. Shin, se não me engano a 4e tirou um pouco do peso das tendências/alinhamentos nas regras, procede isso?
    Por mim, que fossem removidas logo de uma vez. Além de atrapalharem na sintonia regras-temática, só têm uma utilidade real — a de etiquetar personagens; “mau” é lido como “pode matar” e “bem” é lido como “não pode matar”, simples assim, pura desculpa para usar uma detecção, saber que o cara é “mau-trevoso-666” e, portanto, chacinável sem qualquer piedade ou peso na consciência. Lembra um bocado a política internacional do governo Bush…
    Como o Edy observou, é bacana não ficar restrito, e poder fazer paladinos de “todas as cores”, não só branco e preto. Regras devem GUIAR as decisões temáticas dos jogadores dentro do equilíbrio mecânico, não RESTRINGIR, afinal de contas.
    Jagunço, dê um pulo lá por sua conta de risco. É uma bizarrice — para quem joga em um cenário tão pouco ortodoxo como o Tormenta, o pessoal de lá tem uma paralisia criativa estarrecedora. E eu concordo inteira e enfaticamente com você na questão de que é interessante aproveitar a fantasia, que se passa em mundos que não são o nosso, para experimentar diferentes conceitos e interações especulativas entre elementos que são impossíveis (ou, no mínimo, altamente improváveis) na realidade. O interessante é que enquanto os absolutos morais são nutridos e acariciados por esses jogadores, outros aspectos, como leis da Física e coerência sócio-históricos, são jogados pela janela com uma alegria enorme.

  13. Daniel disse:

    Interessantíssimo e muito bem escrito.
    Mas sei lá, acho q o nome paladino não combina pra qualquer guerreiro sagrado, sempre me vem a mente o clássico paladino. Guerreiro sagrado é mais bacana =D. Mas mera questão de gosto.

  14. Nelson disse:

    Discordo completamente.
    você fez menção a Carlos Magno, que é o criador dos Paladnos. note-se que Carle Magne era uma campeão cristão e que paladino foi criado especiicamente para isso.
    Ate concordo com a sua idéia de que deuses maus ou pelo menos não “jesuses” possam ter seus campeões, mas que eles sejam nomeclaturados de outra forma.
    E se pesquisarem a historia do criador do SIRG, verão que reza a lenda. seu tumulo é vigiado por um arcanjo, dada sua ligação com o cristianismo monoteísta L&B.

  15. Baikal disse:

    Discordo no mesmo sentido que Nelson, como discordava no fórum citado. Onde está a “bondade cristã”? No contexto dos paladinos. A referência é feita não a cruzados, mas cavaleiros que serviam de modelo para toda a cavalaria, assim como aqueles de Arthur. A lenda dos paladinos é tardia em relação aos casos que conta (séc. XVI, contando de um cavaleiro do séc. VIII e IX), está idealizada e conta como os cavaleiros DEVIAM ser. Assim como a maior parte dos romances de cavalaria.
    Em um romances e mitos de heróis, este é mais poderoso que o seu inimigo. Especialmente nos romances de cavalaria cristã, a virtude do cavaleiro lhe garante poderes maiores contra o mal. O demônio não dá poderes da mesma forma, pois no oposto da virtude estariam os vícios, não “virtudes sob outro ponto de vista”. Os mitos contam histórias como se a moral fosse absoluta e a justiça divina existisse.
    Na proposta de D&D 3.0 e 3.5, trazendo da versão anterior, o Paladino existe num contexto em que há alguns absolutos. Deuses da justiça não são parciais, seres benignos não compadecem de leis amorais e por aí vai. Como nos romances de cavalaria quer se afirmar que é assim que um cavaleiro deve se comportar. Com coragem e fé.
    Por outro lado, Cervantes em Dom Quixote caçoa dos romances de cavalaria e do seu ideal nunca realizado. Se você quiser um cenário mais realista ou pelo menos, sem os “absolutos morais”, um paladino não é um personagem viável, nem por Deus, nem pelo Diabo, ou qualquer um da miríade de deuses que exista. Se estamos falando simplesmente de tirar o clichê de “O Bem Vence o Mal”, então paladinos poderiam ser exatamente como falou, orientados pela tendência, servindo de modelo para todos os cavaleiros da fé. Mas no mesmo embalo, as tendências todas deveriam estar desligadas.
    Uma forma interessante de lidar com a questão foi a adotada por Ravenloft da versão compatível com D&D 3.0. O Paladino é Leal e Bom, mas é uma criatura quixotesca, supondo que luta pelos deuses do bem e que seu cavalo é parte disso, quando na verdade a montaria é um demônio cruel e os Poderes Sombrios manipulam o pobre.
    Outra é usar o conceito de templário ou cruzado, ou como disse o Daniel, um “guerreiro sagrado”, escapando do modelo cristão e o de cavaleiro. O clérigo em si já é um guerreiro sagrado, usa armas e armaduras até. Já o cavaleiro é o paladino sem a fé “forçada”. Ambos cobrem o conceito dos paladinos “não-ortodoxos” facilmente, com diferenças mecânicas apenas.
    Por fim, falando em Tormenta. O cenário é, de fato, pouco ortodoxo, mas não deixa de colocar em cores claras o que é bom e o que é mau. Tanto como qualquer outro cenário que cobre grandes públicos, ele tem a opção (e o caminho oficial) mais simples e com a qual está a maioria acostumada. Um paladino, desde o Panteão de “brinde” vindo nas DBs, nunca deixou de ser um “Defensor dos Direitos Humanos”. Os deuses malignos criavam antipaladinos ainda mais poderosos que eles para os perseguir, no sentido do AD&D. Acrescentaram o algoz da Tormenta e vários ex-paladinos desde lá, mas nunca um desvio do conceito de bem e da correlação com os paladinos. A cavalaria dos romances medievais está presente em Arton, transportada diretamente deles e com teor religioso até maior que nos próprios romances.
    Eu não tenho dúvida que é possível ser criativo exatamente com este material deixado pelos autores e acho que taxar qualquer um que estão alinhados com eles de “paralisados” em sua criatividade não é um bom julgamento. Não é preciso testar todas as variáveis reais em uma história para ela divertir.

  16. Baikal, eu quis oferecer um guia para se usar em qualquer cenário desprovido daquilo que gosto de chamar de “politeísmo picareta” — a coisa tem a cara e o focinho (e os valores absolutos) do cristianismo, mas com uma fachada politeísta. Mesmo com Tormenta fazendo a mesma coisa, pode haver quem use o cenário e não veja sentido nas coisas serem assim. É pra esses espíritos mais coerentes que eu escrevo.
    A questão não é “um paladino para cada tendência”, mas “um paladino para cada divindade” — e, no politeísmo, como escrevi nos primeiros parágrafos, as deidades têm diversos predicados que não são nem bons nem maus — são aquilo que são, ponto.
    Você escreve sobre paladinos sob o ponto de vista cristão, que eles devem ter aqueles valores pois são exemplos dentro daquele conjunto de crenças. Mude o conjunto de crenças e, por coerência, o paladino deve mudar de acordo. Se eu tirar a super-simplificação de “bem vs. mal” abosluto (que, em si, é vazia, só é usada para saber quem se pode matar), os paladinos continuam viáveis — eles continuam representando o bem e as virtudes, mas bem e virtudes *conforme entendidas pelo deus em específico*. (E desligar as tendências é uma das melhores coisas que alguém pode fazer.)
    Reforço: se, por coerência, mais possibilidades *existem*, não usá-las por falta de uma orientação “oficial e sagrada” específica é limítrofe, e, sim, representa uma calcificação, uma paralisia, uma estagnação em nome da “tradição” que é estarrecedora.

  17. Leonel Domingos disse:

    Bom, Nelson…
    Na verdade, os 12 paladinos de Carlos Magno ficaram conhecidos porque são assim descritos na Canção de Rolando. Porém, naquela época, esse ainda era o termo dado aos oficiais ligados à corte imperial. O império romano usava o termo para designar os oficiais ligados diretamente ao palácio do imperador, no monte Palatino (daí palatinus, paladinos. Aliás, a própria palavra “Palácio” vem daí).
    Então, o que temos é que um termo militar romano foi tomado para designar cavaleiros ligados ao novo imperador (romano-germânico), e foi então novamente tomado por poetas para designar uma espécie de guarda-de-honra em “a canção de Rolando”, acabaram ganhando ares místicos e foram incorporados ao idioma com os conceitos que conhecemos hoje.
    Em algum momento alguém achou que seria interessante colocar esse personagem no RPG, da mesma maneira que outros personagens específicos de certas culturas, como o golem, por exemplo (esse, então, totalmente deturpado).
    Eu mesmo sou bastante purista com certas terminologias, principalmente quando o termo é muito específico a uma história ou tecnologia. Acho os kobolds de D&D uma afronta à cultura ocidental, não porque eles existam no jogo, mas porque os escritores pegaram o nome e descreveram uma criatura que não tem absolutamente nada a ver com a original. Seria como descrever um bicho de 3 pernas, com cabeça de arara e que vive no fundo do mar, e chamá-lo de “saci”.
    Porém, com alguns outros termos acho que temos que relaxar um pouco. Quando colocaram os “paladinos” no rpg, estavam querendo se referir aos “campeões divinos”, e calha que o termo popularmente já caiu nesta descrição, desde que o povo misturou “a canção de Rolando” com as lendas arturianas.
    Agora, se o problema é com nome, então é muito simples. Chamem de “campeão” e pronto.

  18. Jagunço disse:

    O nome “campeão” é a alternativa usada na adaptação “Neokosmos” publicado há uns anos – um “mundo grego de fantasia” caso alguém não conheça. Um personagem guerreiro à serviço de um deus.
    Mas se o problema era mesmo a palavra, penso que a explicação do Leonel sobre a origem do termo é ótima pra nos atermos a uma variação possível. Não, de fato não é necessária. Mas é possível. O que eu sinto é que a discussão gira em torno do que é coerente. E neste caso, penso que o uso de paladinos de diferentes deuses não seja uma incoerência – nos termos da matéria/post.
    Sobre o cenário de Tormenta (ou outros de fantasia) colocar o bem-e-mal como algo “metafísico”, “imanente” ou “cósmico” é aceitável só até certo ponto. A apresentação do cenário pode trazer essa construção sim, mas mantê-la assim ou tratá-la por meio de um relativismo – complicando um pouco os julgamentos dos personagens – são opções igualmente válidas.

  19. Arquimago disse:

    MUito bom o artigo!
    Eu também sempre pensei assim, mesmo na 3.0 edição, o livro do mestre já comentava algo assim.
    Em terras brasileiras temos o Reia que traz varios “paladinos”(inclusive os paladinos maus tambpem, perseguem paladinos do “capeta), já que apesar do “Carlos Magno” existir tem também temos as culturas “helenicas”, e lá tem cada dues o seus campeçoes, e com regras bem faceis como essas para adapetar a classe!
    Outro cenário é Os Reinos de Ferro, se não me engano no sentrégua 2 tem varios campeões do deus humano da tirania.
    Ou seja o conceito é antigo e já existe por aqui, agora na internet para abrir os olhos é a primeira vez que vejo!
    E dou minhas congratuações ao aoutor por isso!
    Ps: também não gosto de paladino = “ser de luz divina boa”.

  20. Baikal disse:

    Shido, se o motivo para não usar possibilidades diferentes, abolir tendências e outras atitudes que convencionalmente não estão admitidas for “em nome da…” tradição ou mesmo de um padrão oficial, eu concordo contigo que não faz sentido.
    O motivo pelo qual discordo não é pela tendência ou pelo nome em si. Eu compro a crítica aos modelos fechados de Paladino e Ranger (que vi comentar contra uma vez no citado fórum), ou o clérigo combatente como opção preferencial do sistema. São cerceamentos desnecessários. Apenas acho que naquilo que chama de “politeísmo picareta” (eu nunca vi ali pretensão de ser politeísmo tal como os reais, a criatividade ali está moralmente limitada ao lugar comum de bem e mal, Justiça Divina e outros aos quais a sociedade ocidental está acostumada, provavelmente porque debates morais não seriam interessantes para o jogo). Deixando isto claro, eu volto ao meu ponto.
    O Paladino é proposto no D&D 3.0 e 3.5 (sistema no debate) como uma figura dentro desta luta de bem contra o mal e que replica nas aventuras feitos como os de Rolando e outras histórias parecidas. Os cenários em geral não saem deste molde para muito longe. Alternativamente, os jogadores podem chutar a tendência e o estereótipo, recriando o mundo com mais cores que preto e branco (e cinza, se considerar as nuances leais, neutras e caóticas na metáfora). Exercitando como pediu, esta retirada de valores e crenças, também removesse a unidade do Código de Cavalaria, eu não vejo mais o paladino se não houver uma só cavalaria. Não é bem a divindade Leal e Boa que cria o paladino, a meu ver, mas sim uma cavalaria coligada a um conjunto de princípios.
    Com ou sem tendência, eu, particularmente, não vejo sentido no paladino, esvaziado de seu ideal cavaleiresco e transformado em algo particularizado por religiões. Prefiro ver como pode uma única “Ordem da Cavalaria”, cultivar os mesmos valores sob diferentes crenças. Mas as regras da classe são aproveitáveis, como você bem adaptou, realizando o Paladino – no significado de Defensor Extremado da Causa; Guerreiro Sagrado; Oficial Militar de uma Guarda de Confiança (versão latina, como o Leonel citou), ou algo assim. Nestes conceitos, que vemos ser também aplicados ao nome paladino (ainda que não sejam os usados na idéia do 3.0, 3.5 e cenários derivados), cabe plenamente o seu argumento e proposta.

  21. Baikal disse:

    E acabei esquecendo que, claro, se tendências e maniqueísmo forem abolidos e o conceito de Cavalaria mudasse, as alterações também seriam necessárias à classe.

  22. Baikal: “Apenas acho que naquilo que chama de “politeísmo picareta” (eu nunca vi ali pretensão de ser politeísmo tal como os reais, a criatividade ali está moralmente limitada ao lugar comum de bem e mal, Justiça Divina e outros aos quais a sociedade ocidental está acostumada, provavelmente porque debates morais não seriam interessantes para o jogo).”
    Me desculpe a franqueza, mas acho isso estarrecedor. Pelo menos as pessoas do meu círculo de relação mais próximo não polariza, em suas vidas, as coisas em bem e mal ou sequer consideram a tal “justiça divina” em questões de ordem prática.
    Isso, para mim, parece uma simplificação crassa, típica dos estadunidenses, cujo objetivo é varrer pra baixo do tapete qualquer possibilidade de julgamento relativista para facilitar a porrada (“Ei, esse pessoal da religião X é (como os muçulmanos, talvez?) MAU, logo, atirem à vontade!”).
    Eu encaro todas as religiões igualmente — pra mim, o cristianismo é tão válido quanto o wicca que, por sua vez, é tão válido quando o umbanda ou o espiritismo.
    No mais, como disse o Jagunço:
    “Uma das coisas mais interessantes em jogos de fantasia medieval é que eles impulsionam, sim, o exercício da relativização, no meu entender. É como Shido disse: ainda existem diversos “tons” de discussão e ainda existe gente (infelizmente) que prefere simplificar demais. Se isso fosse só para o jogo, tudo bem – afinal ninguém tem obrigação de estudar antropologia e relativismo cultural pra jogar RPG. Infelizmente, mais uma vez, a gente sabe que esse tipo de discurso acaba mesmo é se reproduzindo pra vida real, em muitos casos. Ou se desdobra quando limita a imaginação no próprio jogo. Voltando ao que eu entendo por uma maioria mais disposta, o que vejo é que existe, entre jogadores de fantasia, uma vontade mais clara em observar – pra o divertimento e aprofundamento de seus jogos – que as diferenças históricas (ficcionais ou não) permitem uma variedade prazerosa de origens e formas de personagens. O paladino, fruto realmente de um arquétipo cristão, pode (mais hoje do que antes) ser tratado dentro dessas variações culturais dos cenários de campanha. Isso é, pra mim, tanto um amadurecimento da reflexão rpgística como da reflexão cotidiana.”
    E, pelo menos nos meus jogos (em que o politeísmo faz jus ao nome), jamais foi gerado qualquer “debate indesejável”. Pelo contrário — os personagens sempre acabam em situações interessantes quando, em suas viagens, interagem com diferentes padrões de moralidade. Como escreveu o Jagunço, isso adiciona à reflexão, e passa aos jogadores um sentimento de que aquele é *outro* mundo, um mundo diverso e heterogêneo. E, obviamente, *há* combates — o mestre só precisa justificá-los na história, sem precisar usar a gambiarra de “pode matar, ele é MAU”.

  23. Baikal disse:

    A simplificação realmente é grave, como é apresentado, o jogo pode ser realizado com meros massacres de goblinóides, demônios e humanos corruptos, com a sua destruição deixando feliz o “deus bondoso”.
    Mas não precisa ser assim, pelo próprio conteúdo da classe original e seus textos de referência é possível escapar do “mínimo moral”, simplesmente porque outras religiões não seriam malignas por suas crenças distintas e isto é um primeiro ponto de reflexão que pode ser trazido ao jogo. Nas gestas de cavalaria o mal está representado na religião inimiga porque só há um Deus, os infiéis, por conseguinte, teriam crenças perversas necessariamente.
    Se há outros deuses que não são simples inimigo de uma religião verdadeira, como os deuses neutros, do politeísmo simplificado de D&D, não haveria motivo para uma guerra santa contra crenças que não fossem diabólicas. Por incrível que pareça, e de certa forma reforçando seu argumento, Shido, se as culturas da Terra fossem de certa forma reais, em um mundo Fantástico, como em Arkanum/Trevas, os Paladinos de D&D não teriam como lutar ao lado de seus reis debulhando pagãos porque estes são maus – porque não são. A cavalaria fantástica seria um obstáculo para massacres intolerantes e não um fomento, como foram os exércitos organizados de cruzados.
    Há dois caminhos para fugir a uma cruzada sem qualquer julgamento moral. O primeiro é desfazer o arquétipo e aproveitar-lhe a função: guerreiro do deus contra os inimigos deste. O outro é posicionar o cavaleiro, portador de tal código de honra, em um mundo realmente dotado de crenças distintas e que não são simplesmente do bem e do mal. No primeiro, você tem uma experiência de viagem ao passado, de uma maneira realista até, bem verossímil e também fantasiosa, afinal, há magia e deuses intervindo na história. No segundo, uma experiência sem precedentes históricos, mas com precedentes literários abundantes e igualmente fantástico e alienígena. Nenhum dos dois mundos imaginados é como o mundo em que vivemos.
    Colocando em exemplo os meus jogos em Tormenta (onde o tal maniqueísmo aplica-se, diferente dos jogos feitos em Yrth), o personagem orientado pelo “arquétipo cristão” guiou uma guerra contra os “pagãos” das florestas. A Guerra não teve qualquer repercussão no seu aspecto santo, o “bem” promovido era relativo e para reverter o “mal” proporcional, ele teve de cuidar muito bem dos derrotados, devolvendo-lhe as terras depois de submetidos e os orientando para promover uma paz duradoura. Ele precisou agir de maneira diferente do que fizeram realmente os cruzados e americanos, supostamente bons contra povos liderados por pessoas supostamente más. Vivenciar uma preocupação… arquetípica cristã… com os perigos reais de danação, sedução e decadência, propostos ao paladino, pode ser uma experiência complexa e não simplificada. Retirar o dom de detectar o mal pode inclusive incrementar esta questão, ou aplicar disfarces de tendência – ou anular todo o ponto a respeito de tendências.

  24. Baikal disse:

    PS: Eu considero a questão de bem/mal/justiça porque ela foi assim proposta nos enredos em questão. Em Gurps, onde ela geralmente não surge, trato a coisa de maneira diferente. Mas quase todo tema épico moderno propõe algo do gênero. Os temas dos épicos greco-romanos não o fazem da mesma forma. Um heroísmo no molde destes também é uma idéia interessante, “fresca” na mente ocidental e capaz de estar ausente de mentalidade cristã (por precedê-la) nos haveres dos personagens.

  25. Adão Pinheiro disse:

    Eu não sou lá muito fã de anime, mas os heróis de anime geralmente defendem causas, e mão apenas a forma banal de bem/mal/caos/ordem. Eu sempre vi os jogos que usam esses “eixos” como histórias para criançinhas, e vejo que não sou o único. Esta matéria vai tornar o seu paladino obrigatório em qualquer mesa de jogo para pessoas com mais de 5 anos de idade.

  26. Leonel Domingos disse:

    Menos, Adão. “obrigatório em qualquer mesa de jogo para pessoas com mais de 5 anos de idade” foi demais.

  27. Adão Pinheiro disse:

    Foi minha maneira de dizer que gostei muito do artigo e que ele dá uma opção justa e bem feita para driblar o paladino “Capitão América” do D&D, Leonel. Fui exagerado, sim, mas minha opinião continua a mesma.

  28. dephlas disse:

    Belíssimo artigo. Mais bela ainda a discussão.
    O que cheguei a ver, após ler todos esses comentários, por sinal muito bem embasados de conhecimentos históricos e religiosos (coisa que não tenho em tamanha abundância), é que estão todos com a razão e/ou sem ela.
    Acredito que a intenção do artigo foi de “abrir os olhos” aos [muitos] que aplicam de forma pragmática essa dualidade bemXmal.
    Querem aplicar? – Apliquem.
    Sem nem sequer refletir? -Boa sorte.
    Cada um faz seu jogo, como bem quiser. Mas existe, de fato, uma certa incoerência, quando incluímos no sistema uma história de politeísmo e suas respectivas tendências e valores. Ora, se não for pra considerar, de verdade, os demais deuses e seus caprichos, influenciando as atitudes e valores das pessoas e criaturas, pra que eles? Ou os usa, aceitando as consequências e trabalhando praticamente com elas, ou não. É isso? Talvez. Essa é uma escolha.
    É claro que o termo paladino já vem imbuído de muitos conceitos, já presentes e firmados em grande parte das pessoas. Mas, como também já foi dito, o jogo, certas vezes, não é um exercício de “abstração” do mundo em que vivemos?
    Pois. É, pra mim, no fim, uma questão de escolha, pura e simplesmente.
    Como iremos jogar? Iremos adotar tendências? Iremos considerar outros deuses e suas pregações, com valores tão fortes e representativos, de igual importância, quanto os do “bem” e do “mal? Massa! Mas então o paladino não será como “sempre foi”. Se o nome atrapalha, mudemo-lo para campeão, guerreiro sagrado ou o escambau. E se o problema for uma “cavalaria”, com um código comum e que justifique os “paladinos”, porque não então cada deus ter a sua, assim como cada um tem seus templos e cultos? Então existiriam paladinos para todos os deuses, cada qual com sua própria cavalaria (e aí, podem “criativar-se” em inventar nomes para cada uma delas, caso queiram).
    E se, por escolha, quiserem adotar o politeísmo apenas para “colorir” um sistema, que na verdade será bem “judeo-cristanista”, que o façam, com igual liberdade e respeito, afinal, é também uma escolha. Vi aí dizerem que respeitam todas as religiões, pois não é o catolicismo (pelo menos este em maior parte praticado pelos brasileiros) que um monoteísmo com “pitadas” politeístas (vide os santos e santas, específicos para coisas e valores diversos)?
    Escolhas.
    Novamente, belo artigo, que abre os olhos de muitos, oferecendo-nos novas (ou não) escolhas.

  29. Drougnug disse:

    Esse assunto é bem polêmico. Mas bem… Vou exibir meu ponto de vista:
    Ao longo da história sempre teve um certo cargo com um nome exclusivo, na Inglaterra, embora cavaleiro podesse ser usado para qualquer um que usasse um cavalo (isso já saiu em discussão no fórum da Jambô), apenas um seleto era os Cavaleiros, que serviam para o Rei/Rainha, esses cavaleiros ficaram conhecidos por serem nobres, não apenas guerreiros, mas também aristocratas. Não é só esse grupo que recebia um nome especial, mas é um exemplo.
    Em Arton, os deuses tem seus campeões, de igual forma, cada um dos 20 Deuses, digamos, agora, todos os campeões, de cada deus, com toda a certeza é visto de uma forma diferente, o campeão de Lin-Wu é visto de uma forma diferente do que o campeão de Azgher, um campeão de Ragnar é visto de forma diferente do que os campeões de Megalokk, que é visto diferentemente do que o campeão de Nimb. A população vê cada campeão de uma forma diferente. E apenas um seleto de deuses são vistos como tendo os “paladinos”, se um campeão de Hynnin se disfarçar de um paladino de Khalmyr, para todo mundo ele vai ser um paladino de Khalmyr, ele vai ser entitulado paladino, não porquê ele realmente é um campeão de um deus bom, mas sim porquê para eles ele é um guerreiro do deus “X”.
    Ou seja, paladino em Arton é uma palavra usada para designar os campeões dos deuses benignos. Da mesma forma que para aquela população a palavra paladino seja carregada de um grande significado, pode ser que para o norte de Arton, por exemplo, tenha pessoas que não usam o termo paladino, para elas é uma palavra sem significado. Sem equivalente na língua deles. Ao invés de entitularem os campeões de deuses benignos de paladinos, eles apenas os chamem de campeões de Khalmyr, mesmo esse tendo igual valor de um paladino de Khalmyr. Da mesma forma que uma pessoa que não era da Inglaterra achasse que cavaleiro era apenas os que montavam em cavalo, soldados de linha de frente, peões. As pessoas da Inglaterra viam a palavra ser carregada por lealdade, nobreza e bravura.

  30. Drougnug disse:

    PS: O uso de Arton foi apenas um exemplo.

  31. Backstabber disse:

    Ótima discussão.
    O que eu acho é que do mesmo jeito que existem convenções, acima de tudo culturais, existe a nossa convenção “rpgística” que atrelou o nome paladino a algo moralmente “bom” e “humano” e por isso, é difícil pra muitos de nós fugirmos disso.

  32. Sua explicação não foi muito boa, mas eu compreendi a mensagem que você queria passar. Dependendo do contexto, um samurai poderia ser considerado um paladino, dentro da cultura oriental.
    Mas é importante lembrar que apesar de ser interessante desmantelar os conceitos e adaptá-los a novos ambientes, nem todos entendem isso, então se você falar de um paladino samurai que mata em nome da honra de seu feudo, algumas pessoas acharão isso bem estranho e talvez você seja bem mal compreendido.
    Eu gosto de usar o nome paladino pro guerreiro que não mata inocentes, salva as senhoritas, é honrado, gentil e cuidadoso.. bem no contexto de cavaleiro cristão salvador.
    Mas quando quero adaptar esse tipo de personagem para ambientes muito exóticos, como um mundo medieval inspirado em lendas orientais, prefiro usar nomes diferentes.
    Olha, convenhamos que paladino do cruel deus da escuridão e prodridão seria algo bem difícil de engolir. 🙂

    • Qual parte não foi boa? A de que o politeísmo não é cristianismo e que a palavra “paladino” tem um significado mais amplo?
      Se você é do time dos escravizados pelo padrão vigente, aí é com você, mas não venha querer desmerecer minha explicação só porque você é dos conceitos retrógrados.

  33. Cyrus disse:

    Shido lida mal com a crítica hein…
    E daí que o cidadão acima (Max-do-sobrenome-difícil) adota um conceito diferente do seu? O fato dele não concordar não significa necessariamente que ele é acomodado e que não olhou o conceito do paladino com uma visão crítica ou que o conceito dele seja retrógrado. Muito pelo contrário, pelo argumento desenvolvido, eu até imagino que tenha ocorrido o inverso.
    Agora, desmerecer a opinião do rapaz só porque ele não achou a sua explicação boa e levar para o lado pessoal, aí sim é ser quadrado, retrógado e fechado a críticas.
    Uma crítica (construtiva), Shido: uma pessoa que escreve, seja por profissão, seja por hobby, deve manter a mente aberta ao debate e à discussão saudável.
    Um pouco de humildade não machuca ninguém. Assim como você desdenhou do comentário inicial, que, apesar de não ter postado a fonte, imagino ter sido retirado de alguma comunidade do Orkut, fórum ou outro lugar onde pessoas escrevem de maneira (exageradamente) informal, você entendeu a mensagem.
    Se eu ridicularizá-lo por escrever “então, nos concentremos” ao invés de “então, concentremo-nos” (ênclise ao iniciar o período, conforme a norma culta) ou por errar a grafia de “politeísmo” (“politeísto”) sem nenhum objetivo, com certeza você também não se sentirá muito satisfeito.
    Pois bem, o ponto é que o fato do leitor ter entendido a sua mensagem já deveria ser o suficiente para você. Tenha em mente que o ponto importante da retórica é desenvolver seu argumento de modo inteligível e racional ao transmitir a mensagem e não convencer seus interlocutores.

  34. “Qual parte não foi boa?”
    Logo no título encontramos um problema, quando você fala “Para o inferno com os paladinos bonzinhos!” tenho a impressão de que você vai criticar essa classe de personagens, como se você não gostasse de classes “bonzinhas” ou que isso possa limitar a interpretação desse tipo de personagem.
    “Essa polarização de bem-mal é coisa de religião monoteísta judeo-cristã, gentem!” – Parte em negrito adicionada por mim.
    O mundo em que vivemos é politeísta, pode ser que você não perceba, mas tem um monte de budistas, zoroastristas, panteístas, adoradores do daime e rpgistas que perderam a noção da realidade.
    Quando assistimos animes, vemos muito da cultura japonesa e da religião xintoísta, mas mesmo lá, existem conceitos de bem e de mal, diferentes do vigentes no Brasil, mas ainda assim essa diferença existe.
    E apesar do mundo politeísta em que vivemos paladinos de verdade existiram e influenciaram culturas não-judaicas-cristãs.
    Além disso, usar um dicionário antiquado e mantido por pessoas da época em que o RPG nem existia, para discutir conceitos de RPG, é uma inocência ou ignorância muito grande. Pouco importa a origem da palavra, o importante é a interpretação atual dela.
    Se você vizitar a Wikipédia, que é uma enciclopédia mantida principalmente por gente da nossa geração, vai ver como a interpretação é diferente. Tente ler os seguintes artigos da Wikipédia: http://en.wikipedia.org/wiki/Paladin_(disambiguation)
    Só ficou claro o que você queria dizer quando chegou em:
    “Consertar o paladino para que funcione em cenários politeístas coerentes”.
    Coerente em qual sentido? O mundo em que vivemos é politeísta e absolutamente incoerente! Nah, não venha dizer que deus(es) não existe ou não, isso nem importa pra essa discussão.
    “Pois é, nem eu. Logo, o subterfúgio com que muitos se sentem quentinhos e confortáveis, o uso da palavra “campeão”, é desnecessário. É campeão de um deus? Então é paladino, não importa o deus.”
    Aqui você tá tentando forçar uma nova interpretação de uma palavra, que foi exatamente o que eu tentei explicar na mensagem anterior, mas você preferiu ignorar e não prossseguir com a discussão.
    Como acho que o exemplo do samurai não foi suficiente, pense agora na cultura nórdica, imagine um guerreiro que jurou fidelidade a Odin: um berserker.
    Um berserker tem muitas das características que você “adaptou” para a classe universal dos paladinos mal-explicados:
    * Aura do Bem digo, Aura da Guerra: transmite força, ânsia por vitória, coragem – as pessoas perdem o controle do esficter ao lado desses guerreiros; (Veja que nesse caso, a Graça Divina e a Aura da Coragem foram inclusos nessa característica)
    * Detectar o Mal: mal é tudo aquilo que não é bom e bom é sede por vitória, a busca por poder, a coragem, a força e a determinação!
    * Cura pelas Mãos: aí eu teria que pensar, pois se o cara caiu em batalha e não foi levado pelas Valkírias, será que ele merece ser curado? Por outro lado, se todos os que cairem forem largados, um exército de berserkers logo seria dizimado. (Aqui também abordaríamos Remover Doenças)
    * Expulsar Mortos-Vivos: Vivos não possuem medo da batalha, logo… quem não passar num teste de coragem pode ser negativamente influenciado pela aurea de coragem do guerreiro e lutar com uma grande desvantagem?
    * Magias: parece pouco honrado, mas talvez de para adaptar poderes para melhorar a capacidade das armas, escudos ou armaduras;
    * Montaria Especial: tanto faz? 😀
    * Tendência e Código de Conduta: estar sempre a caminho do Valhala.
    Pronto, criamos um campeão, digo, um paladino, digo BULLSHIT!
    Quem em sâ consciência iria chamar um Berserker de paladino? Chame-o de berseker, todos entenderão, a história não será ignorada, a origem não será ignorada e evitará confusões.
    Entendeu agora?

  35. Desculpem-me os erros de ortografia e digitação, é difícil achar erros digitando numa caixa tão pequena. Eu não sabia que meu comentário ia ficar tão longo.

  36. Vermei disse:

    sempre utilizei paladinos para todos os deuses do panteao, sempre achei injusto tambem essa historia de soh caotico e bom funcionar… pois nao funciona..
    mas, nas minhas aventuras, um paladino é leal e bom… [mas eu acabei de falar… espera!] todos os deuses tem seu representante na terra… mas a denominacao paladino é soh para deuses leais e bons, para os outros, a denominacao passa a ser Arauto. no fim das contas é a mesma coisa… so mudando a questao de poderes pela tendencia… e ja coloquei um palada leal e bom (jogador) contra um arauto (caotico e mau) NPC de mesmo nivel pra quebrar pau…
    experiencia e tanto

  37. Rafael disse:

    Caracas, tem muito comentário aqui kkk
    A única coisa que eu me pergunto é o seguinte: O paladino, do d&d por exemplo, é um cara bom. Tanto que ele tem obrigação de ser Leal e Bom. Se vocês querem criar um cara que adora morto vivo, coisas do tipo, ele não teria que ser Alguma coisa Mau?
    O problema é que não podem ter aventureiros maléficos.. no máximo o aventureiro seria Neutro Neutro.
    E aí, como fica?

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